O pesquisador Zander Navarro, da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), foi demitido nesta segunda-feira, 8, após questionar os rumos da instituição de pesquisa e o presidente da estatal, Maurício Lopes. Ao Estado/Broadcast, Navarro classificou a decisão como “arbitrária” e disse ter constituído advogado para pedir sua reintegração ao cargo que ocupa há mais de 40 anos.
Os primeiros questionamentos públicos de Navarro foram feitos no artigo “Por favor, Embrapa: acorde!”, publicado na última sexta-feira, 5, no jornal O Estado de S. Paulo, no qual o pesquisador critica a fragmentação das pesquisas, a falta de foco e de estratégia na Embrapa.
Ele classifica a missão da empresa de “entregar valor à sociedade” como “uma vaga afirmação de inocentes noções” e “uma fuga da realidade”, e pede ao presidente da empresa, Maurício Antônio Lopes, para “esclarecer à sociedade a inquietante pergunta: afinal, para que serve mesmo a Embrapa, uma das raras estatais totalmente dependentes do Tesouro?”.
Navarro questionou a substituição de dois terços dos pesquisadores em concursos recentes e indagou “como justificar que uma gigantesca e cara empresa pública, sustentada por toda a sociedade, trabalhe cada vez mais e quase que exclusivamente para os ricos segmentos do empresariado rural?” e finalizou: “Existe enorme resistência da direção em promover as mudanças urgentes e necessárias”.
Após o artigo, em um comunicado encaminhado aos gestores da estatal e obtido pelo Estadão/Broadcast, o presidente da Embrapa afirma que o artigo de Navarro “tipifica falta gravíssima à luz das normas de comportamento e de conduta da Empresa”. Lopes avalia que o texto prejudica, junto ao Ministério do Planejamento, o amplo processo de remodelação em curso na Embrapa nos últimos dois anos.
“Afirmações irresponsáveis, sem nenhum fundamento, contidas no artigo, podem jogar por água abaixo todo o esforço que já dura dois anos, e está prestes a ser finalizado. Assim, eu gostaria de informar a todos que a diretoria executiva tomará todas as medidas cabíveis, à luz das nossas normas e procedimentos, para que este tipo de comportamento, irresponsável e destrutivo, seja definitivamente erradicado da nossa Empresa”, relata Lopes.
Em uma carta, também encaminhada aos gestores, Navarro respondeu ao presidente da Embrapa reafirmando e ampliando as críticas já feitas no artigo. O pesquisador disse que há um anseio dos funcionários pela refundação da Embrapa.
Diante da repercussão negativa após a demissão, o presidente da estatal divulgou um último comunicado interno, no qual atribuiu a decisão à diretoria executiva pelo fato de o pesquisador “ignorar sistematicamente os códigos de ética e de conduta da Empresa”. Essa também foi a resposta da assessoria da Embrapa aos questionamentos feitos pelo Estadão/Broadcast sobre a demissão. Sobre o artigo de Navarro, a estatal informou que não faria comentários além do esclarecimento anterior já feito.
Questionado sobre a demissão polêmica e as críticas feitas por Navarro, o ministro Blairo Maggi, da Agricultura, pasta à qual a Embrapa é ligada, afirmou que o assunto é interno da estatal e que não vai se pronunciar.
Mudança
“Estou fazendo a mudança dos meus papéis e me deram hoje (terça-feira) para deixar a sala após uma demissão sumária”, disse o pesquisador Zander Navarro, por telefone, antes de deixar a unidade da Embrapa em Brasília (DF) depois de ser demitido. “Fui demitido da Embrapa por emitir minha opinião, mas já constitui um advogado, porque é um ato de violência não poder ter opinião, ainda mais em uma empresa de pesquisa, de ciência, onde se supõe haver questionamentos.”
Navarro classificou o presidente da estatal, Maurício Lopes, como autoritário. Mas minimizou essa postura atribuída a Lopes, considerada por ele como “uma tradição entre muitos que comandaram a Embrapa”.
Segundo Navarro, como os servidores da empresa de pesquisa não são submetidos ao regime das estatais, mas à legislação trabalhista como qualquer empresa privada, a possibilidade de demissões por decisão de superiores gera grande temor dos funcionários.
Ele foi chamado na segunda-feira ao departamento de recursos humanos da empresa, recebeu a carta de demissão, com, segundo ele, o argumento de que “repetidamente” tem sido indisciplinado e que o artigo do Estado “causou danos à empresa e infringe o código de ética”. O pesquisador reafirmou que recorrerá à Justiça para ser reintegrado. “Vou pedir a reintegração e tenho forte esperança em voltar”, concluiu.