Pistoleiro assume autoria da morte da irmã Dorothy

Altamira – Em depoimento à Polícia Federal no final da tarde de ontem, o pistoleiro Rayfran das Neves Sales confirmou ter matado a missionária Dorothy Stang, no Pará. Mas desta vez apontou outra pessoa como mandante: Amair Feijoli da Cunha, o Tato, já preso, acusado de ter sido o intermediário do crime. Mais cedo, em depoimento informal à Polícia Civil do Pará, Rayfran contara que o mandante do crime tinha sido o presidente do Sindicato Rural de Anapu, Francisco de Assis de Souza, o Chiquinho, ex-vice prefeito da cidade, filiado ao PT e considerado um dos principais aliados de Dorothy.

A polícia informou que a partir de agora o inquérito vai correr sob segredo de Justiça, mas adiantou que vai continuar tentando localizar o fazendeiro Vitalmiro Bastos de Moura, o Bida, um dos principais suspeitos de ser o mandante do assassinato. Rayfran foi trazido ontem de Anapu para Altamira por um helicóptero Black Hawk do batalhão, sob um forte aparato de segurança que envolveu soldados do Exército, policiais federais e policiais civis. Ele foi preso no domingo à noite a 35 quilômetros da sede do município de Anapu, no Pará. A prisão foi efetuada pela Polícia Civil do Pará, em conjunto com uma patrulha do Exército. Rayfran estava desarmado, numa barraca de náilon montada à beira da rodovia Transamazônica. Segundo a polícia, ele não resistiu à prisão.

No sábado, já tinha se entregado à polícia Amair Feijoli da Cunha, o Tato, suspeito de ter intermediado o assassinato e contratado o pistoleiro. A polícia chegou a Rayfran depois de ele ter sido identificado por uma pessoa que passava pela Transamazônica e o reconheceu após ter visto seu retrato falado. Essa pessoa, cujo nome está sendo mantido sob sigilo, seguiu de motocicleta até a base do Exército em Anapu. Os militares, então, organizaram uma patrulha, acionaram a Polícia Civil e seguiram até o local apontado pela denunciante. A área foi vasculhada até que Rayfran foi encontrado por volta das 19h40.

A polícia continua fazendo uma operação, com apoio do Exército, para encontrar dois foragidos: Vitalmiro Moura, o Bida, ainda suspeito de encomendar o crime, e o pistoleiro Uilquelano de Souza Pinto, o Eduardo.

Homicídio qualificado

Altamira – Amair Feijoli da Cunha, o Tato, foi indiciado domingo nos dois inquéritos abertos pela polícia para apurar o assassinato da missionária americana, executada no último dia 12 em Anapu, no oeste do Pará. Ele foi indiciado tanto pela Polícia Civil quanto pela Polícia Federal por homicídio qualificado. O lavrador voltou a negar qualquer participação no crime. Apesar disso, o delegado Waldir Freire, da Polícia Civil, disse ter juntado elementos que ajudam a reforçar a suspeita de que Tato atuou como intermediário do crime: ?Nós chegamos à conclusão de que há uma íntima relação entre ele (Tato), o fazendeiro Vitalmiro Bastos de Moura (Bida), e os pistoleiros Rayfran das Neves Sales e Uilquelano de Souza Pinto, o Eduardo. Para o delegado, Tato mentiu e caiu em contradição: ?Ele disse que não conversou com a irmã Dorothy, mas nós temos depoimentos de várias testemunhas que dizem ter visto ele discutir e até dizer várias palavras de baixo calão contra ela no dia do crime. Se ele está mentindo nesses detalhes pequenos, ele está mentindo o tempo todo. A polícia acredita que Tato tenha recebido ajuda de terceiros para fugir, embora ele afirme ter fugido sozinho, andando pela floresta. ?Ele não está nem com arranhão?, estranhou o delegado. A cada dia fica mais evidente a divisão entre a Polícia Civil e a Polícia Federal. Cada uma tem um inquérito para investigar o mesmo crime. No domingo, Tato teve de prestar dois depoimentos. O primeiro, para a Polícia Civil, durou duas horas e 40 minutos. Em seguida, na Polícia Federal, ele foi interrogado por mais uma hora e meia. Tato já cumpriu pena por falsificação de documentos públicos e receptação de carro roubado no Espírito Santo. Ele cumpriu a pena em regime aberto e teve de prestar serviços à comunidade durante três anos. A pena terminou em 12 de agosto de 1996.

Decretado segredo de Justiça

Altamira – A Polícia Civil do Pará informou ontem que foi decretado segredo de Justiça sobre o processo relativo ao assassinato da missionária Dorothy Stang. O delegado Waldir Freire apresentou aos jornalistas o decreto expedido pelo juiz Lauro Alexandrino, da comarca de Pacajá, no sudoeste do Pará. O decreto foi feito a pedido do promotor de Justiça Sávio Brabo de Araújo, do Ministério Público Estadual, que disse ter agido em nome da força-tarefa formada para investigar o caso. Segundo o delegado, o acusado de ser o executor do crime, Rayfran das Neves Sales, manteve a confissão de culpa. Waldir Freire disse ainda que não poderia informar mais nada sobre o depoimento. ?A Polícia Civil foi determinada pela Justiça a não mais se manifestar sobre o assunto.? Ainda segundo o delegado, nenhum defensor acompanhou Rayfran no depoimento, apenas representantes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e da Comissão Pastoral da Terra (CPT). O promotor de justiça Sávio Brabo de Araújo afirmou ontem que o decreto que estabelece segredo de Justiça tem como objetivo dar tranqüilidade às investigações da ?cadeia de comando? envolvida no crime. ?O objetivo do pedido é para que nós possamos checar com tranqüilidade todos os ricos detalhes que ele (Rayfran das Neves Sales) nos deu a respeito da cadeia responsável pela mandância.?

O promotor integra o Grupo Especial de Prevenção e Repressão às Organizações Criminosas (Geproc). O promotor disse esperar que o segredo de Justiça seja temporário.

Não haverá impunidade, afirma Lula no rádio

Brasília – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou, ontem, que o governo federal está empenhado em punir os responsáveis pelo assassinato da freira Dorothy Stang em Anapu, no Pará. ?Não descansaremos enquanto não prendermos os assassinos. E mais do que isso: prender os mandantes para que a gente mostre, claramente, que no nosso governo não tem impunidade, que a Amazônia é nossa e que vamos tomar conta do nosso território com soberania, sem vacilação?, disse o presidente no programa quinzenal de rádio Café com o presidente.

Lula explicou que as medidas ambientais apresentadas na semana passada têm como objetivo regulamentar a exploração sustentável das florestas públicas. O governo anunciou a interdição de 8,2 milhões de hectares de áreas públicas na margem esquerda da BR-163 para criar centros de estudos específicos e unidades de conservação ambiental. O pacote de medidas inclui cinco decretos, uma medida provisória e um projeto de lei que criará a gestão de florestas públicas e a criação do Serviço Florestal Brasileiro e do Fundo de Desenvolvimento Sustentável. Para o presidente, as medidas representam a ?maioridade? do País na preservação da Amazônia. ?Esse projeto de lei é uma revolução na proteção da Amazônia e acho que o Brasil e a sociedade brasileira estão aceitando muito bem. Nós estamos mostrando o seguinte: atingimos a maioridade na política ambiental. Atingimos a maioridade no controle da nossa Amazônia e no controle das nossas florestas.?

Exército cria disque-denúncia

Altamira – O comando de operações das Forças Armadas em Altamira criou um serviço de disque-denúncia para auxiliar as investigações sobre o assassinado da missionária Dorothy Stang, morta no dia 12 em Anapu. O comando é do general Jairo César Nass, da 23.ª Brigada de Infantaria de Selva, de Marabá, e está no momento instalado na 51.ª Brigada de Infantaria de Selva, no município de Altamira. As ligações para o número 0800 91 64 44 são gratuitas. Segundo a Comunicação Social do Exército, o número também pode ser utilizado para fazer denúncias sobre quaisquer crimes praticados na região sul do Pará, como desmatamento ilegal, crimes ambientais, grilagem de terras, entre outros. De acordo com a assessoria do Exército, 15 cidades já estão sendo patrulhadas por cerca de 800 homens. São elas: Anapu, Porto de Moz, Senador José Porfírio, Medicilândia, Belo Monte, Pacajá, Novo Repartimento, Parauapebas, São Felix do Xingu, Novo Progresso, Moraes Almeida, Riozinho do Anfrisio, Rondon do Pará, Abel Figueiredo e Bom Jesus do Tocantins.

O ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, se reúne hoje, em Brasília, com lideranças da região Oeste do Estado do Pará, representantes do Grupo de Trabalho Amazônico (Rede GTA), dos sindicatos e organizações comunitárias da região, o procurador geral da República, Cláudio Fontelles e os ministros Marina Silva, do Meio Ambiente, e Miguel Rosseto, para discutir a situação no estado e a segurança das pessoas que estão sendo ameaçadas.

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