Brasília  – A medida provisória editada anteontem pelo governo proibindo o bingo vai encontrar resistências na Câmara, onde um grupo de parlamentares se notabilizou nos últimos anos pela defesa da legalização desse jogo. Os deputados formam uma espécie de bancada do bingo e são contrários à proibição dessa modalidade de aposta.

Nos bastidores, quem atua é a Associação Brasileira dos Bingos (Abrabin), encarregada de municiar os parlamentares com pareceres, números e até sugestões de projetos. Publicamente, um deputado evangélico, do PT, destaca-se nas articulações para emplacar esta modalidade de jogo como um negócio legal. Gilmar Machado (PT-MG) atua há anos pela legalização do bingo. Pela terceira vez está relatando projeto que trata do assunto. É o líder informal dessa bancada.

“Tenho uma posição clara a favor da regulamentação. Nunca escondi isso. É preciso ter norma para resolver o problema”, afirmou ele.

Na Câmara, já tramitam 30 projetos pela regulamentação do jogo. A legalização do bingo tem total apoio de parlamentares que integram a bancada da bola, que já provou sua força quando atuou em defesa da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), investigada numa CPI.

Entre os deputados que apóiam o bingo estão Darcísio Perondi (PMDB-RS), irmão de Emídio Perondi, ex-presidente da federação gaúcha de futebol; Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), ex-presidente da Portuguesa paulista, e José Rocha (PFL-BA), ligado a clubes e à federação de futebol de seu estado. Um dos projetos é de autoria do ex-deputado Zezé Perrella (PL-MG), presidente do Cruzeiro. O deputado Valdemar Costa Neto, ex-líder do PL e da base do governo na Câmara, também assina um projeto que legaliza o bingo.

Fôlego

No governo Lula, o bingo ganhou novo fôlego. Escolhido ministro do Esporte, Agnelo Queiroz, trabalha, desde que assumiu, pela legalização do jogo, com repasse de parte dos recursos para seu ministério. Próximo do ministro, Machado foi novamente escolhido relator do Estatuto do Desporto. Mas a criação de um grupo de trabalho na Presidência da República para discutir o assunto fez com que o deputado, por determinação do Executivo, excluísse o bingo do estatuto.

Interessada na legalização do bingo, a Abrabin atua para convencer os parlamentares. No ano passado, a entidade distribuiu nos gabinetes dos deputados pareceres de juristas favoráveis à regulamentação do bingo e até a cópia de um projeto de lei legalizando o jogo.

Enquanto o petista Gilmar Machado se esforça para legalizar os bingos, outro colega de partido atua na direção oposta. O deputado Antônio Carlos Biscaia (RJ) apresentou um projeto proibindo o bingo, os caça-níqueis e o jogo do bicho e não perde a oportunidade de condenar a legalização dessas apostas.

Requião critica proposta

O governador Roberto Requião (PMDB) considerou ontem que a medida provisória do presidente Luiz Inácio Lula da Silva que acaba com as casas de bingo no Brasil “deve enterrar a idéia da CPI”. Requião se encontra em Paris, onde acompanha a pendência jurídica do caso Copel-El Paso.

“O caso Waldomiro Diniz e suas conexões devem ser investigados pelo Ministério Público e pela Polícia Federal, como estamos fazendo no Paraná”, disse o governador. Requião acredita que, neste momento, a instalação de uma CPI só vai atrapalhar o trabalho do Congresso Nacional e as ações do governo federal e deve refletir de forma negativa sobre a economia.

O Paraná foi o primeiro a combater os bingos. A medida provocou uma batalha jurídica, durante a qual vários estabelecimentos foram abertos por liminar do Judiciário e novamente fechados pela força da lei estadual. Na sexta-feira, a última casa em funcionamento no Paraná teve suas portas fechadas pelo Centro de Operações Policiais Especiais (Cope). Desde que foi assinado o decreto do governador, o Ministério Público, com apoio das polícias Militar e Civil, tem feito várias apreensões de máquinas caça-níqueis no Estado.

A decisão de acabar com o jogo no Estado partiu da constatação da ligação direta de máfias internacionais e o crime organizado com as casas de bingo com o crime organizado.

Medida causa revolta; casas fecham portas

Os cerca de 20 bingos que funcionavam na região do Vale do Paraíba foram fechados por volta da uma hora da manhã de ontem e não abriram mais. Os estabelecimentos permaneceram de portas fechadas durante o dia e não havia policiamento no local. Com exceção das telefonistas – que tiveram bastante trabalho durante o dia para atender as ligações dos clientes – e das faxineiras, os funcionários foram dispensados ainda na madrugada e orientados a aguardar as novidades em casa.

Os proprietários dos bingos de Taubaté e Pindamonhangaba planejavam se reunir hoje para discutir alternativas para o problema. Segundo o advogado do Pinda Bingo, em Pindamonhangaba, Fabiano Salles, as estratégias estão sendo traçadas e processos públicos devem ser pleiteados. De acordo com Salles, os funcionários estavam revoltados com a decisão do governo e planejavam fazer um grande protesto.

Fortaleza

Os bingos de Fortaleza amanheceram fechados ontem. Tampouco os policiais estão nas ruas para garantir a não-abertura das casas. Nos principais bingos localizados no centro de Fortaleza há apenas a presença de serventes para fazer a limpeza das casas. O Bingo Jangada, na Rua Floriano Peixoto, também no centro de Fortaleza, sequer tinha vigilante ontem.

Porto Alegre

Os bingos de Porto Alegre não abriram suas portas na manhã de ontem. Uma das maiores casas da cidade, a Mega Bingo, situada no calçadão da Rua dos Andradas informa, numa faixa, que está fechada para reformas. O único movimento do dia foi o de operários carregando entulhos e material de construção. O Real Bingo, na Rua Siqueira Campos, manteve fechadas até as grades de acesso ao pátio do prédio onde funciona.

MP equivale a 11 de setembro, avalia Abrabin

São Paulo  (AE) – A Associação Brasileira de Bingos (Abrabin) comparou os efeitos da Medida Provisória assinada ontem pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que proíbe as atividades de bingo e caça-níqueis, aos atentados de 11 de setembro. “O 20 de fevereiro será o 11 de setembro do Brasil”, afirmou o presidente da Abrabin, Olavo Sales da Silveira. Ontem, Silveira chorou ao analisar a situação dos 320 mil empregados de casas de bingo no País e recorreu a Martin Luther King para expressar a esperança do setor quanto à revisão da MP.

Os funcionários das cerca de 1,1 mil casas de bingo que funcionam no País, segundo Silveira, correm o risco de perder seus empregos caso a proibição não seja revista em até 30 dias. “Os bingos podem manter seus funcionários por no máximo 30 dias”, enfatizou. Proprietário dos bingos Augusta e Brigadeiro, em São Paulo, o empresário se emocionou ao falar sobre a proibição. “Tive uma reunião ontem com os meus funcionários e eles ficaram chocados”, disse, chorando. A entidade, contudo, teria recomendado às 600 associadas que não iniciassem as demissões.

De acordo com Silveira, a entidade trabalha com a esperança de que a MP seja, na realidade, um primeiro passo para a regulamentação do setor. Assim, seus efeitos seriam apenas temporários.

Episódio tranca pauta do Senado e da Câmara

Brasília  – O peso que o ex-assessor parlamentar do Planalto Waldomiro Diniz tinha no governo e no Congresso começou a ser sentido, de fato, a partir do momento em que ele caiu em desgraça. Disposto a conter turbulências em plenário, o presidente José Sarney (PMDB-AP) trancou, quarta-feira, a pauta do Senado. A casa parou.

Mas este está longe de ser o único efeito do escândalo Waldomiro Diniz sobre Câmara e Senado. Não foi só a agenda do Congresso que parou. Como assessor parlamentar da Casa Civil, Waldomiro tinha controle de todas as emendas apresentadas por parlamentares. Desde sua exoneração – na sexta-feira retrasada – o processo de liberação de verbas também parou.

Pressionados, líderes da base aliada já alertaram o ministro da Coordenação Política, Aldo Rebelo. O líder do PTB, José Múcio (PE), fez sua advertência já na segunda-feira passada. “Waldomiro era o braço parlamentar da Casa Civil. Está tudo desagradavelmente parado. E avisei a Aldo: tem deputado que não quer saber de crise. Quer saber de emenda!”, disse.

Segundo outros líderes da base aliada, o incômodo é tanto que parlamentares do chamado baixo clero exploram a fragilidade do governo e ameaçam assinar o requerimento de CPI, caso recursos não estejam liberados. Na base, a insatisfação começou a ganhar força na semana passada.

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