O Colégio Santa Cruz, no Alto de Pinheiros, zona oeste da capital paulista, teve nesta terça-feira, 26, renúncia coletiva de seu Conselho de Administração. Em carta, os conselheiros explicam que a decisão ocorre após a Congregação de Santa Cruz, mantenedora do colégio, aumentar sua ingerência na escola. A mudança preocupa os pais de alunos, que já temem uma descaracterização do projeto pedagógico.
Um dos mais tradicionais colégios da elite paulistana, o Santa Cruz é frequentado por filhos de empresários e banqueiros. Tem entre seus ex-alunos o presidente do Banco Itaú, Candido Botelho Bracher, que era um dos integrantes do conselho da instituição.
Com 67 anos, o colégio há mais de 20 anos era gerido pelo Conselho de Administração, que tinha autonomia para nomear diretores e administrar o orçamento. Na última reunião, porém, a mantenedora informou que transformaria o conselho em órgão apenas consultivo, o que resultou na renúncia.
Desde 2010, quando irmãos religiosos americanos assumiram a liderança da congregação, no lugar de padres canadenses que fundaram o colégio, havia receio de que a escola pudesse perder o caráter leigo. Embora façam parte da mesma entidade, os americanos são considerados mais conservadores. Os canadenses são vistos como mais progressistas e engajados com problemas sociais.
A carta de renúncia coletiva explica que, em 2016, os irmãos implementaram uma administração centralizada para as três escolas da congregação no Brasil – incluindo o Colégio Dom Amando, em Santarém, no Pará, e o Notre Dame, em Campinas (SP), fundados pelos americanos. A escola de Campinas tem perfil socioeconômico semelhante ao do Santa Cruz, mas nunca teve direção leiga completa (os diretores são escolhidos pela congregação).
A centralização da administração passa a ser agora em Campinas. Assim, o Conselho de Administração do Santa Cruz terá de responder aos executivos no interior do Estado ou ao Conselho de Congregação, composto unicamente por religiosos, segundo informa a carta. “Tendo representado os ideais dos padres fundadores junto à comunidade, alguns de nós há mais de 20 anos, julgamos necessário tornar pública esta carta, como uma forma de prestação de contas e formalização da nossa renúncia”, diz o texto, que tem como signatários, além de Bracher, o cientista Fernando Reinach, presidente do colegiado, o administrador Ricardo Belotti e o engenheiro Lair Krahenbuhlr – ex-alunos, com exceção do último.
Direção e pais
Em circular enviada às famílias de alunos, a direção do colégio agradece aos integrantes que deixaram o colegiado “por diferenças de pontos de vista em relação à natureza do conselho”. Afirma ainda que, em breve, serão anunciados os novos membros, que se juntarão aos atuais conselheiros: padre José de Almeida Prado, padre Roberto Grandmaison, irmão Ronnie Lenno Farias Silva, Flavia Cristina Piovesan e Denise Aguiar Alvares.
Em nota, a direção do colégio diz que a alteração não trará nenhuma mudança nos princípios pedagógicos ou curriculares. Também informou que o Santa Cruz é uma “escola católica pluralista aberta a todas as opções religiosas” e seguirá oferecendo “ensino humanista para formar cidadãos críticos e atuantes”. “As mudanças no Conselho Administrativo devem trazer renovação e importantes colaborações para a gestão da escola”, afirma.
Mas um grupo de pais já enviou uma carta aos ex-conselheiros e à direção do colégio em que diz ter recebido a notícia da renúncia com “surpresa e preocupação”. Eles temem que o projeto pedagógico da escola possa ser descaracterizado, por exemplo com o aumento da carga horária de disciplinas voltadas ao ensino religioso.
Apesar de católico, o Santa Cruz passou na década de 1990 por um processo de laicização, quando deixou de ter diretores ligados à Igreja. Atualmente, os alunos têm aulas sobre História das Religiões e têm a opção de fazer catequese no colégio. A preocupação dos pais seria com a volta de um caráter mais religioso, o que pode afastar famílias não católicas. Estima-se que cerca de 15% dos alunos sejam judeus. A reportagem tentou contato com a Congregação por telefone e e-mail, mas ninguém foi localizado. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.