José Alencar, Luiz Inácio Lula da Silva, que soltou ontem um pacote de medidas, e José Dirceu, durante reunião. |
Brasília – O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou ontem, durante a segunda reunião ministerial desde sua posse, um corte de R$ 14 bilhões no Orçamento Geral da União para cumprir a meta de superávit primário de 4,25 por cento do PIB, estimado em R$ 68 bilhões pelo Tesouro Nacional.
O porta-voz do governo, André Singer, ressaltou que os programas sociais não serão afetados e que a amplitude do corte foi motivada em parte por erro de avaliação de R$ 8,9 bilhões da administração anterior, do presidente Fernando Henrique Cardoso. “A maior parte não é um corte”, disse Singer ao referir-se aos R$ 14 bilhões de redução no Orçamento. “O governo anterior subestimou em quase 9 bilhões as despesas com encargos e com gastos previdenciários.”
As medidas baixadas pelo governo têm como objetivo evitar que o governo federal gaste além de suas receitas. Singer esclareceu que a medida não implicará necessariamente cortes de gastos, mas ressaltou que é uma decisão preventiva, como forma de garantir mais tranqüilidade ao cenário econômico.
O porta-voz ressaltou que o Congresso não tem responsabilidade sobre essa questão, pois o erro “teve origem no governo anterior”. “O Congresso Nacional adequou o Orçamento à informação que recebeu do governo anterior”, acrescentou. Outros R$ 2 bilhões em cortes foram necessários considerando apenas a meta original de superávit, de 3,75 por cento do PIB. E, com o aumento da meta, anunciado na última semana, mais R$ 3 bilhões entraram no contingenciamento.
Singer garantiu que as medidas não afetarão os compromissos sociais adotados pelo governo, que não sofrerão nenhum tipo de corte. A garantia, segundo ele, é do ministro do Planejamento, Guido Mantega. Ainda segundo o porta-voz, durante a reunião ministerial realizada em ontem Mantega observou que as restrições orçamentárias poderão ser abrandadas ao longo do ano “à medida que as receitas permitam”.
Durante a reunião, realizada na Granja do Torno, em Brasília, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez uma avaliação otimista sobre os primeiros 40 dias de governo. Apesar disso, reforçou a preocupação com as dificuldades econômicas e lembrou que os ministros têm o compromisso de manter as políticas sociais, poupando-as de um possível corte no Orçamento. O ministro da Fazenda, Antônio Palocci, fez uma exposição na qual mostrou a gravidade da crise cambial de 2002, e as medidas na áreas monetária e fiscal que o governo Lula adotou para revitalizar a economia. Palocci defendeu, mais uma vez, a realização das reformas tributária e previdenciária, que considerou “o caminho para o Brasil superar suas dificuldades”.
Planalto teme guerra e radicais
Brasília – O trauma das declarações dos radicais do PT contrárias ao governo fez-se presente na reunião de quase nove horas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva com o ministério, realizada ontem na residência oficial do Torto. O presidente abriu a reunião pedindo unidade do ministério e sugeriu aos ministros que tiverem programas afins a promoção de encontros para aprofundar os laços. A recomendação de unidade também foi feita por Lula a 26 presidentes de diretórios estaduais para evitar que o catastrofismo dos radicais chegue às bases petistas e atinja a economia. A preocupação de Lula e do chefe da Casa Civil, José Dirceu, tinha ainda outra razão, além do que falam as alas radicais: a possibilidade de invasão do Iraque pelos Estados Unidos. Durante a fala do presidente e de ministros, como Dirceu e Antônio Palocci (Fazenda), houve um claro sinal de que o grande desafio do momento é impedir que a inflação cresça. Uma guerra no Golfo Pérsico seria um complicador para a meta de mantê-la sob controle.
Na reunião, a mais longa do governo de Lula, não houve o tradicional churrasco do almoço, preferido pelo presidente. Segundo a assessoria do governo, o prato foi arroz, feijão, picadinho de carne e salada. O encontro teve duas fases com os ministros Dirceu, Palocci e Guido Mantega e à tarde com Lula.
Ficou difícil defender o governo
Brasília – O corte de R$ 14 bilhões no Orçamento da União para cumprir a nova meta de superávit primário de 4,25% do Produto Interno Bruto (PIB), foi bem-recebido pelos tucanos no Congresso, mas nem tanto assim pelos petistas. Foi o líder do PT na Câmara, Nelson Pellegrino (BA), que advertiu ontem, após tomar conhecimento do resultado da reunião ministerial, que o governo terá muito trabalho para engajar a bancada na defesa no Congresso. “Faremos debates na bancada do PT porque qualquer meta de superávit, sem dúvida, envolve sacrifícios, e o governo precisa explicar isso muito bem”, disse Pellegrino. “Qualquer governo tem de dialogar com sua bancada de sustentação para que todos compreendam a situação e, sobretudo, tenham argumentos para defendê-lo.” Para o deputado Walter Pinheiro (BA), da ala radical, informações sobre o corte são fundamentais para que o PT possa fazer a defesa do governo. “É preciso que detalhem os números e nos convençam com fatos de que não há alternativa fora do remédio amargo que condenamos no governo passado”, cobrou.
Na mesma linha de Pellegrino, Pinheiro sugeriu que o governo pare de procurar inimigos no PT e amplie o diálogo. Ele lembrou que o ministro da Fazenda, Antônio Palocci, sugeriu que procurassem os números do governo antes de criticá-lo.
São as seguintes as principais medidas anunciadas ao término da reunião ministerial:
? Redução da alíquota do PIS paga pelas cooperativas de 1,65 por cento para 0,65 por cento. O objetivo é dar apoio material ao cooperativismo.
? Fim do veto à medida provisória que impedia a participação de empresas cadastradas pelo Simples de obterem crédito pelas cooperativas. O fim deste veto beneficiará cerca de 2 milhões micro e pequenas empresas cadastradas no Simples.
? O Ministério da Fazenda foi autorizado a estabelecer convênios com bancos públicos, de forma a facilitar a compra direta de títulos do Tesouro Nacional por pessoas físicas.
? Aumentar o limite individual de financiamento para o plantio do milho e do sorgo, até 15 de março, com o objetivo de beneficiar os agricultores durante o período da “safrinha” e proteger a produção nacional
? Criação de linha de crédito especial para comercialização da “safrinha”.
? Maior incentivo para os bancos privados aumentarem o crédito aos pequenos agricultores atendidos pelo Programa Nacional de Agricultura Familiar (Pronaf).
? Implantação de uma política de preço mínimo do leite, que beneficiará cerca de um milhão de produtores de leite que hoje têm dificuldades de vender o produto por um preço justo.
? Desapropriação de 203 mil hectares de terras improdutivas em 17 Estados para assentar mais de 5 mil famílias de trabalhadores sem-terra.
? Criação de áreas indígenas nos Estados do Rio Grande do Sul, Rondônia, Mato Grosso do Sul, Acre e Amazonas.
? Criação da Secretaria de Promoção de Igualdade Racial, em 21 de março, dia internacional do combate ao racismo. objetivo do novo órgão será promover ações afirmativas de combate ao racismo.
? Aumento em 10 por cento, pelo Ministério da Justiça, do contingente da Polícia Rodoviária Federal. A medida deve entrar em vigor o mais rápido possível e tem como objetivo principal, combater o crime organizado e aumentar a segurança nas estradas.
? O Ministério das Minas e Energia (MME) vai abrir licitação para a construção de 1.672 quilômetros de linhas de transmissão de energia elétrica. As empresas públicas federais de transmissão de energia como Eletronorte, Furnas, Chesf e Eletrosul poderão participar da licitação, o que não era permitido.
? Instalação, pelo Ministério das Comunicações, até o final de 2003, 4,2 mil terminais de computadores em 3,8 mil agências dos Correios espalhadas por quase 4 mil municípíos brasileiros. Nos terminais os cidadãos brasileiros terão acesso grátis à internet por até 10 minutos e poderão também ter uma conta de correio eletrônico.
? Política de combate à exploração sexual infantil no país, através do Ministério da Justiça. Uma grande ação está sendo preparada para o Carnaval (de 28 de fevereiro a 5 de março).
? Ampliação para 3,5 mil o número de vagas nas universidades de Minas Gerais, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul e a criação de 4 mil novas as bolsas de estudo no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
? Criação de um grupo de trabalho coordenado pelo Ministério da Integração Nacional, para dentro de 60 dias, apresentar uma proposta de recriação da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene).