Meio político absorve bem reforma ministerial

Meses de expectativa e tensão pareceram evaporar instantaneamente da vida de ministros que quase perderam o cargo e de parlamentares que já eram cumprimentados pelo novo cargo e que por pouco não chegaram à Esplanada. Eles se esforçaram para absorver rapidamente o desfecho da anunciada reforma ministerial, radicalmente restrita pelas declarações desastradas e exigências descabidas do presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE). Alguns ganharam alívio. Outros perderam expectativa de poder. Em ambos os lados, no entanto, ninguém passa recibo.

Brasília (AG) – A senadora Roseana Sarney (PFL-MA) foi cotada para meia dúzia de funções no primeiro escalão. Terminou sem nada, numa desnecessária exposição. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva telefonou à senadora e, segundo testemunhas, a conversa foi suave. O senador e ex-presidente da República José Sarney (PMDB-AP) pode ter guardado as mágoas de pai na geladeira, mas não chegou a deixar que Lula sequer se desculpasse: ?Presidente, nem vamos falar do assunto, porque não havia outra decisão a tomar?.

Por meses, a demissão do ministro da Saúde, Humberto Costa, era dada como certa ? até por ele. Nas últimas semanas, Costa tentou firmar a imagem de bom administrador, com a intervenção nos hospitais do Rio. Não apenas ficou no cargo, como recebeu elogios pelo modelo de eficiência e gestão criticados até 15 dias atrás. Costa em momento algum acusou o golpe: ?Senti minha responsabilidade redobrar com a manifestação do presidente. Vou continuar a trabalhar com a mesma seriedade?, prometeu.

Um dos mais evidentes personagens dessa inútil negociação foi o deputado Ciro Nogueira (PP-PI). Apresentado como ministro, desfilava de braços dados com Severino, seu padrinho político. Com o desfecho da reforma, recolheu-se. Quando a bancada do PP confirmou sua indicação, após o convite do chefe da Casa Civil, José Dirceu, Nogueira mostrou a intimidade que guardava com a prometida pasta das Comunicações: ?Sou um amante delas ( das comunicações)? resumiu.

Apesar do fracasso de todas as articulações que conduziu, Dirceu é outro que não assume a derrota. No dia da posse dos novos ministros, Romero Jucá (Previdência) e Paulo Bernardo (Planejamento), ele preferiu ignorar as seqüelas e marcar uma reunião, providência típica da cartilha petista: ?Não vejo por que os ministros ficariam enfraquecidos. Vamos nos reunir e continuar fazendo o que estamos fazendo?.

O deputado João Paulo Cunha (PT-SP) pressionou o quanto pôde para ser coordenador político, no lugar de Aldo Rebelo (PCdoB-SP). Não conseguiu. E Lula ainda culpou-o indiretamente pela derrota do PT para Severino. Aos amigos, no entanto, ele diz que não está chateado.

Lembrado para o Planejamento, o deputado Jorge Bittar (PT-RJ) mostrava-se tranqüilo na turbulenta semana que passou: ?Fico feliz por ter sido cogitado para uma missão tão importante? disse ele.

Posto cobiçado fica nas mãos de Dutra

Brasília (AG) – Os olhos de vários partidos aliados cresceram em cima do Ministério das Cidades, uma das pastas mais cobiçadas durante os seis meses de discussões sobre reforma ministerial. Diante das pressões, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse várias vezes que não iria demitir o amigo Olívio Dutra. O gaúcho acabou sendo um sobrevivente da reforma. Olívio não gosta de falar sobre o assunto, mas, ao ser perguntado sobre as razões de o Ministério das Cidades ser tão desejado, é direto: ?Esse não é um espaço para promover pessoas?.

Ele afirma que o trabalho na área não ficou paralisado por causa das especulações: ?Tenho uma visão muito clara: esse é realmente um espaço estratégico na construção de um espaço urbano. Não é um ministério de execução de obras e sim de definir estratégias e projetos para que estados e municípios interfiram no espaço urbano, onde moram 84% da população?.

O ministro também reage com um ditado popular às críticas de que sua gestão é ineficiente e que não conseguiu mostrar resultados na execução de projetos ligados à moradia e ao saneamento. ?Num clima de disputa, quem desdenha quer comprar?, diz ele, acrescentando: ?Às vezes, passa-se para a mídia coisas totalmente desqualificadas. Em 2004, executamos mais de 90% do nosso orçamento. São recursos escassos?.

As verbas do Ministério das Cidades têm sofrido cortes pela equipe econômica, mas mesmo assim tem sido o principal alvo de emendas apresentadas pelos parlamentares ao Orçamento da União. Os parlamentares têm interesse em destinar recursos para seus municípios em obras de saneamento e habitação. Mesmo disciplinado, Olívio diz esperar que o colega Antônio Palocci (Fazenda) afrouxe o contingenciamento de verbas, aumentando novamente o orçamento das Cidades para 2005.

Nos cálculos do ministério, dois terços do orçamento são relativos a emendas. A pasta das Cidades ainda administra recursos de fundos, como o FGTS, Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) e o Fundo de Amparo Residencial. O que torna o ministério ainda mais atrativo.

Apesar de críticas, Olívio construiu uma rede de apoio que surpreendeu até petistas de dentro do governo. É vinculado a prefeitos e movimentos ligados à habitação e ao saneamento, além de ter um bom relacionamento com os parlamentares. ?Sou amigo do presidente Lula de longa data, mas estou aqui porque sou um quadro do PT. Tenho a confiança do presidente, estou num cargo que muito me honra e não preciso de palavra de estímulo para trabalhar.?

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