Uma rede circular, que daria a volta no que hoje os técnicos de trânsito chamam de “rótula central” – o círculo que sai da Praça da República, passa pelas Avenidas Ipiranga, São Luís, Viadutos Jacareí e 9 de Julho, segue pela Praça João Mendes e volta à República, pela Rua Boa Vista. Se tivesse havido disposição política e recursos, essa seria a “cara” inaugural do metrô de São Paulo, cuja empresa responsável completa 50 anos nesta terça-feira, 24.
A Companhia do Metropolitano de São Paulo foi fundada pelo prefeito Faria Lima em 24 de abril de 1968, em plena ditadura militar. Mas a discussão sobre uma rede de transporte subterrâneo vem desde o fim do século 19 – Londres, na Inglaterra, era a grande referência.
Ainda hoje, metroviários amantes da história da empresa guardam, na memória e em arquivos, as origem da rede. O primeiro projeto foi idealizado pelo engenheiro Felipe Antônio Gonçalves e finalizado em 1906. “Ele tinha conseguido, com a Câmara Municipal, autorização para explorar o subterrâneo da cidade”, afirma o historiador Ayrton Camargo, funcionário do Metrô de São Paulo.
Camargo compilou nove traçados estudados por governos e empresas privadas antes de o projeto oficial ser lançado – o que só ocorreu depois da primeira Pesquisa Origem-Destino da cidade, que identificou as reais demandas de transporte público da capital paulista e vem sendo realizada a cada década (atualmente, a empresa está realizando a sexta edição do estudo). A pedido da reportagem, os projetos foram repassados para apresentar a história da empresa.
Primeiro esboço
O plano de Gonçalves circulava toda a capital da época. Era uma cidade de 240 mil pessoas. Mas o projeto esbarrou na Light, uma gigante da época, que distribuía energia, gás, cuidava da rede de bondes e detinha o monopólio do transporte elétrico. Segundo Camargo, com ajuda da Prefeitura, a empresa conseguiu fazer o projeto de Gonçalves não prosperar.
Mas o historiador conta que a própria empresa terminou por fazer uma proposta de metrô: apresentada em 1927, a rede tinha traçados que poderiam lembrar parte do que hoje são as linhas 1-Azul, 3-Vermelha (entre o centro e a então zona leste da época, o bairro da Penha) e a Linha 4-amarela.
Segundo o historiador, a empresa decidiu fazer seu plano como resposta às críticas que os bondes sofriam naqueles anos. O momento da apresentação foi durante a renovação dos contratos de concessão. “A tarifa ficou congelada em 200 réis por um longo período, o que sucateou os bondes”, afirma.
No caso do plano da Light, foi o contexto político que engavetou a proposta. Camargo lembra as turbulências do período: a Revolução de 1930, a Revolução Constitucionalista de 1932 e o Estado Novo, em um litígio com o governo federal que duraria até 1945, como motivo da não implementação.
Defensor do transporte de massa, o historiador aponta como “vilão” um personagem que entrou para a história como um dos grandes urbanistas da cidade. Francisco Prestes Maia, prefeito indicado para o cargo entre 1938 e 1945, era um ferrenho crítico dos bondes e defensor das rodovias – e dos ônibus. “Ele não gostava dos bondes”, diz Camargo.
Assim, foi só após a sua saída do poder que as discussões ganharam força. Entre os anos de 1940 e 1960, cinco novas propostas foram discutidas na cidade. Uma delas, feita sob encomenda de um escritório francês, propunha uma rede de 40 quilômetros e também guardava semelhanças com a rede atual.
O Metrô
A decisão de se criar o metrô, entretanto, só foi tomada em 1967, já na ditadura militar. O prefeito (eleito) era o brigadeiro Faria Lima. Ele foi beneficiário de uma reforma tributária que engordou os cofres públicos. No discurso que marcou a criação da empresa, registrado pelo jornal O Estado de S. Paulo, destacou que o custo de implementação do Metrô consumiria 11 orçamentos anuais da Prefeitura. Mas que, naquele 1968, seria necessário apenas um orçamento – os altos custos terminaram fazendo o governo estadual assumir a empresa.
O traçado inicial saiu após a primeira Pesquisa Origem-Destino, de 1967, que apontou os reais deslocamentos na cidade. “A pesquisa é feita até hoje e, com ela, podemos calcular a demanda de cada estação com precisão”, diz o diretor de planejamento e expansão dos transportes metropolitanos do Metrô, Alberto Epifani – ele mesmo um estagiário na época. No primeiro ano de operação comercial, em 1974, a média era de 3 mil passageiros por dia. Hoje, é de 4,5 milhões. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.