Os brasileiros nunca voaram tanto. Mas, ao mesmo tempo em que descobrem as facilidades do transporte aéreo, passageiros se deparam com as agruras do setor. Mais do que aeroportos lotados e atrasos, são os problemas com bagagem que têm atormentado a vida de quem viaja de avião. Neste ano, tanto a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) quanto o Procon-SP registraram aumento de queixas.
Em 2009, o serviço de atendimento da Anac recebeu 3.572 “manifestações” sobre bagagens – a maioria de extravio e furto de objetos de dentro das malas. Só nos seis primeiros meses deste ano, a agência já contabilizou quase a mesma quantidade: 3.518 – uma média de 500 por mês, ante as 300 registradas no ano passado. O item “bagagens”, que em 2009 era terceiro no ranking de queixas recebidas pela Anac, subiu para segundo. Só perde para as reclamações sobre o atendimento de funcionários públicos e empresas aéreas.
Os atendimentos no Procon-SP também dispararam. Em 2009, foram 30. Neste ano, já são 42. “Mas o baixo número não reflete nem de longe o problema”, assinala Valéria Cunha, do Procon-SP. Segundo ela, muitos recorrem ao órgão apenas para conseguir uma resposta das companhias. “Há quem tenha a mala extraviada e passe dias sem retorno. E, como o ressarcimento oferecido pelas empresas costuma ficar aquém do prejuízo, a maioria vai à Justiça pedir reparação.”
Os juizados especiais inaugurados na sexta-feira nos cinco maiores aeroportos do País – Cumbica, Congonhas, Santos Dumont, Galeão e JK – buscam reverter esse quadro, mas têm prazo inicial de funcionamento de apenas seis meses.
Relatório de 2008 da Sociedade Internacional de Comunicações Aeronáuticas (Sita, em francês) apontou que, no ano anterior, 42 milhões de bagagens haviam sido extraviadas ou danificadas no mundo. Desse total, 1,2 milhão – ou uma a cada 2 mil passageiros – jamais foi recuperado. A Sita estima que, pelo crescimento da procura por viagens aéreas (dobrou na última década), 70 milhões de malas devem ter igual destino em 2019.
No Brasil, além do aumento de passageiros há uma agravante: a precariedade dos aeroportos. O de Cumbica, em Guarulhos, terminal mais movimentado do País, é o melhor exemplo. “A estrutura é a mesma de 20 anos atrás”, afirma Rubens Pereira Leitão Filho, gerente-geral da Orbital, empresa que transporta as bagagens nos terminais brasileiros. O Estado apurou que, nos horários de pico, bagagens de até 20 voos têm de ser triadas em apenas duas esteiras. “O risco de um funcionário errar é muito maior”, diz Leitão Filho.
Embora já exista tecnologia capaz de rastrear bagagens, nenhum aeroporto ou companhia aérea nacional dispõe desses equipamentos. O intrincado processo de triagem das malas, do check-in aos porões do avião, é feito manualmente. Se um desses funcionários falha, uma bagagem que ia para Recife acaba na Europa.
Uma empresa aérea de grande porte gasta, em média, R$ 400 por voo com o manejo de bagagens em rotas domésticas. É pouco perto dos cerca de R$ 2.700 desembolsados por companhias estrangeiras ou pelas nacionais que fazem voos internacionais.
O motivo dessa discrepância está nas regras a que as estrangeiras são submetidas. Enquanto a legislação brasileira deixa o serviço a critério das companhias, em outros países o controle é rigoroso. As malas têm de passar por raio X e todo o vaivém no aeroporto deve ser supervisionado para evitar furtos.
“A bagagem é a coisa mais íntima que um passageiro carrega. Temos de tomar cuidado”, diz Mônica Thomaz Capelli, da Puma Air, que opera rotas a partir de Cumbica. TAM e Gol, líderes do mercado doméstico, não quiseram manifestar-se nem divulgar seus dados.