Após 17 meses de ocupação por tropas do Exército, o Complexo do Alemão, na zona norte do Rio, recebeu na manhã desta quarta-feira as duas primeiras Unidades de Polícia Pacificadora (UPP). Instaladas em contêineres improvisados, as duas unidades estão localizadas nas comunidades de Nova Brasília e Fazendinha e atendem a 40 mil moradores. Ao todo, 660 policiais recém formados passam a atuar no patrulhamento das favelas.
Mesmo com a chegada dos policiais, os 1.700 soldados da Força de Pacificação vão continuar no complexo. Eles serão redistribuídos nos patrulhamentos das outras favelas. A saída definitiva só deve acontecer após a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), em junho.
“Quando entramos aqui, tínhamos a sensação de Sarajevo (referência ao conflito armado na Bósnia) . As UPPs não convertem as comunidades em paraíso de uma hora para outra, mas mudam a vida dessas pessoas”, declarou o governador Sérgio Cabral na inauguração. Outras seis unidades devem ser instaladas nos complexos do Alemão e da Penha, com um total de 2 mil policiais. Tropas do Batalhão de Choque e do Batalhão de Operações Especiais (Bope) ajudarão no patrulhamento durante a transição.
A mudança do policiamento gerou expectativa e desconfiança entre os moradores. Márcia Ferreira, de 41 anos, vive com os seis filhos na rua onde foi instalado o posto provisório da UPP de Fazendinha. Ela teme que os traficantes voltem a dominar a região. “Os moradores têm medo de que tudo seja só uma promessa, fogo de palha, e que a polícia saia depois”.
Na avaliação do general Adriano Pereira Júnior, do Comando Militar do Leste, o Exército deixa como legado uma região menos violenta. Ao longo da ocupação, as tropas entraram em confronto com traficantes e enfrentaram resistência dos próprios moradores. Eles acusaram os soldados de abusos, furtos e até tortura. O caso mais grave denunciado pelos moradores é a morte de Abraão da Silva Maximiliano, de 15 anos. Em dezembro de 2011, ele foi atingido por um tiro disparado por um soldado em um campo de futebol. O Exército afirmou que ele tinha envolvimento com o tráfico, o que foi negado pela família.
As denúncias estão sendo investigadas pela Polícia Civil. Na avaliação do governador, as denúncias são “casos isolados”. “De maneira alguma eles mancham a honra e o trabalho que o Exercito fez nessa comunidade”. Com as inaugurações, o Rio passa a contar com 21 Unidades de Polícia Pacificadora nas favelas. Para o governador Sérgio Cabral, o saldo da pacificação é “extraordinário”. Entretanto, algumas comunidades já pacificadas têm sofrido nos últimos meses ondas de violência e tentativas de retomada pelo tráfico. Na última semana, o comércio das favelas da Mangueira e de Cidade de Deus foi fechado após ordens de traficantes.
A Rocinha, a maior comunidade carioca, é alvo de disputas de diferentes facções pelo controle dos pontos de venda de drogas. Ocupada desde novembro pelo Batalhão de Choque, a região já registrou 10 mortes nos últimos dois meses, entre eles um policial militar. Na última terça-feira, um traficante foi morto durante um tiroteio com policiais. “A Rocinha era o maior ponto de vendas de drogas do Brasil. Os conflitos continuarão. Eles existem em bairros e comunidades, mas quando o Estado está presente é diferente”, defendeu Cabral.