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São Paulo – A Via Campesina deposita mais esperanças no governo do presidente Hugo Chávez, da Venezuela, do que no de Luiz Inácio Lula da Silva. Seus líderes acreditam que o presidente venezuelano conseguirá manter o território de seu país livre de transgênicos, executará uma extraordinária reforma agrária e ajudará a impulsionar os movimentos sociais. Ao mesmo tempo, criticam a forma como Lula agiu na questão dos transgênicos, a lentidão na execução do Plano Nacional de Reforma Agrária e a política econômica do ministro Antônio Palocci.

Outro fator decisivo na comparação entre os dois presidentes é a posição que cada um deles assume frente à Organização Mundial do Comércio (OMC). Enquanto Chávez é elogiado por enfrentar a organização mundial, Lula é acusado de complacência. "É deplorável a maneira como o governo Lula tem agido, favorecendo as negociações com a OMC e, pior de tudo, pleiteando uma secretaria naquela organização", disse Paul Nicholson, um dos líderes europeus do movimento, ao lado do polêmico francês José Bové.

Discursos à parte, a Via Campesina e o governo brasileiro se dão bem. Em junho, o ministro José Dirceu, da Casa Civil, saudou os participantes da conferência internacional da organização com uma mensagem na qual dizia que o governo estava orgulhoso por terem escolhido o Brasil. Por sua vez, o ministro Miguel Rossetto, do Desenvolvimento Agrário, mantém um diálogo permanente com os líderes da entidade.

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Mas o preferido é sempre Chávez (depois de Fidel Castro, eterno ícone do grupo).

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Belga ficou forte na AL

São Paulo – A Via Campesina surgiu em 1993, na Bélgica, durante uma conferência internacional com representantes de sem-terra e de pequenos proprietários rurais. De lá para cá, a organização realizou conferências, no México, na Tailândia e no Brasil. A próxima deve ser em um país da África. A quarta conferência, em junho do ano passado, reuniu 400 delegados na Vila Kotska, antigo convento jesuíta localizado em Itaici, bairro de Indaiatuba, no interior de São Paulo. É o mesmo local onde se realiza anualmente a assembléia-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).

Com a estruturação da Organização Mundial do Comércio (OMC), em 1995, boa parte da energia da Via Campesina voltou-se para o combate às decisões daquela instituição – considerada o mais fiel guardião dos interesses das empresas transnacionais.

Os militantes da Via Campesina se destacaram nos protestos que marcaram a conferência da OMC realizada em 2003, em Cancún. O agricultor coreano Lee Kyuong-Hae, que se matou durante a semana de manifestações, fazia parte da organização. Ele é lembrado nos encontros de sem terra como uma espécie de mártir que "ofereceu sua vida aos camponeses do mundo para manter viva a decisão de luta e repúdio à OMC" – conforme texto de divulgação distribuído durante a conferência em Indaiatuba.

As principais bases da Via Campesina estão na América Latina, entre organizações de trabalhadores rurais que reivindicam a reforma agrária. Seus parceiros europeus têm objetivos bem diferentes: resistem ao avanço das grandes empresas e desejam a manutenção de subsídios para enfrentar a concorrência externa. Hoje a organização procura se expandir principalmente em direção à Ásia.

Os principais alvos da Via Campesina são instituições que chamam de guardiãs dos interesses das transnacionais. Entre elas figuram a OMC, o Fundo Monetário Internacional, o Banco Mundial e, mais recentemente, a Organização das Nações Unidas (ONU).

A FAO, instituição da ONU voltada para a agricultura e a alimentação, sempre foi vista como aliada na briga pela reforma agrária. Hoje, no entanto, a FAO é acusada de estimular o plantio de transgênicos. Isso é intolerável para a Via Campesina, que vê nas sementes geneticamente modificadas mais uma forma de as grandes empresas controlarem a agricultura no mundo.

Requião é aliado da Via Campesina

São Paulo – Entre os aliados táticos da Via Campesina destaca-se o governador do Paraná, Roberto Requião (PMDB). Dias atrás, ao visitar um assentamento da reforma agrária no município gaúcho de Tapes, acompanhando o presidente venezuelano, Hugo Chávez, ele foi saudado como companheiro. João Pedro Stédile, líder do MST e representante do Brasil na Via Campesina, disse: "Requião é nosso amigo de longa data".

A aliança de Requião com a Via Campesina se consolidou quando ele se opôs ao uso de sementes transgênicas no território paranaense. Na mesma ocasião criticou o governo de Luiz Inácio Lula da Silva por não fazer o mesmo em todo o País e atacou a Monsanto – a empresa de capital americano que detém a patente das principais variedades de sementes transgênicas de soja, milho e algodão. O governador acusou a empresa de contaminar a produção nacional com suas sementes, para disseminar o uso de transgênicos e aumentar dessa maneira o recolhimento de royalties. Isso teria colocado em risco uma rica variedade de sementes de soja desenvolvidas no Brasil.

Foi um discurso afinadíssimo com o do MST e o da Via Campesina, que acusam a Monsanto de impor os transgênicos ao mundo e impedir o uso de sementes desenvolvidas por produtores rurais e institutos de pesquisa de cada país. Neste ano o MST deve pôr em andamento uma campanha contra os transgênicos em áreas urbanas, para dizer à população que ainda não há pesquisas suficientes para saber se os transgênicos causam ou não algum tipo de mal ao organismo.