Para ONGs, pontos fracos ameaçam proposta do Brasil para acordo do clima

As propostas brasileiras para a construção do texto do novo acordo que será apresentado à Convenção do Clima das Nações Unidas em novembro, na COP-15, em Paris, têm pontos frágeis que, se não forem reformulados, poderão se tornar armadilhas para o sucesso da negociação. A análise, divulgada nesta segunda-feira, 1º, foi feita pelas organizações WWF-Brasil e Observatório do Clima, uma rede que congrega 35 ONGs ligadas ao tema.

As propostas do Brasil são contribuições ao rascunho do novo acordo do clima, que será editado a partir desta segunda-feira em uma reunião em Bonn, na Alemanha.

De acordo com as entidades, a proposta apresentada pelos negociadores brasileiros pode produzir avanços importantes na negociação do acordo, mas tem fragilidades que poderão levar à repetição dos mesmos impasses que travam há 20 anos a luta internacional contra as mudanças climáticas.

“A sociedade civil saúda a criatividade dos negociadores brasileiros e apoia a maior parte das propostas. No entanto, para que elas signifiquem uma real quebra de impasse, e não apenas um jeito novo de reafirmar as mesmas posições, é preciso que incorporem mudanças importantes”, diz a análise.

O texto divulgado pelas ONGs incluem uma série de recomendações para modificações na proposta. A lista de recomendações, que foi entregue ao Itamaraty, concentra-se em quatro pontos: a diferenciação entre os países, os ciclos de compromisso, o mecanismo econômico e a agenda de corte de emissões até 2020.

“O Brasil é reconhecido no mundo inteiro como país de negociadores extremamente habilidosos e conta em geral com boa vontade. É preciso usar esse capital para produzir avanços reais no acordo”, disse Carlos Rittl, secretário-executivo do Observatório do Clima.

Para André Nahur, coordenador do Programa Mudanças Climáticas e Energia do WWF-Brasil, o País conseguiu avanços claros com a diminuição das emissões graças à queda do desmatamento, mas no momento atual, o protagonismo dos países para uma economia de baixo carbono é cada vez mais urgente. “O ano de 2015 tem deixado claro os efeitos das mudanças climáticas na vida das pessoas”, declarou.

André Ferretti, gerente de estratégias da conservação da Fundação Grupo Boticário e coordenador-geral do Observatório do Clima, destacou que o mundo não tem mais tempo para um novo fracasso como o da COP-15, em 2009. “Em Copenhague, finalizamos as discussões globais sobre clima sem metas concretas de redução de gases de efeito estufa. Agora, o estabelecimento de um acordo internacional relacionado à questão climática é uma necessidade urgente”, explicou. “Obter novos resultados de significância mundial só será possível com a adoção de novas posturas por parte dos países, a partir movimentações políticas que representem o real desejo de mudança.”

Uma das principais propostas brasileiras ao texto para o acordo de Paris é a chamada “diferenciação concêntrica”. Com esse conceito, os países são diferenciados em três círculos: os países industrializados teriam metas absolutas para toda a economia, os países intermediários teriam metas relativas e os países menos desenvolvidos teriam metas voluntárias. Com o tempo, todos migrariam para o círculo central.

De acordo com análise, a ideia é boa, mas, se os países não industrializados puderem escolher quando migrarão na direção do círculo interno, a proposta significará mais do mesmo.

As ONGs recomendam que a transição entre os círculos não seja deixada a cada parte: “é preciso criar mecanismos que orientem e incentivem o trânsito dos países rumo ao círculo central e compromissos adequados, dando maior fatia de contribuição a quem teve mais responsabilidade pelo problema e capacidade de atacá-lo”, diz o texto.

Outra proposta analisada foi a de que os períodos de compromisso do novo acordo sejam de cinco anos, com uma meta indicativa para os cinco anos seguintes. Para as ONGs, um mecanismo desse tipo permitiria mais flexibilidade para o aumento da ambição, caso as revisões periódicas indiquem que as metas são insuficientes. Mas, segundo a análise, seria preciso que o Brasil apoiasse um processo de revisão de metas que considere o esforço de cada país – e não apenas o agregado do mundo. “Além disso, o Brasil não quer medir o impacto de metas individuais, mas quer usar a atribuição individual de responsabilidade histórica. Isso é incoerente”, diz o texto.

Quanto ao mecanismo econômico, a análise indica que o Brasil tem se posicionado de forma conservadora – e recomenda que o País não se posicione contra uma ampla precificação do carbono, pelo menos para os países emergentes. Segundo o texto, o Brasil “não deve descartar precificação de carbono no País, como parte de um esforço global”.

O texto recomenda ainda que o Brasil defenda incentivos e mecanismos orientados para setores específicos, que tem potencial para reduções além das metas de cada país em desenvolvimento no período até 2020.

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