Lei contra ‘golpe do baú’ no casamento cria polêmica

Com o objetivo de proteger o patrimônio das famílias de eventuais golpes do baú, o Código Civil Brasileiro torna obrigatório o regime de separação de bens no casamento após os 60 anos. Mas um projeto de lei aprovado há menos de um mês no Senado eleva essa idade para 70 anos. O texto, que ainda depende de sanção presidencial para entrar em vigor, divide opiniões de especialistas e também de idosos.

Autora do projeto, a deputada Solange Amaral (DEM-RJ) diz que sua principal motivação foi o aumento na expectativa de vida do brasileiro. “Ter 60 anos no início do século passado era uma coisa. Hoje, as pessoas se casam mais tarde e se tornou comum se casar mais de uma vez.”

Para o Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), a alteração ameniza, mas não resolve o problema. Continua a existir uma imposição discriminatória, que fere o direito do cidadão de dispor livremente de seu patrimônio. “Por que, ao atingirem 60 ou 70 anos, as pessoas precisam sofrer interdição automática em seus atos na vida civil?”, questiona Rodrigo da Cunha, presidente da entidade. “Se estiver incapaz, a família pode pedir a anulação do casamento. Mas esses casos são exceção e assim devem ser tratados.”

Cunha lembra que algumas das pessoas que tomam as decisões mais importantes do País, como diversos ministros do Supremo Tribunal Federal e até mesmo o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de 65 anos, e a presidente eleita, Dilma Rousseff, de 62, não poderiam hoje escolher o próprio regime de casamento.

A desembargadora Maria Berenice Dias, uma das maiores especialistas em Direito de Família do Brasil, também critica a intervenção estatal na vida particular dos cidadãos. “A lei é preconceituosa, pois parte do princípio que ninguém pode amar alguém com mais de 70 anos. Presume que deve haver um interesse econômico envolvido”, argumenta.

Essa visão, no entanto, está longe de ser consenso. “Quando você trabalha com direito de família, vê que golpes do baú acontecem. E não são raros”, diz o advogado Luiz Kignel. Ele afirma, no entanto, que a alteração na idade prevista no projeto vem em boa hora. “Meus clientes de 60 anos estão se casando, estão trabalhando, têm vida social. Não tem por que ser imposto a eles esse regime. Mas é preciso sim haver um limite.”

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