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Justiça suspende revogação de normas de proteção a mangues e restingas

Foto: Daniel Castellano / Gazeta do Povo / Arquivo

A Justiça Federal do Rio de Janeiro suspendeu terça-feira (29) os efeitos da revogação das normas 302 e 303 do Conama (Conselho Nacional de Meio Ambiente). Sob presidência do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, o órgão havia decidido pelas revogações em reunião na segunda (28).

A juíza federal Maria Amelia Almeida Senos de Carvalho, 23ª Vara Federal Criminal, decidiu pela antecipação dos efeitos da tutela em vista do “evidente risco de danos irrecuperáveis ao meio ambiente”, segundo a sentença.

A decisão foi movida por ação popular, que apontou violações da Política Nacional do Meio Ambiente, do Código Florestal e da Constituição Federal, a qual prevê o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.

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A possibilidade de imbróglio jurídico, já materializado pela Justiça do Rio de Janeiro, havia sido apontada por entidades ambientais desde o momento seguinte à publicação da pauta da reunião do Conama.

Ainda no domingo, deputados petistas haviam pedido antecipadamente à 16ª Vara da Justiça Federal a suspensão das decisões da reunião da Conama, mas tiveram o pedido negado.

Segundo fontes ligadas ao governo, a votação pela revogação da resolução 303 pode ter sido acelerada por uma decisão recente do do Tribunal Regional Federal da 3ª região (TRF-3), que prejudicou interesse imobiliários no litoral paulista.

No último 25 de agosto, o TRF-3 obrigou a Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo) a considerar a resolução 303/2002 do Conama em suas ações de fiscalização ambiental no litoral do estado, em sentença que confirmou a vigência da norma.

A ação partiu do Ministério Público Estadual de São Paulo em conjunto com o Ministério Público Federal. A Cetesb havia deixado de aplicar a norma em seus procedimentos de licenciamento ambiental na costa paulista, a partir de um entendimento interno do órgão de que o Código Florestal, aprovado em 2012, teria superado a resolução, publicada uma década antes.

Embora o Código Florestal estabeleça a preservação dos ecossistemas de manguezal e restinga, a resolução do Conama trazia critérios específicos e mais rigorosos para a aplicação das leis, sendo a única norma que estabelecia a obrigação de se preservar uma faixa de 300m a partir da preamar.

A ação movida pelo MPF e pelo MP-SP contra a Cetesb estabeleze que a resolução do Conama é também mais rigorosa que a Lei da Mata Atlântica, que prevê a obrigação de preservar áreas conforme o grau de conservação da vegetação. Pela resolução 303, a obrigação de preservação dos primeiros 300m da costa independe do grau de degradação da área.

A restrição, que visa à proteção ambiental contra a erosão e o avanço das marés, levou à punição de empreendimentos imobiliários à beira-mar em processos na Justiça.

Como exemplo, o MPF cita o estudo de impacto ambiental do empreendimento pretendido pela empresa Brasterra Empreendimentos Imobiliários. A construção ocorreria em uma área de mais de 1 milhão de metros quadrados cobertos por vegetação de restinga e manguezal, “sendo um dos últimos e poucos remanescentes de restinga existente no município de Cubatão/SP”.

No estudo de impacto apresentado pela Brasterra, a empresa afirma que “a restinga secundária e degradada que coloniza trecho da propriedade não pode ser considerada como fixadora de dunas ou estabilizadora de manguezal”.

Outro exemplo de desrespeito e, ao mesmo tempo importância da agora extinta resolução 303, apontado pelo MPF é o projeto para construção de um condomínio residencial com 300 apartamentos e 15 blocos. Na mesma região, o documento aponta que foram ignoradas limitações ambientais e que, por isso, foi erguida outra edificação que resultou em dano permanente pela supressão de restinga.

Os procuradores afirmam INDA que na área próxima à pretendida de instalação do condomínio “rotineiramente há práticas lesivas aos ecossistemas locais, onde a vegetação é mantida na forma degradada, sendo realizadas queimadas periódicas e uso da área como estacionamento de veículo”, o que impede a regeneração da vegetação.

Na praia de Ubatumirim, em Ubatuba, também São Paulo, há situação similar. Em local em que se pretende montar empreendimento imobiliário, a vegetação de restinga teve parte suprimida e vem sendo queimada e roçada, o que impede sua recuperação.

Malu Ribeiro, da SOS Mata Atlântica, afirma que além da pressão sobre o litoral norte de São Paulo, deve-se ter atenção com o litoral sul, em geral, ainda mais preservado.

No estudo de São Paulo a situação, que acaba relacionada a empreendimentos “pé na areia”, ou seja, edificações na beira da praia, toma uma dimensão ainda mais crítica por o estado ser, entre as unidades federativas com mata atlântica, aquele com maior área de restinga arbórea, pouco mais de 229 mil hectares, segundo a ONG SOS Mata Atlântica.

Em seguida está o Paraná, com menos da metade da área paulista, cerca de 100 mil hectares.

Em 2016, o Superior Tribunal de Justiça condenou a construtora Hantei “a recuperar integralmente o dano ambiental da faixa de 300 metros desde a preamar máxima, com demolição de construções existentes na área a ser preservada”. A empresa, que também teve que pagar indenização por danos ambientais, havia construído um condomínio de luxo na praia do Santinho, em Florianópolis (SC).

A decisão unânime da segunda turma do STJ confirmou a legalidade da resolução 303 do Conama.

“O Código Florestal, no art. 3º, dá ao Poder Público (por meio de decreto ou resolução do Conama ou dos colegiados estaduais e municipais) a possibilidade de ampliar a proteção aos ecossistemas frágeis”, diz o relatório do ministro Herman Benjamin.

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