O presidente da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero) na época do acidente, brigadeiro José Carlos Pereira, de 80 anos, classifica como experiência “terrível” o período em que dirigiu a instituição, entre março de 2006 e agosto de 2007. “Era um inferno diário. Teve greve de controladores, o caos aéreo a partir do acidente da Gol (em 2006) e depois o da TAM. Uma frigideira.”

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Hoje na reserva, vivendo em Brasília, o brigadeiro invoca as investigações da Aeronáutica para falar da tragédia em Congonhas.

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“É certo que houve um erro de pilotagem, um dos manetes estava na posição errada (o manete direito, que desaceleraria o motor, estava na posição ‘climb’, o que fez com que continuasse acelerando), isso ficou comprovado”, disse. “Mas o piloto só cometeu a falha porque nunca passou por uma simulação das condições que viveram naquela cabine. A falta de treinamento com certeza contribuiu para o acidente horroroso.”

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O relatório do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) aponta, de fato, que as poucas horas de treinamento dos pilotos da TAM na época eram uma preocupação dos tripulantes.

Com o aumento de número de voo da companhia após o fim da Varig, em 2006, a TAM encurtou seu tempo de formação de pilotos – das 40 horas recomendadas para pilotar um Airbus, para 12 horas de curso. A prática cumpria a legislação em vigor, mas era um fator que causava ansiedade, segundo a Aeronáutica.

“A empresa aérea costuma seguir cegamente as instruções de treinamento do fabricante, mas nesse caso não”, afirmou Pereira.

O ex-presidente da Infraero foi um dos 11 indiciados pelo Ministério Público de São Paulo (MP-SP) como responsáveis pela tragédia. Para o órgão paulista, o brigadeiro agiu com “imprudência” ao autorizar a liberação da pista de Congonhas, após uma reforma feita meses antes, sem a realização do grooving.

Além disso, ele teria sido “negligente” por não exigir a medição do atrito na pista após as obras, o que “poderia resultar em restrições às operações no aeroporto em dias de chuva”, como apontou o promotor Mário Luiz Sarrubbo.

Apesar do parecer do MP-SP, o brigadeiro não foi incluído na denúncia do Ministério Público Federal (MPF), e as acusações contra ele não estão entre os fatores contribuintes para o acidente.

“A discussão sobre o grooving foi irritante, pois pareceu que se houvesse grooving na pista não teria batido. Não tem nada disso, na velocidade que estava, e com os manetes na posição errada, o avião não pararia nunca.”

O relatório da Aeronáutica demonstra, no entanto, irregularidades em Congonhas no que diz respeito à inspeção das obras. O brigadeiro defende-se. “Fui a Congonhas depois da reforma, uns cinco ou seis dias antes do acidente, e percorri a pista toda com meus engenheiros. Não havia problema nenhum na pista”, disse o brigadeiro, em concordância com o que sempre afirmou a Infraero. “Mas eu entendo o ser humano, sempre tem de apontar um culpado.”

Pereira foi demitido da estatal semanas depois do acidente. Diz não guardar rancor. “O ministro da Defesa (Nelson Jobim) disse: ‘Olha, vou precisar do cargo, a situação está complicada, muita pressão’, e eu aceitei na hora”, contou. “Quando aceitei o cargo, já com dois anos na reserva, foi uma ingenuidade. Me meti em um vespeiro.”

Em uma das visitas que fez ao local do desastre, o brigadeiro teve um pensamento que disse ser “macabro”. “Vou falar uma coisa estranha, mas é verdade. Se a velocidade dele fosse 20 km/h a menos, cairia na Washington Luís, aquele ladeirão, e o combustível ia espalhar e explodir todos os automóveis que estivessem ali. E se tivesse 20 km/h a mais, passaria por cima do prédio da TAM e bateria em um edifício residencial. Aí lembraria as Torres Gêmeas”, afirma. “O acidente foi uma tragédia incomensurável, mas poderia ter muito mais vítimas.”

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo