Depois de 25 anos atuando para explicar a ciência das mudanças climáticas e mostrar ao mundo que o aquecimento global é uma realidade e é causado por ações humanas, o IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) está em momento de reformulação.
O foco daqui para frente é aprofundar o conhecimento sobre impactos no nível regional, trabalhar com soluções, mostrar como é possível integrar mitigação (redução de emissões de gases de efeito estufa) com adaptação às mudanças do clima e melhorar a comunicação com o público sobre tudo isso.
Esses são alguns aspectos que devem ser discutidos nesta semana no Brasil em um workshop do IPCC que será realizado no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), em São José dos Campos. Com o tema Projeções Regionais do Clima e seus Usos em Estudos de Impactos e Riscos, o evento reunirá mais de uma centena de pesquisadores de 55 países e servirá como um aquecimento para as eleições a presidente e vice do Painel e copresidentes dos grupos de trabalho. A seleção ocorre entre 5 e 8 de outubro em reunião na Croácia.
O workshop foi organizado pelos grupos de trabalho 1 (que trata da base científica da mudança do clima) e 2 (que fala de impactos, adaptação e vulnerabilidade), hoje copresididos por dois dos candidatos à presidência – o físico suíço Thomas Stocker e o ecólogo norte-americano Christopher Field.
Stocker estará no Brasil juntamente com um terceiro candidato, o climatologista belga Jean-Pascal van Ypersele, hoje vice-presidente do IPCC. No Inpe, o evento é organizado pela matemática brasileira Thelma Krug, que concorre à vice-presidente do painel. Se eleita, será a primeira mulher no cargo.
Em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo, os quatro candidatos falaram da importância de a ciência compreender melhor os impactos da mudança do clima no nível regional a fim de oferecer subsídios para políticos tomarem decisões. O Inpe foi escolhido para sediar essa discussão justamente porque há anos desenvolve estudos sobre os riscos do aquecimento para o Brasil. Mas, em geral, considera-se que a análise local ainda não alcançou a maturidade.
“A capacidade dos modelos regionais em prover dados numéricos que permitam fazer previsões confiáveis sobre a evolução do clima para períodos anuais ou decadais ainda é limitada. A cada novo relatório do IPCC há melhorias nas simulações em escala regional que geram melhores previsões, particularmente da temperatura. Mas previsões de precipitação em nível regional são mais incertas devido à variabilidade interna da precipitação observada”, exemplifica Thelma.
Riscos
De acordo com Field, para começarem a agir, os governantes precisam entender melhor não só os impactos, mas os riscos regionais. “Esses riscos vêm do sistema climático físico, vêm das vulnerabilidades de cada local, das dinâmicas sociais, vêm da exposição e vêm de muitos elementos que contribuem para o caminho do desenvolvimento”, afirma.
Ele destaca a importância de haver melhores previsões para eventos climáticos extremos. “A atual seca no Brasil é um bom exemplo do modo como a crise climática pode se desdobrar e é um exemplo do tipo de problemas que precisamos conhecer melhor”, diz. “Revela a importância de pensar como a mudança climática desafia a gestão de risco”, complementa.
Para Stocker, a regionalização depende de haver também mais cientistas de todas as partes do mundo trabalhando na busca dessas informações. Hoje, a maioria dos membros do IPCC é proveniente do Hemisfério Norte. “Mas as pessoas mais vulneráveis e que serão mais impactadas pela mudança do clima estão na região dos trópicos e no hemisfério sul, principalmente na África e no sudeste da Ásia. Por isso, precisamos de uma representação de grupo de cientistas (nesses locais) que possam nos informar em primeira mão sobre suas lições aprendidas a respeito de impactos e riscos, que eles vivenciam e investigam.”
Ypersele lembra que esse conhecimento é fundamental porque os impactos são sempre locais. “Apesar de que eles podem ter consequências ainda maiores quando ocorrem em muitas regiões ao mesmo tempo, impactando, por exemplo, o preço dos alimentos. Por isso, fazer projeções regionais é muito importante para lidar com isso”, afirma o especialista.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.