Marisa acompanhou Lula na reunião ministerial.

O presidente eleito, Luiz Lula da Silva (PT), disse ontem em seu discurso na primeira reunião com os futuros ministros, em Brasília, que assumirá a situação do País “tal como ela está”. E a situação, segundo ele, não é boa em nenhum aspecto. “Acho que a situação não é boa, a não ser na consolidação do quadro democrático”, afirmou.

Mesmo assim, Lula ressaltou que não há tempo para “chorar o leite derramado”. Disse também que não debaterá com o atual governo encerra aquilo que não foi feito, já que a equipe do governo Fernando Henrique Cardoso afirmaria que fez “o máximo”, e o PT, por sua vez, diria que o que foi feito foi “o mínimo”. “Nossa missão é provar que nós podemos mudar o nosso querido Brasil”, afirmou Lula. Ele admitiu que, talvez, não seja possível em quatro anos construir “a nossa grande obra.”

Lula começou seu discurso elogiando o trabalho de coordenação da equipe de transição feito pelo futuro ministro da Fazenda, Antônio Palocci. “Possivelmente outro qualquer, com base em tudo o que eu sei que está naquelas caixas vermelhas e brancas (contendo os relatórios sobre a situação do governo que termina), poderia ter produzido um documento muito mais agressivo politicamente ao atual governo”. O presidente eleito afirmou que, muitas vezes, “a briga, evidentemente verbal, não ajuda a ninguém e pode satisfazer apenas nossos desejos pessoais.”

O presidente eleito garantiu também que seu governo entrará para a história do País. “Vamos demarcar a história desse país: antes e depois desse governo, que começa dia 1,º de janeiro de 2003”, assegurou Lula.

Seleção

Lula terminou seu discurso reafirmando que há muito mais nomes disponíveis para compor o governo do que o necessário. Ele afirmou que nunca viu um momento da história em que o povo deposita tanta expectativa no governo. Para ele, “o povo não quer saber a que partidos pertencem os ministros. O povo quer saber que fazemos parte de uma equipe.” Segundo Lula, esta equipe sabe que é preciso garantir três refeições por dia aos brasileiros, assegurar atendimento de saúde à população e uma escola em que se saiba “qual qualidade de ensino as crianças estão tendo.”

Lula afirmou ainda que estará vigiando para que os ministros cumpram o seu papel e disse que, de tempos em tempos, serão realizadas reuniões para saber o que está sendo feito. O futuro presidente disse que sua eleição se deveu ao fato de a situação do País estar ruim. Ele afirmou que, ao ouvir isso de um popular, respondeu: “Por isso é que ganhamos (a eleição). Ganhamos para consertar esse País”. Após o discurso, Lula convidou os ministros e secretários para uma reunião.

Contra-ataque

O porta-voz da Presidência da República, Alexandre Parola, divulgou ontem nota do presidente Fernando Henrique Cardoso comentando os discursos de Lula e de alguns membros de sua equipe. De acordo com a nota, FHC acredita que “em alguns meses de trabalho efetivo, a retórica de palanque será substituída por postura mais séria, para fazer jus à confiança do eleitorado.”

Ministros devem apresentar metas

Brasília –

Na parte fechada da reunião, Lula pediu aos futuros ministros que providenciem, até o final de janeiro, a apresentação de um relatório completo sobre a situação encontrada em cada área e também as metas para 2003. A informação foi dada pelo porta-voz de Lula, André Singer.

Segundo Singer, o presidente eleito também alertou os ministros para a escolha de seus auxiliares e estabeleceu critérios, como ética e pluralidade. O porta-voz relatou que, em relação à ética, Lula disse que é preciso ter cuidado permanente na escolha de auxiliares, para que todos tenham “comportamento ético irretocável”. Lula, segundo Singer, pediu atenção para a necessidade de pluralidade na escolha de auxiliares, que deve ser feita sem discriminação de gêneros e incluindo portadores de deficiência física e minorias, para que a composição ministerial seja diversificada.

Singer afirmou ainda que, na reunião, o futuro ministro da Fazenda, Antônio Palocci, mencionou as restrições impostas ao Orçamento, mas garantiu que haverá recursos para os programas sociais prioritários. Lula, de acordo com o porta-voz, pediu trabalho em equipe, com a participação da sociedade, de modo que esta seja consultada em cada área de decisão.

Estatais

O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva avisou ontem que logo no início de janeiro pretende fazer uma viagem ao Nordeste. Ele quer também, até o começo do ano, anunciar os nomes dos titulares das empresas estatais. Lula frisou que vai se dedicar nos próximos dias a escolher nomes para Petrobras, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social e Correios. Já escolhido, mas não anunciado, o senador José Eduardo Dutra (PT-SE) tomará posse na presidência da Petrobras na tarde do dia 3 de janeiro, no lugar de Francisco Gros.

Sobre a ocupação dos cargos de segundo escalão, o futuro ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, afirmou que será tranqüila porque ninguém será substituído por pertencer a determinado partido político, mas por competência.

Correção do câmbio é prioridade de Palocci

Brasília

– O futuro ministro da Fazenda, Antônio Palocci, defendeu que a prioridade imediata do novo governo, a partir de 1.º de janeiro, seja a correção da taxa de câmbio, que ele chamou de “preço mais fundamental da economia.”

“Instabilidade prolongada do câmbio leva à pior das crises com consequências desastrosas sobre o conjunto dos preços, sobre as empresas e sobre os trabalhadores”, disse Palocci. Ele negou que a correção do dólar seja feita com adoção de medidas artificias. Segundo eles, os primeiros cinco anos do atual governo deixaram como ensinamento as consequências “funestas” de manter uma taxa de câmbio sobrevalorizada. “Não podemos nos dar o direito de cometer o erro inverso. A virtude está na busca incessante de uma taxa de câmbio de equilíbrio”, afirmou.

Segundo ele, com esse equilíbrio, o País poderá buscar o aumento da competitividade de seus produtos no mercado internacional e construir o equilíbrio das contas externas. Ele disse que o maior desafio do futuro governo será “zelar pela estabilidade monetária, com retomada do crescimento e redução da nossa secular desigualdade social”. Segundo ele, o quadro de distribuição de renda está “completamente inalterado há 30 anos”.

Planejamento

Palocci ressaltou a falta de planejamento e que este foi um dos temas que mais despertou a atenção do grupo de trabalho que ele encabeçou. “O Estado brasileiro vive um prolongado apagão.” Ele destacou ainda que a desarticulação “é fonte sistemática de desperdício de recursos e de geração de ineficiências.” Como exemplo dessa desarticulação, ele citou as áreas de energia, comunicação, ciência e tecnologia, integração nacional, meio ambiente e desenvolvimento.

Palocci declarou que as políticas sociais implementadas “foram adereços e apêndices do esforço de controlar a economia.” Segundo ele, os programas sociais foram improvisados nos últimos dois anos do governo FHC, ilustrando que a inclusão social nunca foi tema central da política de Estado. O pronunciamento de Palocci antecedeu o discurso de Lula, em tom mais brando, que reafirmou promessas com o social mescladas às suas tradicionais metáforas futebolísticas.

Renegociação de dívidas dos estados descartada

Brasília

– O futuro ministro da Fazenda, Antônio Palocci, reconheceu ontem que alguns estados estão em dificuldades de equilíbrio orçamentário. Mas, segundo ele, seria um erro pretender uma renegociação das dívidas “ignorando o delicado momento das finanças nacionais.”

Segundo Palocci, um descontrole fiscal dos estados seria “letal para todos os entes federativos, uma vez que desarrumaria em curto prazo o já difícil equilíbrio macroeconômico do País”. Ele reiterou que é preciso um esforço conjunto da União, estados e municípios quanto à questão fiscal.

Palocci afirmou ainda que na construção dos projetos de reforma previdenciária e tributária deverá ser estabelecida uma importante interlocução entre os entes da Federação. Ele afirmou que o Congresso Nacional será chamado a discutir e aprovar, no próximo governo, um conjunto de reformas que contribuirão para reequilibrar e impulsionar a economia nacional. Segundo Palocci, fazem parte desse rol de mudanças as reformas da Previdência Social, do sistema tributário nacional e das leis que regem a relação trabalhista.

Além disso, ele destacou a necessidade de regulamentação do artigo 192 da Constituição Federal que regulamenta o sistema financeiro e define o papel do Banco Central. “A pauta do próximo ano é de intenso trabalho. Serão desafios enormes a construção de programas e a estruturação das reformas”, afirmou Palocci durante discurso na primeira reunião ministerial do governo de Luiz Inácio Lula da Silva.

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