Em seu discurso de posse, o presidente Jair Bolsonaro disse que vai “valorizar a família” e reafirmou um dos pilares de sua campanha eleitoral. No governo federal, é a advogada Angela Gandra Martins que vai capitanear essa agenda. Filha do jurista Ives Gandra Martins, a secretária da Família defendeu a polêmica declaração da ministra Damares Alves, de que “menino veste azul e menina veste rosa”, que disse ser uma metáfora.
“O que ela quer dizer é que a gente vai procurar acentuar o que é próprio de cada um. A gente não vai construir uma outra identidade esquizofrênica dentro dela, vai respeitar o que é natural naquele ser humano.”
Em entrevista ao Grupo Estado, evitou conceituar “família” e disse que vão tentar criar condições para “acolher” a vida, em contraponto ao aborto, mas que não têm mudanças na lei em mente. Sem detalhar, antecipou uma das medidas que estudam na pasta: flexibilizar as regras de adoção no País.
Angela conheceu Damares em agosto deste ano, durante as audiências no Supremo Tribunal Federal (STF) para a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) que discutem a descriminalização do aborto até a 12ª semana. Contrária à medida, a secretária representava a União dos Juristas Católicos de São Paulo na Corte.
A ministra ontem falou que menino veste azul e menina veste rosa. A senhora concorda com essa afirmação?
O que eu vejo é que através da metáfora da ministra tem algo que é filosófico, ou seja, qual é a realidade, qual a identidade de um homem e de uma mulher? É sob esse aspecto que ela quer dizer, vamos potencializar a identidade real, simples, natural de cada ser humano. Nesse sentido que ela está fortalecendo a identidade. Durante muito tempo, na história da humanidade, quando o bebê nascia, a gente tinha o enfeitinho azul e o rosa. É nesse sentido metafórico.
Como assim fortalecimento da identidade?
Culturalmente, o azul foi utilizado mais para meninos e rosa, para meninas. Tem o outubro rosa, novembro azul. Nesse sentido, uma pessoa não vai ter uma identidade porque usa algo azul. Mas o que ela quer dizer é que a gente vai procurar acentuar o que é próprio de cada um. Se o bebê nasce com o sexo feminino, ela vai ser potencializada daquela forma. Ou seja, a gente não vai construir uma outra identidade esquizofrênica dentro dela, vai respeitar o que é natural naquele ser humano.
Respeitar o natural não seria deixar a pessoa escolher a cor da roupa dela?
Se eu pinto o cabelo amarelo, não vai mudar a minha personalidade. Mas o que ela quer dizer, entendo assim, é que vamos acentuar o que é essencial em cada identidade. Não que sejam diferentes em termos de direitos. Agora, existe uma diversidade natural, uma complementaridade.
Como vocês vão lidar com a questão do aborto dentro do ministério? Por dia, quatro mulheres morrem por aborto no País.
Ela falou muito claramente no seu discurso que vamos defender a vida desde a concepção. Vamos encontrar solução para promover vida. A gente sabe que cada caso é um caso, que há casos muito tristes, mas é mais triste botar em risco uma vida.
O que tem hoje de lei, vocês pretendem mudar?
Estamos aterrissando agora, minha secretaria não existia até o dia 2. Mas o que eu posso dizer é que não vai ser um ministério teórico, a gente vai ajudar na prática as famílias brasileiras. Nem estamos pensando em termos legislativos, mas em termos executivos o que vai gente vai fazer, dar opção para que as pessoas possam acolher a vida.
Qual é o conceito de família do governo Bolsonaro?
Não estamos trabalhando com conceito, estamos trabalhando com realidade. Estamos mais preocupado em atender cada pessoa na sua situação. Não tem casos iguais. Queremos acolher, solucionar problemas, para que as relações na família sejam mais sólidas, mais afetivas, sustentáveis.
Casais homoafetivos são considerados família para vocês?
Não quero eu colocar conceitos, porque existe um conceito constitucional de família, que pauta até minha própria profissão. Vi a ministra falar que vai acolher as famílias e citou a dela que não tem marido e tem filha adotada. Vamos trabalhar com fatos e realidade.
Independente se for homem com homem e mulher com mulher?
Essa política não está na nossa secretaria.
O que você achou disso?
Ali vai estar mais protegido do que aqui. Ela não falou que vai proteger? Eu achei muito bonita a reflexão dela sobre o grupo LGBT. Não é a minha seara ficar falando dessas políticas. Te digo que vai ser acolhido.
Durante a campanha, o Mourão falou que famílias sem pais criadas por mães é “fábrica de desajustados”. No País, há mais de 5,5 milhões de crianças sem pai registrado na certidão. Você concorda com isso?
Às vezes, a gente pode interpretar já negativamente. A gente tem sim uma preocupação de que haja uma responsabilidade em relação à criança. Ela talvez precisasse desse amor diverso e complementar. É nesse sentido que ele está falando. A gente quer que realmente haja uma responsabilidade, que cada um exerça seu papel.
Quais vão ser as prioridades da Secretaria?
Ainda não temos definidas as prioridades. Há preocupações em varias vertentes. Também no que se refere a adoção, por exemplo. Porem temos ainda que alinhar e projetar as metas.