Lafer será irredutível na negociação da Alca

A apenas dois meses do final do mandato, o governo brasileiro decidiu manter-se irredutível em relação a três pontos-chave das negociações da Área de Livre Comércio das Américas (Alca) e deixar para a administração do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, a decisão sobre eventuais flexibilizações.

Essa posição, que deverá estender os atuais impasses entre o Mercosul e os Estados Unidos para o primeiro ano de governo de Lula, foi expressa ontem (29) pelo ministro das Relações Exteriores, Celso Lafer, a caminho de Quito, no Equador, onde participa na sexta-feira da 7.ª Reunião Ministerial da Alca. “Esta é a última reunião da Alca de que participo como representante do Brasil. Vou me manter irredutível. A decisão sobre possíveis flexibilidades ficará com o próximo governo”, afirmou Lafer.

A inflexibilidade dos negociadores brasileiros na reunião da Alca deverá se concentrar nos seguintes pontos: avanço das discussões sobre agricultura, com a inclusão dos subsídios domésticos e às exportações desse setor; negociação de regras claras para aplicação de medidas de defesa comercial, em especial o antidumping; adoção de uma cláusula da nação mais favorecida entre as regras básicas para as negociações das ofertas de liberalização de mercados, que serão apresentadas até 15 de fevereiro de 2003.

Essas três questões são consideradas pelo Itamaraty como essenciais para a conclusão de um acordo minimamente equilibrado. Entretanto, marcam a briga direta entre o Brasil com os seus sócios do Mercosul – e os EUA nas negociações da Alca.

A cláusula da nação mais favorecida acabaria com as pretensões dos negociadores americanos de apresentar ofertas de abertura de seu mercado – as propostas de redução gradual de tarifas e de barreiras não-tarifárias até o livre comércio diferenciadas a cada parceiro da Alca. Seus termos exigiriam que as ofertas fossem iguais para todos os sócios.

Segundo Lafer, os Estados Unidos “jogam pesado” pelo direito de negociar bilateralmente porque sabem que boa parte dos parceiros da Alca está interessada nessa via. Países como os do Caribe, da América Central e mesmo alguns andinos acreditam que podem se beneficiar de um acesso mais rápido e facilitado ao mercado americano, em detrimento do Mercosul, e estariam dispostos a concordar com acertos bilaterais. “A cláusula evitará que os produtos do Mercosul tenham um grau de acesso menor aos EUA durante o período de transição”, explicou.

Apoio

O embaixador Clodoaldo Hugueney, principal negociador do Brasil na Alca, disse que o Chile e o Canadá estão alinhados ao Mercosul na defesa da cláusula da nação mais favorecida. Hugueney lembrou ainda que o Mercosul conta com apoio chileno na defesa do uso restrito de medidas antidumping entre os parceiros da Alca durante o período de transição.

A maioria dos sócios também se mostra interessada em que a negociação agrícola acompanhe as demais. Porém, mesmo que o bloco sul-americano venha a acabar isolado nessas questões, não correrá o risco de engolir amanhã decisões contrárias às suas propostas irredutíveis. Todos os acertos são feitos com base no consenso entre os 34 parceiros.

Na manhã de hoje (30), Hugueney afirmou que as negociações se estenderiam pela madrugada, em um esforço para diminuir os tópicos que continuam entre parênteses – a forma como os negociadores anotam os pontos ainda em impasse – no esboço da declaração que será assinada sexta-feira pelos ministros dos países. No dia anterior, os negociadores haviam conseguido enxugar o texto principal, que ainda contava com 36 parágrafos.

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