País negocia busca por desaparecidos no Cone Sul

Brasília – Apesar da reação dos militares brasileiros, o governo federal vai liderar um pacto com países vizinhos para esclarecimento de crimes políticos e localização dos corpos de desaparecidos durante as ditaduras que varreram o continente sul-americano nas décadas de 60 a 80. Espécie de Operação Condor ao avesso, o acordo inclui a troca de informações entre governos e ONGs de direitos humanos desses países e servirá de subsídio aos processos de indenização aos familiares das vítimas.

À frente das negociações internacionais, o ministro Nilmário Miranda, da Secretaria Especial de Direitos Humanos, informou ontem que estão adiantados os entendimentos com representantes dos governos dos demais países do Mercosul (Argentina, Uruguai e Paraguai), mais Chile e Bolívia. "Não há como apagar a história, temos que ter serenidade para lidar com o nosso passado e reparar os erros", disse Nilmário. Ele acha que a reação foi isolada. "Os militares estão comprometidos com o projeto democrático do Brasil".

Os dirigentes da área de direitos humanos dos seis países acertaram uma agenda ao longo de 2005 para construção do pacto. O ponto alto ocorrerá em maio, quando será inaugurado o Memorial do Desaparecido na região da tríplice fronteira, na divisa entre Brasil, Paraguai e Argentina. Ainda em maio, será realizada a primeira reunião de altas autoridades em direitos humanos dos países do Mercosul, mais Chile e Bolívia, para delinear os termos de um tratado internacional sobre o assunto, sob a chancela da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).

O pool de países também ajudará o Brasil na tarefa de abrir os arquivos do regime militar, idéia que desagrada a setores das Forças Armadas. A Argentina, com o "Arquivo Nacional de la Memoria", inaugurado há dois anos e o Paraguai, com o "Arquivo del Terror", aberto há quase dez anos, estão à frente do Brasil nesse ítem. Mas, segundo Nilmário, o governo federal tem dado passos significativos para se nivelar à comunidade internacional.

Repressão política conjunta

Brasília – Capitaneado na década de 70 pelo regime do ditador chileno Augusto Pinochet, a "Operação Condor" foi um acordo de repressão política firmado entre as ditaduras do Cone Sul. Signatário desse pacto, o Brasil teve dezenas de militantes de esquerda presos pela polícia dos países vizinhos e entregues às autoridades brasileiras. Muitos registros da época foram apagados no Brasil, mas existem documentos, testemunhas e informações nos demais países que podem ajudar a elucidar os desaparecimentos. Há indícios de que vários militantes foram assassinados, sendo sete com colaboração argentina, um com ajuda boliviana e seis mediante informações do serviço secreto chileno, a Dina. O governo brasileiro espera agora, com a abertura dos arquivos secretos e a cooperação internacional, encontrar evidências da forma como eles foram mortos e pistas para localização dos corpos. Entre as vítimas estaria Onofre Pinto, da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), atraído para o lado brasileiro por agentes da repressão argentina e fuzilado numa cilada junto com outros seis guerrilheiros. Um dos fuzilados, Enrique Ernesto Ruggia, era argentino e seus familiares estão pedindo indenização ao governo brasileiro. No final do ano passado, o governo federal assumiu a responsabilidade pela morte de dois militantes de esquerda argentinos seqüestrados no Brasil e entregues à ditadura argentina. Horácio Domingo Campiglia e Mônica Susana Pinus de Binstock foram presos em 12 de março de 1980, ao desembarcarem num vôo que vinha de Caracas. A seguir, foram entregues clandestinamente, às autoridades argentinas e nunca mais vistos.

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