Enquanto diplomatas se reúnem em Katowice, na Polônia, para a 24.ª Conferência do Clima (COP), a fim de tentar avançar na implementação do Acordo de Paris, nos corredores da Organização das Nações Unidas (ONU) a percepção é de que o maior desafio não está na necessidade de criar o chamado “livro de regras” – o principal objetivo desta reunião. Negociadores mostram preocupação com a falta de um líder que conduza a comunidade internacional a acelerar a adoção de medidas para conter o aquecimento global.

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Ao jornal O Estado de São Paulo, experientes negociadores admitem que o “déficit de liderança” tem sido o principal obstáculo. O temor não é de que países abandonem oficialmente o acordo, gesto extremo até agora só iniciado pelos Estados Unidos. “O principal risco é de o acordo ser, em silêncio, ignorado pelos governos, sem nunca ter cumprido sua função”, alerta um diplomata.

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“Apesar de terem se passado só três anos desde que o acordo foi fechado, hoje temos um mundo bastante diferente do que aquele que o favoreceu”, afirma Eduardo Viola, professor de Relações Internacionais da Universidade de Brasília e especialista nas negociações climáticas.

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Países que lideraram as negociações na época abandonaram o barco ou enfrentam dificuldades para manter o mesmo tipo de atuação. Nos Estados Unidos, Donald Trump já deixou claro que não pretende cumprir os compromissos assumidos por Barack Obama. Na Alemanha, Angela Merkel está prestes a deixar o comando, enquanto há disputa interna para saber quem será sua sucessora. Assuntos climáticos, portanto, poderão ser adiados para 2020.

Na França, Emmanuel Macron vê nas ruas o preço da transição energética, com parte da população se recusando a pagar mais impostos. No Reino Unido, o debate foi enterrado enquanto Londres se mobiliza para sair da União Europeia.

A China poderia assumir essa posição. Maior emissor de gases estufa, o país embarcou para valer no esforço após acordo bilateral com os Estados Unidos de Obama, ainda antes da COP de Paris.

E assumiu o papel de defender acordos multilaterais após a vitória de Trump. Mas também passou a ser alvo de pressões internas com a guerra comercial contra Washington. “É uma espécie de nova Guerra Fria, que aumentou muito o nível de conflito no sistema e isso enfraquece muito as condições para que haja cooperação em qualquer área”, diz Viola.

Para o cientista político, porém, a China não poderia assumir essa liderança. “Eles têm um discurso cooperativo, mas a realidade é que enquanto suas emissões não entrarem em declínio, não têm como ser líderes nisso.”

Berço. E o Brasil, berço da Convenção do Clima da ONU na Rio-92 e importante na costura do Acordo de Paris, pode ver no governo Jair Bolsonaro um não cumprimento de suas metas ou até mesmo a saída do acordo. Antes mesmo de assumir, já causou mal-estar ao voltar atrás na oferta de receber a conferência de 2019. Também virou motivo de piada na conferência a declaração do futuro ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, de que mudanças climáticas são uma trama marxista.

Viola tem visão pragmática. “Não realizar a COP no País é uma coisa, sair do acordo é outra. O ministro pode ter essa visão, mas os centros do poder do governo Bolsonaro – Paulo Guedes (Economia), Sérgio Moro (Justiça) e os militares – sabem que a mudança climática é real. E forças econômicas sabem que o preço de sair do acordo pode ser bem alto.”

Para entender

A 24.ª Conferência do Clima tem o objetivo de concluir o chamado “livra de regras” do Acordo de Paris. É como se o acordo fosse a lei e agora é preciso regulamentar seu funcionamento. É preciso definir, por exemplo, um mecanismo de transparência: como será a verificação do cumprimento das metas.

Também se espera que haja uma indicação de como os países vão atualizá-las e ampliá-las. A conferência é a primeira após o lançamento do relatório do IPCC que mostrou que o planeta poderá estar 1,5°C mais quente já em 2040 e para evitar os piores cenários o mundo tem de reduzir suas emissões em níveis ainda maiores.

Questionamentos

Nas mesas de negociação da COP do Clima em Katowice, a delegação brasileira mantém seu desempenho tradicional de cobrança por regras claras, por mais compromisso dos países desenvolvidos, por dinheiro na mesa.

Em seu discurso na plenária de abertura, o embaixador José Antonio Marcondes de Carvalho, chefe da delegação, declarou que “o que deve ser evitado a todo custo é que os países em desenvolvimento sejam marginalizados ou apresentados com textos do tipo ‘pegar ou largar’” – posições clássicas do Brasil.

Já nos corredores as perguntas correntes que os diplomatas ouvem, assim como membros da sociedade civil presentes, são: “O que está acontecendo com o Brasil? Como será a participação no ano que vem?”. E todos se veem na situação de não saberem o que responder. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.