Brasília – O tamanho do estrago da crise provocada no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, pelo escândalo Waldomiro Diniz, pode ser dimensionada por uma frase do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP): José Dirceu é o coração, o cérebro, as pernas e as mãos do governo Lula. Sem ele, o governo acaba.
No entanto, o mesmo José Sarney está preocupado. Na história da República brasileira, nenhum homem público, com tamanho poder, sobreviveu no cargo, com força e prestígio políticos abalados. Mais forte do que a vontade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, é agora o desafio do chefe da Casa Civil, José Dirceu, depois do escândalo com seu ex-assessor Waldomiro Diniz: continuar no governo, mesmo com o prestígio abalado.
O inflamado discurso de José Sarney, em solidariedade a Dirceu, durante jantar na casa do presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), no primeiro momento da crise, é um raio-x de onde está alojada a bala que fez o governo sucumbir. Para defender a permanência do ministro, Sarney disse que Dirceu é o coração, o cérebro, as pernas e as mãos do governo Lula. Elegante, mas contundente, Sarney, em bom português, disse que, sem José Dirceu, o governo acaba.
Ao governo pouco importa agora saber se foi atingido por uma bala perdida ou por um tiro certeiro, ainda que a primeira hipótese esteja na mente dos detetives palacianos que acham que foram vítimas de uma briga de gângsteres. Busca-se agora correr contra o tempo e evitar que o caso se alongue até as eleições municipais. É que o projeto político do governo, leia-se José Dirceu, passa por essa etapa para consolidar a reeleição de Lula.
José Dirceu, aparentemente, é um homem sem projeto pessoal definido. Seu projeto é Lula. Daí confundirem sempre seu poder com o presidente. Se o PT não pensasse em reeleição, José Dirceu estaria de olho no governo de São Paulo ou na vaga do Senado. Seu projeto é ficar oito anos com Lula.
Cumpri-lo já não parece tão fácil. Dirceu garante que não pretende deixar o governo por causa do escândalo Waldomiro. Em conversa com amigos, confirma que realmente chegou a pedir demissão ao presidente. “Era o mínimo que eu deveria fazer, já que sempre fui tão rigoroso na preservação da imagem do governo”, afirma ele. Os amigos do ministro estão convencidos de que ele tentará primeiro dar a volta por cima dentro do governo. Se não conseguir, vai tentar recuperar seu prestígio político no Congresso, reassumindo a cadeira de deputado federal.
“Eu posso recomeçar pela 4.ª vez”
Brasília – No final do ano e depois da crise, José Dirceu tem revelado que pode mudar de função. E são justamente essas frases de efeito que têm estimulado as especulações sobre o seu destino político. Postas nos devidos contextos, essas frases não passam realmente de bravatas. Mas, no meio da crise, soam com mais gravidade.
“Eu já recomecei minha vida três vezes e posso recomeçar pela quarta vez. Não tenho apego a cargo nenhum. Eu só tenho um papel aqui dentro: ajudar o presidente a cumprir um objetivo que perseguimos há 12 anos: mudar o Brasil”.
José Dirceu fez essa afirmação em dezembro, para demonstrar seu desapego a cargos. Mas voltou a repeti-la logo na explosão da crise.
Na época, para reforçar esse discurso, acrescentou: “Eu sou um arrombador de porta mesmo. Se a coisa que peço não está funcionando, vou lá e faço. Eu não atropelo quem está trabalhando, só os que estão enrolando. Essa é a minha função. Daqui a pouco eu largo isto aqui, fico um ano e meio no Ministério dos Transportes e outro ano e meio no Ministério da Educação e resolvo os problemas desses dois ministérios. Mas tudo com a permissão do Lula. Ele é que decide onde sou mais útil”.
Agora, com a crise, especula-se ser esse o novo projeto do ministro. Seus amigos reconhecem que José Dirceu tem momentos alternados de depressão e entusiasmo. E com a sensibilidade aflorada. Na sexta-feira, dia 13, quando da publicação das denúncias contra Waldomiro, as homenagens recebidas no Rio, durante a festa do PT, elevaram sua auto-estima. Bastou o presidente, na mesma solenidade, não ter citado seu nome, para ele cair em depressão. Voltou rapidamente ao normal, quando Lula deu-lhe um tapinha nas costas.