A maioria das escolas públicas da capital – tanto municipais quanto estaduais – não é adaptada para alunos com deficiência. Só 33% das unidades da Prefeitura estão acessíveis. Na estadual, a proporção é de 38,96%. E as regiões que têm mais alunos matriculados com necessidades especiais, em alguns casos, são as que menos têm unidades adaptadas. É o que mostra cruzamento do jornal O Estado de S. Paulo, feito com dados obtidos pela Lei de Acesso à Informação.
Há, hoje, 30,1 mil alunos com algum tipo de deficiência nas duas redes – mais da metade deles com déficit intelectual. Na rede municipal, de 3,5 mil unidades educacionais, só 1.180 são acessíveis. No Estado, apenas 415 das 1.057 oferecem infraestrutura adequada.
É considerada “acessível” a escola que segue os padrões da norma NBR 9050, da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Isso significa que as unidades devem oferecer rampas de acesso e elevadores para cadeirantes, piso com sinalização tátil para pessoas com deficiência visual e barras de apoio, entre outros equipamentos. Além disso, o Estatuto da Pessoa com Deficiência prevê a oferta de profissionais de apoio escolar para cuidar desses alunos.
No caso da rede municipal, novas unidades têm sido construídas já adequadas às normas, mas colégios mais antigos não têm a infraestrutura adequada. Na Escola Municipal Joaninha Grassi Fagundes, no Parque São Luís, zona norte da capital, por exemplo, os cinco alunos cadeirantes da unidade não têm acesso à sala de leitura nem à de informática, uma vez que estudam no térreo e os equipamentos ficam em área inacessível, segundo professores. “Quando a professora precisa fazer alguma atividade na sala de leitura, ela muda para o térreo com os outros alunos”, diz uma funcionária, que pediu para não ser identificada.
Já na rede estadual foi firmado um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) entre o Ministério Público Estadual e a Secretaria da Educação, em 2014, após uma série de reclamações sobre falta de acessibilidade nas unidades. A previsão é de que as adaptações estejam em todos os colégios no prazo de 15 anos.
A defensora pública Renata Tibyriçá, coordenadora do Núcleo dos Direitos do Idoso e da Pessoa com Deficiência, diz que as escolas precisam adaptar-se antes de receber os alunos. “Muitas vezes, eles têm o olhar de só mudar quando o aluno chega. Mas isso já deve ser pensado antes pelo gestor público.” Ela conta que a reclamação mais comum dos pais é a de falta de cuidadores.
Por regiões
As regiões com maior número de alunos com deficiência têm menos escolas adaptadas. A diretoria de Campo Limpo, por exemplo, que tem hoje o maior número de crianças com alguma necessidade especial (2,4 mil), é uma das que menos adaptaram suas escolas – apenas 19,1% das unidades. Em contrapartida, regiões com proporcionalmente menos estudantes com deficiência, como Itaquera, Penha e Butantã, já conseguiram estender o benefício a praticamente metade de suas escolas.
A Prefeitura, em nota, diz que já solicitou a reforma das escolas, com prioridade para unidades com o maior número de alunos com deficiência. Já o Estado destacou que o dado obtido pela reportagem se refere às unidades “completamente adaptadas”, mas que outras escolas podem atender parcialmente às necessidades estudantis. Diz ainda que todas as escolas têm verba para incluir rampas, piso podotátil, corrimãos e outros itens.
‘Ele precisa de muita atenção e não consegue andar’, diz mãe
A dona de casa Márcia Martins de Souza, de 44 anos, deixou o emprego de secretária há quatro anos quando nasceu seu segundo filho, João Victor, diagnosticado com microcefalia.
Nos primeiros meses ela até tentou visitar creches na região onde mora, na Freguesia do Ó, na zona norte da capital, mas desconfiou que o filho pudesse não ter um atendimento adequado. “Ele precisa de muita atenção. Não consegue andar e tem problemas respiratórios. Não sabia se teria alguém para ficar com ele o tempo todo. Achei melhor me dedicar integralmente”, conta. O marido, autônomo, começou a cuidar da renda da casa.
Hoje, Márcia leva o menino para a fisioterapia três vezes por semana, de ônibus. Ele começou a usar cadeira de rodas recentemente e ainda está se adaptando. A mãe já procura escolas na região para matrículá-lo quando chegar aos 6 anos, idade de ingresso no ensino fundamental, mas teme que ele não possa iniciar os estudos. “Aqui na região as escolas não têm cuidador e não têm acessibilidade. Se for para deixar ele na escola só para passar o tempo, sem fazer nada, melhor ficar em casa”, diz.
Mesa
Já a dona de casa Michele da Silva Souza, de 33 anos, conta que tem lutado para garantir à filha Victoria, de 12, portadora da síndrome de DiGeorge, que continue estudando em uma escola regular.
A mãe reclama que é frequente a falta de apoiadores no colégio, que, nestes casos, manda aviso aos pais para que nem levem os filhos para a escola. “Só nesse ano já aconteceu pelo menos umas oito vezes”, diz. Ela diz ainda que a filha, que precisa ser acompanhada para comer e ir ao banheiro, não tem cuidador. “Ela já reclamou de ter passado fome porque não tinha quem pegasse o lanche para ela.
Michele também diz que a filha precisa usar um colete especial, que vai até o pescoço, pois tem escoliose, e que a menina não consegue escrever em mesas regulares, pois não consegue se curvar. “Eu já cansei de pedir a mesa adaptada, mas não adianta. A SME, em nota, diz que vai apurar o caso com “extremo rigor”. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.