As divergências em relação à política econômica do governo Lula deram o tom das discussões ontem, durante o primeiro dia da última reunião do ano do Diretório Nacional do PT.
No encontro, o Diretório deve oficializar a posição do partido, favorável à cessão de mais ministérios para os aliados do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, principalmente PMDB e PP. Segundo o presidente nacional do partido, José Genoino, o PT também está disposto a abrir mão de candidaturas próprias em alguns estados nas eleições de 2006 para agradar os aliados.
"O PT não será obstáculo para o presidente Lula fazer os remanejamentos necessários para consolidar a maioria parlamentar, inclusive cedendo espaço. Uma das lições desta eleição é que o PT tem de aprofundar sua política de alianças, dividindo poder com os parceiros", disse Genoino.
Segundo o presidente do PT, a posição faz parte da proposta de resolução que o campo majoritário, tendência hegemônica no partido, apresentará na reunião deste fim de semana em São Paulo. Neste sábado, estão sendo realizados os debates e no domingo, será finalizado o documento, com as posições aprovadas.
Sem racha
Genoino afirmou que correções e autocríticas são bem-vindas. Mas acrescentou que eventuais alterações no partido devem ser feitas "sem clima de jogar para a platéia". O petista garantiu que o debate no partido é "livre e democrático". Ele negou que haja racha na legenda. "O que há é debate, discussão. Não queremos guerra interna no PT, mas sim participação efetiva", comentou, acrescentando que o PT tem procurado dialogar com as principais correntes da legenda.
Ao ser questionado se a demissão do ex-presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Carlos Lessa, representava uma mudança na política econômica do governo, Genoino afirmou: "É um equívoco achar que a saída de Lessa é mudança de rumo".
Ataque e defesa
O deputado federal Ivan Valente, da corrente Força Socialista, uma das alas mais à esquerda do partido, defendeu uma mudança radical na condução da economia do País. Na avaliação do parlamentar, é preciso ainda que o PT rediscuta que tipo de crescimento que ele almeja para o Brasil. Valente reafirmou que o partido precisa ser "chacoalhado". "Há uma crise política, uma crise de identidade e houve perda de massa crítica. É preciso que tudo isso seja repensado", opinou.
Já o líder do governo na Câmara, professor Luizinho, também saiu em defesa da política econômica desenhada no governo do PT. "O Brasil só vai crescer 4,5% este ano porque tivemos competência de dar equilíbrio e estabilidade ao País", disse. De acordo com ele, a política do governo petista é radicalmente contrária à do governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB).
"Mudamos o caráter da dívida, reduzimos a vulnerabilidade externa e os juros estão controlados", comentou. Com relação à taxa de juros básica (Selic), o líder do governo na Câmara afirmou que o PT tem se esforçado para que ocorra uma queda continuada da taxa.
"O juro é algo e gostaríamos que fosse mais baixo. Mas ele não está comprometendo o crescimento e nem o desenvolvimento do Brasil", enfatizou.
O parlamentar aproveitou ainda para criticar os que defendem uma modificação radical na política econômica. "As que querem mudar o rumo estão querendo trazer insegurança."
Ministros divergem sobre partido
São Paulo (AG) – Antes mesmo do início do encontro, que termina hoje, os membros do partido já expunham, na recepção da sede da legenda em São Paulo, suas opiniões com relação aos rumos da economia do País.
De um lado, o ministro das Cidades, Olivio Dutra, defendia uma reavaliação da condução da política econômica do governo do PT. Do outro, o ministro da Educação, Tarso Genro, reiterava o apoio às decisões do ministro da Fazenda, Antônio Palocci.
Para Dutra, o PT necessita de "um bom debate sobre a política econômica no governo e também com o partido". "Não podemos ser prisioneiros de uma política econômica imposta de fora para dentro por alguns setores da sociedade que têm interesses e direitos, mas que não podem se sobrepor aos interesses coletivos da nação", defendeu.
Já Genro saiu em defesa de Palocci. O ministro da Educação afirmou que a política desenvolvida pelo ministro da Fazenda até o momento "foi necessária, de rigidez e estabilidade macroeconômica". Genro acrescentou que as trepidações em relação ao rumo da economia do País ocorrem agora porque, segundo ele, chegou o momento de consolidar a transição, a taxa do crescimento e entrar em 2005 "com as velas abertas". O ministro acrescentou: "transição não é ruptura e ela está sendo realizada".
Direção do PMDB também está rachada
Brasília (AG) – No início era fácil, estavam todos do mesmo lado contra o regime militar. Depois da redemocratização, porém, nunca mais o PMDB exibiu a mesma unidade. Desde o governo José Sarney (1985-1990), o partido bate cabeças e a cada governo mergulha no mesmo dilema de ser ou não ser governo. Foi assim que os peemedebistas construíram a imagem de um partido adepto do fisiologismo e da barganha política.
É com essa trajetória que hoje o partido mais uma vez trava a disputa interna entre governistas e oposicionistas. No governo Sarney, essa queda-de-braço levou à formação do PSDB, que foi para a oposição; votou contra a ampliação do mandato de quatro para cinco anos; e lançou a candidatura de Mário Covas nas primeiras eleições diretas para presidente após o regime militar.
No governo Fernando Henrique (1995-2002), foi diferente: os peemedebistas brigavam e o governo pagava a conta com mais cargos. Tendo indicado o vice na chapa do PSDB em 2002, o PMDB perdeu as eleições, acabou aderindo ao governo Lula e ganhou dois ministérios. Agora chegou a vez de o governo petista pagar a conta das desavenças internas do PMDB.
"O governo tem que dizer o que deseja do PMDB", repete, como uma ladainha, o líder no Senado, Renan Calheiros (AL). "Só a ação do governo pode impedir que o partido decida pelo rompimento", diz o senador Ney Suassuna (PMDB-PB). A novela encenada nos oito anos de governo Fernando Henrique terá novo capítulo em 12 de dezembro, quando 523 convencionais vão decidir se o partido entrega ou não seus cargos no governo Lula.
Durante a gestão tucana no Planalto, o PMDB realizou nove convenções, disputadas entre governistas e oposicionistas. Numa delas houve até batalha campal. Em março de 1998, os aliados de Fernando Henrique impediram o lançamento da candidatura do ex-presidente Itamar Franco para disputar as eleições. Naquela época, o presidente do PMDB, Paes de Andrade, pregava o rompimento com o governo FH, como faz agora o deputado Michel Temer.
Não valeu
Muitas decisões do partido tomadas em convenção não foram cumpridas. Em 24 de março de 1996, por exemplo, o partido decidiu que defenderia os direitos adquiridos na reforma da Previdência. Mas no Congresso Nacional a maioria de seus parlamentares votou a favor da proposta do presidente Fernando Henrique, de retirar da Constituição direitos adquiridos dos aposentados.
Temer garante autonomia
Brasília (AG) – O presidente do PMDB, Michel Temer, garante que agora o partido está disposto a trilhar rumo próprio. "Fomos um satélite luminoso no governo Fernando Henrique. E somos um satélite apagado no governo Lula. O PMDB cansou de ser satélite", diz o dirigente da legenda.
Há um grupo que discorda de Temer, porém. "Vocês acham que o PMDB vai sair do governo? Eles agem sempre assim", diz o presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP). Nos próximos 20 dias, haverá muitas conversas e negociações. E não se pode saber de antemão qual o rumo que o partido tomará.
Na oposição
A maioria dos governadores quer o partido fora do governo. O partido está insatisfeito com sua participação no governo Lula. Os ministros Eunício Oliveira (Comunicações) e Amir Lando (Previdência) não têm o controle das bancadas na Câmara e no Senado.
O partido está assustado com o poder de demolição da máquina eleitoral do PT. "Do jeito que vai, o PMDB vai ficar solto. A entrega dos cargos vai ser aprovada. Você acha que alguém vai brigar, como em 1998, contra o Itamar e o Sarney? Brigar por quem?", diz o deputado Jáder Barbalho (PA), ex-presidente do partido.