O Senado Federal aprovou na última terça-feira (19) o projeto de lei 130/2020, que pune a divulgação — em meios digitais, eletrônicos ou impressos de qualquer tipo — de infração que coloque em risco a segurança no trânsito. A autoria do projeto é da deputada federal pelo Paraná, Christiane de Souza Yared (PL), que perdeu o filho Gilmar Yared num trágico acidente no ano de 2008, em Curitiba, causado pelo então deputado Fernando Ribas Carli Filho.

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Como foi alterado no Senado, esse projeto retornará à Câmara dos Deputados, onde teve origem. Entre as infrações classificadas como crime pela proposta estão a prática de competições em vias públicas (os chamados “rachas”) e a exibição de manobras. O texto também altera dispositivos do Código de Trânsito Brasileiro (Lei 9.503, de 1997).

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O senador Fabiano Contarato (Rede-ES) foi o relator da matéria. Ele apresentou voto favorável à proposição, com o acatamento parcial de duas emendas. Ao defender o projeto, Contarato argumentou que a utilização de canais de vídeo e redes sociais para a disseminação desse tipo de conteúdo representa uma afronta inadmissível às autoridades de trânsito.

O projeto

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O projeto de Christiane Yared proíbe a publicação ou a disseminação, em redes sociais ou em quaisquer outros meios de divulgação digitais, eletrônicos ou impressos, do registro visual da prática de infração que coloque em risco a segurança no trânsito, com exceção das denúncias desses atos, como forma de utilidade pública.

O texto prevê que as empresas, as plataformas tecnológicas ou os canais de divulgação de conteúdos nas redes sociais ou em quaisquer outros meios digitais, ao receberem ordem judicial específica, nos termos do artigo 19 da Lei nº 12.965, de 2014 (Marco Civil da Internet), quanto à divulgação de imagens que contenham a prática de condutas infracionais de risco, deverão torná-las indisponíveis no prazo assinalado.

Senador Fabiano Contarato. Foto: Waldemir Barreto / Agência Senado
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A proposta prevê que o artigo 175-A do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) passará a considerar infração gravíssima o ato de divulgar, publicar ou disseminar, em redes sociais ou em quaisquer outros meios de divulgação digitais, eletrônicos ou impressos, registro visual de infração de circulação que coloque em risco a incolumidade própria e de terceiros, ou de crimes de trânsito. A infração será punida, de acordo com o texto, com o pagamento de multa multiplicada por dez (hoje, R$ 2.934,70).

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Caso o infrator seja o próprio condutor do veículo no qual a infração foi registrada, o projeto determina que será aplicada, além da multa, a penalidade de suspensão do direito de dirigir por 12 meses. Também determina que as sanções previstas não eliminam a aplicação de outras penalidades e medidas administrativas, cíveis ou criminais cabíveis.

Além disso, o texto prevê que a retirada do conteúdo publicado nas redes sociais ou em quaisquer outros meios de divulgação digitais, eletrônicos ou impressos não isenta o infrator da aplicação das demais penalidades. De acordo com o texto, não serão punidas as publicações de terceiros que visem à denúncia desses atos, como forma de utilidade pública.



De acordo com o artigo 311-A proposto para o CTB, o ato de fazer, publicamente, apologia de crime de trânsito ou de autor de crime de trânsito será punido com pena de detenção de três a seis meses, com pagamento de multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.

Segundo o artigo 280 proposto para o CTB, a infração prevista no projeto será comprovada por declaração da autoridade ou do agente da autoridade de trânsito, por aparelho eletrônico ou por equipamento audiovisua1, reações químicas ou qualquer outro meio tecnologicamente disponível, previamente regulamentado pelo Conselho Nacional de Trânsito (Contran); por fotografias e vídeos publicados na internet, que podem ser remetidos à autoridade de trânsito por qualquer cidadão; por qualquer pessoa, física ou jurídica, que registrar o fato por vídeo, fotografia ou outros meios de prova em direito admitidos, e remeter à autoridade de trânsito. Nos dois últimos casos, a autoridade de trânsito poderá, assegurado o direito à contraprova, lavrar o auto de infração.

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O artigo 242-A, por sua vez, passa a considerar gravíssima a denúncia falsa de crime ou infração à autoridade de trânsito, com o pagamento de multa multiplicada por dez.

Já o artigo 311-B estabelece pena de detenção de três a seis meses e multa, sem prejuízo de outras penalidades e medidas administrativas, cíveis ou criminais cabíveis, para o ato de encaminhar à autoridade de trânsito denúncia de crime ou infração de trânsito contendo informações falsas ou provas adulteradas.

Ações educativas

Deputada paranaense Christiane Yared, autora do projeto. Foto: Jonathan Campos / Arquivo

Antes de assumir o mandato de deputada federal, em 2015, Christiane Yared fundou o Instituto Paz no Trânsito, voltado para ações educativas, conscientização e apoio a pessoas que perderam familiares em desastres automobilísticos. Em maio de 2009, seu filho mais velho, Gilmar Jr., foi morto num acidente em que estava envolvido o então deputado estadual Fernando Ribas Carli Filho. A campanha, que repercutiu em todo o Brasil, foi denominada “190km/h é crime”. Atualmente, Carli Filho cumpre a pena a que foi condenado em regime aberto.

Em pronunciamento no início da sessão, o senador Lasier Martins (Podemos-RS) destacou a importância do projeto. Ele ressaltou que a maior causa externa de óbito (quando há morte “não natural”) no Brasil entre crianças e adolescentes com idade até 14 anos são os acidentes de trânsito, conforme dados do Datasus.

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O relator da matéria, Fabiano Contarato, disse que o Estado tem de ser mais humanizador, em respeito ao princípio constitucional da eficiência, e disse que vai lutar pela instituir uma data dedicada a homenagear as vítimas de acidentes de trânsito — a quem ele dedicou o poema Funeral for a friend, do poeta inglês Wystan Hugh Auden, mais conhecido como W.H. Auden.

Discussão

Ao ler seu relatório em Plenário, Contarato destacou que a ideia de punições mais rigorosas para motoristas infratores é louvável, diante das “assombrosas” estatísticas de mortos e feridos no trânsito brasileiro.

“É igualmente relevante combater a apologia ao cometimento de crimes e infrações de trânsito. Tem se tornado comum a publicação de vídeos e imagens de manobras perigosas e “rachas” com objetivo de exaltar indivíduos que colocam em risco a vida de outros motoristas e transeuntes, além das suas próprias. A utilização de canais de vídeo e redes sociais para a disseminação desse tipo de conteúdo representa uma afronta inadmissível às autoridades de trânsito. Por isso, somos favoráveis ao projeto”, declarou.

Contarato também elogiou a deputada Christiane Yared.

“Ela teve um filho jovem morto criminosamente no sistema viário. Você reduz a criminalidade usando três elementos: fiscalização, educação e legislação mais contundente. Infelizmente, no trânsito, o Estado falha na fiscalização, na educação e na legislação, porque ninguém fica preso por crime de trânsito, mesmo estando em estado de embriaguez pelo álcool ou outra substância que cause dependência”, disse ele.

O projeto foi aprovado de forma simbólica, com o voto contrário do senador Carlos Viana (PSD-MG). Ele questionou alguns pontos do projeto e pediu que o texto fosse encaminhado às comissões permanentes do Senado para discussão do mérito.

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“A remoção de conteúdo das redes sociais tem que estar no Marco Civil da Internet. Estamos levando para o Código de Trânsito Brasileiro uma atribuição digital que tem que estar nesse marco civil. Se queremos coibir o uso de imagens usadas para incentivar ilegalidades no trânsito, isso tem que ser discutido no marco civil, em vez de mexermos no Código de Trânsito Brasileiro. As mesmas imagens que temos hoje consideradas como agressivas são imagens que podem e servem muitas vezes como forma de educar, sendo usadas em autoescolas e centros de formação de condutores. Há ainda a possibilidade de qualquer pessoa filmar e entregar a imagem à autoridade. Ora, quando falamos em penalidade, estamos falando do princípio de fé pública. Essa matéria precisa ser melhor discutida. Rede social é área de liberdade de pensamento e expressão e, nesse ponto, estamos entrando no aspecto de cercear direito e sem definir quem tem a responsabilidade”, alertou Carlos Viana.

Em resposta, Fabiano Contarato disse que houve reforma do Código de Trânsito Brasileiro durante a pandemia, sem que a matéria houvesse passado por comissão. Ele também ressaltou que o Código Eleitoral permite a retirada de imagens sem previsão no Marco Civil da Internet.

“”Racha” é crime previsto no artigo 308. O projeto não alcança comportamento de cunho educacional, mas a prática de transgressão que incentiva o uso perigoso do veículo automotor. O projeto foi amplamente debatido em todas as comissões da Câmara. Eu mantive contato com todas as plataformas, que estão de acordo com o texto que apresentamos. O Código de Processo Penal determina que, quando não for possível o exame de corpo delito, a prova testemunhal poderá supri-lhe a falta. Quem pode o mais pode o menos. Vamos manter o relatório e a pedir aprovação dele, uma vez que vai voltar para a Câmara, já que sofreu alteração e ajustes da técnica legislativa”, declarou Contarato.