O Itamaraty tem hoje mais de 300 porteiros, vigilantes, datilógrafos e motoristas de fora dos quadros do Serviço Exterior Brasileiro (SEB), trabalhando em missões como Washington, Paris e Lisboa. Uma exceção prevista na lei que rege o serviço virou regra. Todos recebem pagamento em dólar, verba indenizatória, auxílio-mudança e pagamento de aluguel para exercer funções que poderiam estar nas mãos de funcionários contratados localmente, com custos menores para a União.
Levantamento ao qual o jornal O Estado de S. Paulo teve acesso mostra pelo menos 349 servidores de fora do quadro do Serviço Exterior Brasileiro (SEB), que pertencem ao chamado Plano de Classificação de Cargos (PCC), atuando em 228 postos, incluindo embaixadas, consulados e vice-consulados. Os salários mais baixos pagos a esses servidores no exterior estão em torno de US$ 4,5 mil, com verbas indenizatórias em torno de US$ 2 mil. Os mais altos podem chegar a mais de US$ 9 mil, com verbas indenizatórias de US$ 3 mil.
Em uma conta conservadora, pode-se dizer que esses servidores custam à União cerca de US$ 2,2 milhões por mês, sem contar os aluguéis, também bancados pelo Erário. Em um caso, em Luanda (Angola) – onde os imóveis são reconhecidamente caros – só um funcionário gerou uma despesa de US$ 132 mil entre junho de 2012 e julho de 2012. Ao ano, as despesas com o pessoal alcançam no mínimo R$ 57 milhões.
Os salários são semelhantes aos pagos aos oficiais e assistentes de chancelaria – os primeiros de nível superior, os segundos, técnicos – contratados por concurso e que fazem parte do SEB, mas que não existem hoje em número suficiente para suprir todas as vagas existentes. No entanto, os servidores PCC custam muito mais do que trabalhadores locais.
Um auxiliar de apoio – que pode ser um telefonista, recepcionista ou um motorista – recebe, se for contratado local, cerca de US$ 1,9 mil nos Estados Unidos. Um auxiliar administrativo, que desempenha algumas funções consulares, como tratar de vistos, US$ 2,2 mil. O salário mais alto é o de assistentes administrativos, que recebem US$ 3 mil, segundo informações obtidas pelo Estado nas representações diplomáticas . Também não há verba indenizatória ou pagamento de aluguel.
Concurso
Contratados por portarias, normalmente nas décadas de 70 e 80 – alguns poucos já nos anos 90 – os servidores não passaram por concurso e nem mesmo cumprem as exigências de formação para suprir determinados cargos. A lei que disciplina o serviço exterior, no entanto, prevê que os PCCs possam ocupar funções fora do País, em “caráter excepcional” e desde que sejam aprovados em um curso de formação do Itamaraty.
“São pessoas competentes, trabalhadoras, com um perfil de formação nem sempre adequado. São aproveitadas onde é possível”, explicou o embaixador José Borges dos Santos Júnior, Subsecretário-geral de Serviço Exterior do Itamaraty. Muitos deles, no entanto, por não terem conhecimento do idioma e da cultura local, levam tempo para conseguir realmente exercer suas funções.
Falta
A excepcionalidade virou fato comum. A falta de funcionários para suprir todas as vagas faz com que hajam funcionários não qualificados exercendo funções em quase todos os postos atuais da diplomacia brasileira, nem todos eles tão pouco atraentes ou com dificuldades de encontrar funcionários locais que falem português.
Eles estão, por exemplo, em cidades complicadas como Caiena, na Guiana Francesa, em Brazzaville, no Congo. Mas também em postos cobiçados como as embaixadas em Washington, Lisboa, Paris e Madri. Há, também, oito PCCs em Rivera, no Uruguai, onde se atravessa apenas uma rua para chegar a Santana do Livramento (RS), e nove em Ciudad del Este, que faz front eira com Foz do Iguaçu, no Paraná, cidade com 250 mil habitantes.
Limitações
Diante do crescimento de 47% no número de postos desde 2003 o Itamaraty admite que não tem gente suficiente para ocupar todos as vagas em embaixadas. O déficit de pessoal de apoio ultrapassa hoje mil postos – são 117 para suprir aposentadorias e abandonos e outros 893 para preencher cargos criados. Este ano, o Itamaraty tentou abrir concurso para 150 oficiais, mas o Ministério do Planejamento não autorizou.
O subsecretário-geral do Serviço Exterior, José Borges dos Santos Jr., diz que muitas funções não podem ser exercidas por locais, como a preparação de documentos sigilosos, daí a necessidade de levar servidores. Em outros casos, afirma, há dificuldades de encontrar funcionários locais na área de segurança ou que falem português. Ele confirma que a contratação local é bem mais barata para o País, mas explica que essa nem sempre é uma alternativa. “Também há o fato dos brasileiros preferirem ser atendidos por brasileiros. Isso limita a contratação dos locais.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.