Na pequena floresta particular de Giovana, Taniel e Lucas, o sofá, a mesa, os quadros, a televisão e todo o restante do apartamento são meros personagens secundários. As plantas estão por toda parte: entopem uma estante inteira, espalham-se na mesa de trabalho, preenchem a banheira, caem do teto. Na “selva de pedra”, as miniselvas de apartamento estão conquistando jovens na faixa dos 30 anos, que têm buscado formas de trazer a natureza para perto e desacelerar em meio à rotina urbana.

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Em um apartamento de 82 metros quadrados no Sumarezinho, na zona oeste de São Paulo, a produtora cultural Giovana Suzin, de 30 anos, acumula aproximadamente 150 plantas. Ela tem uma estante na sala dedicada só às plantas. O próximo passo é tirar a televisão do local para dar espaço a novos vasos e instalar outra estante exclusiva para o “verde” – já encomendada – no escritório.

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Somente quando ir à Feira de Plantas e Flores do Ceagesp se tornou um hábito que Giovana se deu conta do tamanho da paixão. “Quando percebi, minha casa estava dominadas de plantas”, conta. Em vez de ir sozinha, passou a levar amigos. “Nos últimos dois anos, o interesse geral, principalmente da minha faixa etária, cresceu muito. Vários amigos começaram a procurar conhecer mais sobre plantas e comprá-las.”

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O barista Taniel Kurtz, de 34 anos, mora em um apartamento de 42 metros quadrados, próximo ao Minhocão, na zona central, tomado por 40 vasos. À noite, ele desliga as lâmpadas e deixa somente as luminárias acesas para não atrapalhar o desenvolvimento de algumas plantas. Ao sair para o trabalho, avisa: “Estou saindo e volto logo”. O amor pelas plantas tem origem na infância no interior gaúcho e remonta à memória afetiva da própria mãe, que cultivava muitas plantas na casa da família. “Quando fui morar sozinho em São Paulo (em 2015), a primeira coisa que comprei não foi a cama, mas duas plantas”, diz.

Kurtz só percebeu que a relação com as plantas se tornou séria quando se viu comprando três tipos de planta por semana. “E as pessoas que me visitam também ficam bem assustadas com a quantidade de plantas que tenho.” Diariamente, o barista reserva uma hora e meia para checar o estado de saúde de cada planta. Aos domingos, dedica pelo menos quatro horas. Além de manter luzes menos diretas no período noturno dentro de casa, ele também dá banho em três delas, no box do próprio banheiro. Por causa da folhagem maior e mais grossa, a rega dura 30 minutos sob o chuveiro.

“Planta traz bem-estar ao ambiente. Quando vou para a casa de amigos sem plantas, tenho a sensação de estar em um escritório. As pessoas deixam a casa parecida com o lugar onde trabalham. As plantas trazem aconchego e vida para o apartamento.”

Na Santa Cecília, região central, até a banheira do designer de jogos Lucas Carvalho, de 30 anos, virou uma minisselva. No apartamento de 110 m², são ao menos 80 plantas. Para sistematizar a rotina, ele criou uma lista com a catalogação de todas as espécies e o calendário de dias da semana para a rega. Por ser freelancer, Carvalho pode dedicar mais tempo e atenção às plantas de estimação. “Sou extremamente acelerado. No meu caso, as plantas ajudam muito a me manter focado. Cuidar delas é o momento que tenho de reduzir a velocidade, olhar cada uma delas com mais calma e focar.”

Cursos

A busca por mais conhecimento sobre plantas também foi diagnosticada na Escola de Botânica. Em 2017, houve aumento de quase 300% de alunos, e 85% do público é de jovens entre 25 e 35 anos. O curso mais procurado na escola é o de cultivo de plantas em apartamentos.

Segundo o idealizador da escola, o biólogo e botânico Anderson Santos, a instituição “praticamente nasceu com esse curso”. Antes de criar a escola, que foi pensada para traduzir a linguagem científica da botânica para leigos, ele investigou em São Paulo quais eram as dúvidas das pessoas sobre plantas. “A maior parte era sobre a dificuldade de cultivar plantas em apartamento por causa da limitação da luminosidade.”

Na Escola Municipal de Jardinagem, o curso mais procurado é o de hortas. A maioria dos interessados, segundo o diretor Adão Martins, busca informações para o cultivo de ervas aromáticas e temperos em espacinhos livres do apartamento. “As inscrições se esgotam em poucas horas. As pessoas têm procurado formas de cultivar alimentos de forma mais saudável em casa”, conta. “No momento em que a pessoa fica mexendo com planta, parece que ela esquece do mundo. Já está comprovado que trabalhar com terra tem efeitos terapêuticos muito importantes.”

Se depender do público na faixa dos 30 anos que tem procurado se reconectar à natureza dentro do próprio apartamento, cada bairro teria uma loja de plantas. Por enquanto, as zonas oeste e central de São Paulo – principalmente Santa Cecília e Pinheiros – são as primeiras que têm visto surgir espaços para venda de plantas, e não somente de flores. A novidade é que os locais agora “vendem” a ideia de um atendimento lento, amigável e familiar. Além disso, a comercialização das plantas nasce associada a outros serviços, como café e até estúdio de tatuagem.

Lojas de plantas valorizam tempo e prosa

Um exemplo de loja de plantas e café é o Jardin do Centro, na Santa Cecília, região central. Criado em 2015 somente para a comercialização de plantas, a demanda para a instalação de um café surgiu de conversas com os clientes. A proprietária Ina Amorozo, de 31 anos, conta que a frase que mais se escuta no Jardin hoje é “Nossa, posso morar aqui?”.

Segundo ela, as plantas remetem à memória afetiva e, portanto, o tempo dedicado à venda precisa ser diferenciado. “As pessoas vêm, falam da planta, da família, da avó, da infância. Planta tem uma carga emotiva muito grande. E escolhemos coisas simples, mas saborosas, para vender no café. É o café coado com leite e bolo. As pessoas se sentem acolhidas”, diz ela.

O Jardin tem plantas que variam de suculentas (R$ 3) a cactos (R$ 215), mas as mais vendidas continuam sendo as mais fáceis de cuidar: espadinha-de-são jorge, jiboias e zamioculcas.O sucesso da dobradinha foi tanto que Ina e o marido abriram um segundo café com loja de plantas, o Quintal do Centro, na Vila Buarque.

Extensão de casa

Há um ano, em Pinheiros, na zona oeste, três amigas se instalaram com a proposta de vender plantas e oferecer outros serviços. Na Botanista, espaço criado por uma ilustradora botânica, uma cozinheira e uma fitoterapeuta, são realizados encontros, cursos e happy hours. “O espaço foi criado para ser um lugar gostoso, uma extensão das casas”, diz Elissa Rocabado, tatuadora especializada em botânica. Cada planta leva uma cartilha com orientações sobre frequência de rega e tipo de iluminação, além de adubo orgânico. “Demanda muito mais tempo. Não é a toque de caixa”, diz Elissa. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.