Brasília
– Em oito anos de oposição ao presidente Fernando Henrique Cardoso, o PT acabou construindo na Justiça uma armadilha para o governo do petista Luiz Inácio Lula da Silva. Desde 1995, o PT apresentou ao Supremo Tribunal Federal (STF), sozinho ou com outros partidos de oposição, 111 ações diretas de inconstitucionalidade contra atos do atual governo, que continuarão a ser julgadas na administração de Lula. Se a Justiça der ganho de causa ao PT, esses processos poderão provocar um rombo no caixa do governo Lula. Uma média de 13,87 ações por ano.O PT atacou, por exemplo, a política de Fernando Henrique para o salário mínimo e a execução da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que impõe limite de gastos para as administrações nos três níveis, agora apontada pelo próprio PT como vital para manter o controle das contas públicas. A partir de 1.º de janeiro, o PT governo e o advogado-geral da União escolhido terão que brigar no Supremo com o PT oposição, responsável pelas ações. E torcer para que os advogados do partido, responsáveis por essas ações, saiam derrotados, sob pena de abrir um rombo de bilhões de reais no já apertado Orçamento da União.
“A Advocacia Geral da União é indispensável ao governo. O advogado-geral tem que defender a União porque são problemas de governo. Partido e governo são instâncias independentes”, afirma o advogado-geral da União, José Bonifácio de Andrada. O assunto preocupa a equipe de transição. O presidente do PT , deputado José Dirceu (SP), um dos futuros ministros, foi alertado semana passada pelo líder da bancada na Câmara, João Paulo Cunha (SP), de que o problema terá de ser enfrentado. E que a responsabilidade é do partido como um todo, uma vez que o PT assina os processos.
“Temos que encarar a questão com naturalidade. Até porque o partido não pode retirar as ações. O advogado-geral da União que o presidente Lula escolher vai examinar o que é melhor para a União e vai agir com independência, ainda que a conveniência da União não seja a do PT”, afirma o deputado federal eleito Sigmaringa Seixas (PT-DF), um dos juristas do partido.
Acostumado a brigar no Supremo contra a oposição, o Palácio do Planalto acredita que essa será uma área de constante pressão interna no governo Lula. O PT, diz um integrante do governo Fernando Henrique, vai enfrentar uma tensão dialética na área jurídica. “O PT vai viver um drama. E não só no partido. Vai também ter que enfrentar pressões de antigos aliados como a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e o Ministério Público”, disse um ministro.
Uma das situações mais embaraçosas para o PT certamente será o julgamento da Ação por Descumprimento de Preceito Fundamental (APDF), ajuizada em abril de 2000, contra o tratamento dispensado pelo governo à questão do salário mínimo desde 1995.