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Ricardo Stuckert / ABr
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Lula: "Severino é meu aliado. O partido dele faz parte da base do governo".

Brasília – Na primeira entrevista coletiva aos jornalistas brasileiros, ontem, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva teve que responder a uma pergunta incômoda para qualquer governante: "O governo erra, presidente?", indagou um repórter, que pediu a Lula para listar os três equívocos principais que poderiam ser atribuídos à sua responsabilidade. "Erra, erra muito", respondeu, de bate-pronto, o presidente.

Mas, logo depois, emendou, bem-humorado, e arrancando risos dos jornalistas: "É difícil reconhecer um erro num governo que acerta tanto". O primeiro erro que o presidente se lembrou de citar foi a eleição do presidente da Câmara dos Deputados, Severino Cavalcanti (PP-PE). O governo poderia ter interferido mais na disputa, em favor do candidato oficial, o deputado Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP). Isso apesar de, durante a campanha na Câmara, dez ministros terem participado de atos de apoio ao petista. "Talvez tenha sido um erro o governo não ter participado mais da sucessão na Câmara. A história vai dizer se sim ou se não", afirmou Lula.

Antes, em resposta a uma outra pergunta sobre o relacionamento com o presidente da Câmara, Lula tinha feito questão de manter a política da boa vizinhança: "Severino é meu aliado. O partido dele faz parte da base do governo. A eleição à presidência da Câmara foi democrática. Sorte dele que ganhou, azar dos que perderam". Lula afirmou ainda que não cabe ao presidente da República escolher o presidente da Câmara dos Deputados. Apesar das recentes derrotas que o governo sofreu neste início de mandato de Severino, Lula se disse grato ao Congresso por ter conseguido aprovar nos dois anos reformas importantes como a do Judiciário, a tributária e a da Previdência.

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Dentro dos erros do governo, Lula citou ainda obras que gostaria de ter feito em rodovias e ainda não conseguiu. "Não conseguimos fazer as obras nas rodovias brasileiras que eu gostaria de fazer, e conheço os desmandos desde 1992, quando as percorri na Caravana da Cidadania", disse. O terceiro equívoco, segundo Lula, é não ter conseguido encontrar uma alternativa para conter a inflação que não seja o aumento dos juros. "É um erro a gente ter feito que os juros sejam o único padrão de controle da inflação", reconheceu.

Nesse momento da entrevista, Lula disse que possivelmente o governo tenha cometido outros erros que ainda não se deu conta e pediu que a imprensa o ajude a identificá-los. "Podemos ter outros erros. Mas tem aquela história. O pai nunca vê o defeito do filho. Só quando conversa com alguém de fora fica sabendo. Possivelmente tenhamos muitos erros. Esperamos que vocês publiquem, que vocês falem para que possamos ir consertando as coisas", afirmou.

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Cerca de 160 profissionais de imprensa, entre repórteres, editores, cinegrafistas e fotógrafos participaram da entrevista coletiva do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no salão oeste do Palácio do Planalto. O presidente respondeu rigorosamente as 14 perguntas previstas e abriu a entrevista afirmando que esta seria a primeira de uma série de entrevistas que dará a partir de agora, em Brasília e em outros estados.

Reajuste para os militares é um desafio

Brasília – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ontem que o governo trabalha fortemente para conceder o reajuste prometido aos militares. Dos 33% de reajuste anunciado pelo governo, a categoria recebeu 10% em setembro de 2004 e teve, na época, a promessa de um novo aumento. O presidente considerou a reivindicação pertinente e lembrou a frase de um ministro do regime militar: "Todo trabalhador que se contentar com o que ganha não merece o que ganha". Não tenho responsabilidade apenas com militares, mas com o servidor público como um todo. Vamos tratar a questão com carinho para encontrar um jeito de dar um reajuste dentro da possibilidade do nosso orçamento", afirmou.

E continuou: "Da mesma forma que não posso dar tudo que um filho deseja, tenho que dizer o mesmo à sociedade brasileira. Mas estamos fazendo o máximo que podemos fazer".

Lula também destacou a colaboração do apoio do Congresso que, segundo ele, sempre apoiou o governo nas medidas importantes. "Sou grato ao Congresso por tudo que conseguimos fazer", afirmou. Ele acrescentou que acredita no apoio do Congresso principalmente agora que a Lei de Diretrizes Orçamentárias estabelece limites para a carga tributária e para as despesas de governo, mas deverá garantir mais dinheiro para investimentos.

Lula defende o ministro: ‘Eu e  Palocci somos unha e carne’

Brasília – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva negou ontem que haja descompasso entre ele e o Ministério da Fazenda, especialmente em relação aos juros. Indagado se as mudanças na equipe econômica anunciadas quinta-feira por Antônio Palocci indicam fortalecimento da ortodoxia na política monetária, Lula disse que tem plena confiança no ministro da Fazenda e que a política adotada por sua equipe objetiva promover o desenvolvimento sustentado do País. No entanto, ele diz que o Brasil conviveu por muitos anos com inflação fora de controle e é preciso cautela.

"Muitas vezes há um descompasso entre o que eu quero fazer pra mim e o que posso fazer pra mim. Na política então isso acontece toda hora. Eu e Palocci somos unha e carne. Tenho total confiança nele", afirmou, ao lado do vice-presidente, José Alencar, um dos maiores críticos à alta de juros promovida pelo BC.

META DE INFLAÇÃO – Lula confirmou que seu governo perseguirá, "pelo menos neste ano", a meta de 5,1% para a inflação de 2005. "Por enquanto, a nossa meta é chegar aos 5,1% que nós mesmos determinamos. Na hora que a gente colocar a inflação no patamar de países desenvolvidos, certamente vamos colocar os juros também no patamar dos países desenvolvidos. Não vou permitir que a inflação volte a ser o grande ladrão do salário do trabalhador desse País", disse.

OUTROS MECANISMOS DE COMBATE À INFLAÇÃO – O presidente afirmou que está convencido de que "os juros não são o único instrumento de combate à inflação". Perguntado sobre que outras medidas poderiam ser adotadas, o presidente citou uma frase que diz ter ouvido do ex-presidente da Câmara Ulysses Guimarães: "Nem tudo o que você faz na economia você pode avisar antes".

Segundo Lula, se o governo determina uma meta de inflação, o BC tem de buscar essa meta e só tem como mecanismo a taxa de juros. O presidente reiterou que não fará medidas aventureiras em relação à inflação: "Não vamos brincar com coisas que podem causar muito prejuízo a esse País".

Lula criticou "determinados setores empresariais" que "ainda têm a mentalidade de que na hora que o consumo começa a crescer ele tenta recuperar o que não ganhou nos anos anteriores". Como uma das medidas para combater a alta de preços, Lula lembrou que os ministros "Palocci e Furlan decidiram reduzir alíquota de importação do aço". "Com outros produtos podemos fazer isso, mas temos regras do Mercosul que precisamos respeitar", disse.

JUROS BANCÁRIOS – O presidente voltou a dizer que cabe também à sociedade, e não apenas ao governo, tomar ações que levem os bancos brasileiros a cobrar juros mais baixos de seus clientes: "Recentemente o Unibanco reduziu a taxa de juros na expectativa de que clientes de outros bancos sairiam para ele e ficou muito chateado por que isso não aconteceu. Ou a propaganda não foi correta ou não é tão simples a pessoa se mover para trocar de banco. Só vai mudar isso quando o povo começar a agir com mais cobrança. Não apenas que o governo faça, mas a sociedade pode ir reeducando o sistema financeiro. Eu, enquanto cidadão, não posso deixar o cartão de crédito estourar, por que vai ter um juro que não vou poder pagar".

Ao comentar os juros do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal, Lula disse que eles são mais baixos do que os do mercado, embora ambas instituições funcionem como bancos privados: "Já está mais baixo do que os bancos privados e temos que trabalhar para que baixem mais. Isso já está acontecendo com o crédito consignado".

SALÁRIO MÍNIMO – Entre as medidas positivas adotadas por seu governo, Lula destacou o aumento do valor do salário mínimo. Segundo ele, em 2003 o salário mínimo comprava 1,2 cesta básica e atualmente compra 1,9. De acordo com ele, o mínimo chegará a duas cestas básicas com o reajuste a partir de 1.º de maio, quando passará dos atuais R$ 260 para R$ 300. Lula destacou ainda que o mais importante é dar condições para que cada vez um número maior de trabalhadores receba mais do que o mínimo. "Vamos caminhando a passos largos para conquistar um salário mínimo que possa dar dignidade a todos os trabalhadores", disse.

COOPERATIVAS – O presidente disse ainda que gostaria que os comerciantes brasileiros se organizassem em cooperativas e disse que sonha em transformar o Brasil no maior país cooperativado do mundo: "Numa cooperativa as pessoas são mais solidárias".

Bem-humorado durante toda a entrevista, que durou cerca de uma hora de meia, Lula só demonstrou irritação quando foi perguntado se dormia tranqüilo mesmo sabendo que não conseguiu fazer tudo o que gostaria de fazer pelo povo brasileiro. "Lamentavelmente não tenho varinha mágica, espero que na outra encarnação eu tenha. Durmo com a minha cabeça tranqüila, mas sempre com a preocupação de fazer mais, mais, porque o desejo de fazer mais é quase insaciável pra mim."