Brasília – Preocupado com a possibilidade de uma crise institucional entre os três Poderes e surpreso com a repercussão de suas declarações ontem (24), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tomou a iniciativa, hoje logo cedo, de se explicar e negar publicamente que tenha ofendido o Congresso ou o Judiciário. “Em nenhum momento passou pela cabeça do presidente da República (fazer) qualquer ofensa ao Congresso Nacional ou ao Poder Judiciário”, justificou Lula, ao lado dos presidentes do Senado, José Sarney (PMDB-AP) e da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), antes abordar o assunto do encontro, que era o anúncio da convocação extraordinária do Congresso em julho.
“Se eu não acreditasse nas instituições, eu não teria fundado um partido político, eu não teria sido candidato a presidente da República e não estaria presidente da República”, disse Lula, com a clara preocupação de evitar que fosse acusado de desrespeitar ou afrontar os outros dois poderes. Lula disse ainda que, “se houver algum deputado ou senador que tenha se ofendido”, ele estará “à disposição para conversar com eles quantas vezes for necessário porque nada é pior em política do que o equívoco, ou de as pessoas interpretarem tudo pelas manchetes dos jornais”.
Na defensiva, o presidente Lula disse que se daria ao luxo de ler sua frase dita no dia anterior, “para que não pairem dúvidas a respeito do que eu falei”. Em discurso de improviso na sede da Confederação Nacional da Indústria, ao falar de seu otimismo em relação ao futuro do País, Lula disse as palavras entendidas como um desafio aos outros poderes da República: “Nada, podem ficar certos, que não tem chuva, não tem geada, não tem terremoto, não tem cara feia, não tem o Congresso, não tem Poder Judiciário. Só Deus será capaz de impedir que a gente faça este País ocupar um lugar de destaque, que ele nunca deveria ter deixado de ocupar”.
Depois de repetir esse trecho, o presidente acrescentou: “Em nenhum momento eu falei de reformas no Congresso”. Ao explicar suas declarações, Lula salientou que “foi pego de surpresa com a manchete de um jornal” que destacou que “nem o Congresso Nacional impediria as reformas”. Apesar de, em sua declaração, o presidente Lula não ter usado, de fato, a palavra reforma, ele referia-se ao seu otimismo e à necessidade de se fazer tudo para que o País ocupe lugar de destaque no mundo. Mas ele tem dito reiteradas vezes em seus discursos que as reformas são fundamentais para o Brasil crescer e ocupar lugar de destaque no cenário internacional. O que repetiu ontem, ao fazer a convocação extraordinária do Congresso.
No discurso de ontem, em referência indireta ao Judiciário, Lula comentou que tem sido ofendido e, por cautela, não responde, seguindo uma lição de família. “Aprendi desde pequeno, com a minha mãe: quando um não quer dois não brigam.
Mas o Judiciário quer desculpas
Brasília
– Um dia após o estranhamento entre o Executivo e o Judiciário por causa da declaração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de que ninguém (nem o Judiciário) impedirá o Brasil de ocupar um lugar de destaque, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Maurício Corrêa, preferiu o silêncio. A cúpula do Judiciário evitou aumentar a polêmica, mas não deixaram de dar recados. O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Nilson Naves, disse que o episódio foi superado, embora tenha considerado que faltou um pedido de desculpas do presidente ao Judiciário. “Como o presidente é uma pessoa muito sensata, eu sei que isso vai acontecer logo”, afirmou Naves. Para ele, as reformas precisam da união dos Poderes.O presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Francisco Fausto, preferiu dar um conselho, permeado de crítica, a Lula: “Ele deve falar como presidente, não como sindicalista.” Fausto considera que, mais do que um pedido de desculpas, Lula deveria abrir um canal de negociação com o Judiciário.
Indicado por Lula, o novo ministro do STF Carlos Ayres Britto usou um ditado nordestino para o caso. “É no tranco da carroça que as abóboras se ajeitam”, disse.