No mesmo dia em que o governo brasileiro se ofereceu para ser a sede da 25.ª Conferência do Clima da ONU, em 2019, o País recebeu uma honraria indesejada pelos países durante as negociações climáticas: o “Fóssil do Dia”. O “prêmio” é dado pela Climate Action Network, uma rede de ONGs ambientalistas, para os países que ou estão atravancando as conversas na conferência ou não tomando internamente as ações necessárias para o combate às mudanças climáticas.

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Para o grupo, a discussão no Congresso brasileiro da Medida Provisória 795, que prevê uma extensão de subsídios à indústria de petróleo e gás, se encaixa nesse critério. “O fóssil de hoje vai para o Brasil, por propor um projeto de lei que poderia dar às companhias de petróleo US$ 300 bilhões em subsídios para perfurar suas reservas offshore”, explicaram.

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O número vem de uma análise da assessoria legislativa da Câmara, que calculou que o governo renunciaria a cerca de R$ 1 trilhão apenas com o pré-sal ao longo de 25 anos. A MP, enviada pelo presidente Michel Temer em regime de urgência, já foi aprovada em comissão especial do Congresso criada para avaliá-la e agora precisa passar pelos plenários.

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Em mensagem lida durante a “premiação”, os ambientalistas ironizaram sobre a taxa de aprovação pública do presidente. “É de 3%, aproximadamente, a mesma que a margem de erro das pesquisas. Mas certamente, as grandes empresas de petróleo têm uma opinião sobre ele melhor do que os eleitores brasileiros”, disseram.

“O objetivo da medida é acelerar o desenvolvimento da camada de pré-sal ultraprofunda, uma reserva do petróleo offshore que se pensa conter 176 bilhões de barris recuperáveis. Se esse óleo fosse queimado, o Brasil sozinho consumiria 18% do orçamento de carbono restante para (o planeta aquecer) 1,5°C, acabando com nossas chances de afastar o mundo de uma catástrofe climática”, continuaram.

E concluem: “O engraçado é que o governo brasileiro parece estar totalmente ciente de que está cometendo uma falta. Como um funcionário do governo disse com franqueza, ‘o mundo está indo em direção a uma economia de baixo carbono. Haverá petróleo no chão, e esperamos que não seja nosso'”.

O ministro do Meio Ambiente, Sarney Filho, que lidera a delegação brasileira e representa o governo brasileiro na COP, não comentou sobre o prêmio. Mas na segunda-feira, em reunião com a sociedade civil presente ao evento, ele já tinha demonstrado desconforto com a MP, que ele disse considerar um “absurdo completo”.

“Eu fui surpreendido também, nem sabia dessa MP. Acho que a maioria não sabia. Está há dois meses no Congresso e só agora que foi tornada pública”, comentou. “É uma iniciativa do Ministério da Fazenda, só tem assinatura do ministro da Fazenda, e lógico que me deixou perplexo. Estava na pauta para ser votado na semana passada. Logo que eu soube, liguei para o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e disse que era inaceitável, que iria responsabilizar o Congresso”, afirmou na conversa.

“É um prêmio merecido. Vai contra o que o País vem dizendo aqui na COP de que está comprometido com o combate às mudanças climáticas. Mas em vez de anunciar investimentos em renováveis, em transporte público, carro elétrico, está em casa, como se tivesse surtado, defendendo fóssil”, afirmou André Ferretti, da Fundação Grupo Boticário e do Observatório do Clima. “E justo no dia que o Brasil anunciou a candidatura e é a Proclamação da República”, complementou.

COP 25

O ministro Sarney Filho havia entregue mais cedo uma submissão à secretária executiva da Convenção do Clima da ONU (UNFCCC), Patrícia Espinosa, oferecendo o País como sede para a COP de 2019. “O Brasil tem uma longa história de construção de pontes entre países, e espera continuar essa tradição”, afirmou o ministro, de acordo com sua assessoria de imprensa. “A COP 25 será um marco importante na preparação para a implementação do Acordo de Paris, e o Brasil tem o prazer de se disponibilizar para sediar este importante evento.”

Pelo sistema de rotação das conferências estabelecido pela Convenção do Clima da ONU, a cada ano ela deve ocorrer em um continente diferente. No ano passado foi na África (Marrakesh). Neste ano é na Alemanha, mas a presidência é de Fiji, pequena ilha do Pacífico. No ano que vem volta para a Europa, com a Polônia na presidência, e em 2019 deverá ser na América Latina.

A última vez que o continente recebeu uma COP foi em 2014, em Lima (Peru). O Brasil nunca recebeu a cúpula, mas foi a sede de duas conferências de desenvolvimento sustentável da ONU, a Rio 92 e a Rio+20.

*A repórter viaja como bolsista do fellowship Climate Change Media Partnership