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Lama faz índios Krenaks depender de água mineral

Eles contam já terem fechado uma rodovia e também levado peixes mortos para uma reunião com representantes da mineradora Samarco. Mas ainda esperam a apresentação de um plano completo que garanta a retomada de suas atividades. Os índios da reserva Krenak na cidade de Resplendor, em Minas, dependem de ajuda emergencial que inclui caminhões-pipa para as fazendas e garrafinhas de água para consumo.

A reserva Krenak de Resplendor foi demarcada nos anos 1980. Fica às margens do Rio Doce, contaminado naquele ponto desde o dia 9 de novembro do ano passado, quando a lama vinda do rompimento da Barragem de Fundão, em Mariana, chegou ao local. “Foi como uma enchente, que elevou o rio. Mas foi com a água suja. Naquele dia, apareceu um monte de peixes mortos aqui. Ficou o cheiro de carniça”, conta Rondon Felix Viana, de 46 anos, um dos moradores da reserva.

Os índios dali vivem da venda de leite. Na reserva, as casas são separadas em pequenas roças, e eles levam uma vida idêntica àquela dos demais pequenos produtores rurais da região. O gado bebia a água diretamente do rio. “Agora, a gente fez a Samarco instalar uma cerca, para impedir que os animais cheguem até lá”, afirma o índio, que usa caminhões-pipa para saciar a sede dos bichos. Nas entradas das casas há garrafas e mais garrafas plásticas de água. “Por enquanto, é a única ajuda que temos: a água”, afirma Viana.

Rio.

Naquele ponto do Rio Doce, o leito de água é pontilhado por enormes pedras marrons, contra as quais a água bate com força. A cor delas lembra ferrugem. “Elas não eram assim. Ficaram depois que a lama passou”, continua o índio. Há lama seca nas rochas mais distantes da água e camadas de lama mole entre os pedregulhos mais perto do rio. “Sempre que a gente vem aqui, os cachorros ficam loucos. Acham que a gente está vindo caçar”, conta outro índio, Vanderlei Elias de Melo, de 32 anos. Na sequência, uma matilha de dez cães passa correndo pelo grupo e desaparece entre as pedras. “As crianças também adoravam as coisas que a gente fazia. Pescavam, caçavam, nadavam. Agora nem as capivaras (as presas mais comuns da caçada) aparecem mais”, afirma.

Os Krenaks criticam toda as ações da Samarco sobre o assunto. Reclamam da demora em apresentar um plano de limpeza e da ausência de representantes para dialogar com a tribo. “Pouco depois do acidente, a gente fez protestos”, conta. Pintados, bloquearam a rodovia estadual que liga Resplendor a Governador Valadares e fecharam a estrada de ferro da Vale que margeia o outro lado do rio. “Um tempo depois, eles chamaram a gente para uma reunião na cidade. Fomos, mas levamos os peixes que tinham morrido e jogamos na mesa. Teve cara da Samarco que ficou com nojo”, contam os dois Krenaks, simulando gestos de vômito. “A gente convive com isso todo dia.”

Rondon Viana guarda um comunicado, repassado a ele pelo Ministério Público Estadual, em que a Samarco afirma ter contratado uma empresa para diagnosticar os danos à comunidade indígena local. “Eles ainda vão ver se nós fomos afetados”, ironiza.

Viagem.

O índio Krenak Leonardo Felix Barbosa, de 24 anos, fez parte de um grupo de 12 colegas de aldeia que foi, de carro, até o subdistrito de Bento Rodrigues, em Mariana, local de onde vazava – e ainda vaza – a lama que contamina o rio, para executar um ritual tradicional de sua etnia no local. Não deu. “Eles não deixaram a gente entrar lá.”

Barbosa vive da criação de gado na reserva Krenak. E adorava o rio. “Agora, as crianças vêm perguntar se elas podem nadar e a gente tem de dizer que não”, conta, com olhar angustiado. “Nem a gente entra na água.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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