O incêndio que deixou três mortos na uisqueria Quatro por Quatro, no centro do Rio, pode ter começado em um depósito de materiais descartáveis, indicam os depoimentos de testemunhas ouvidas pelo delegado José Luiz Duarte, da 1ª DP do Rio, responsável pela investigação do caso. Os bombeiros mortos durante o combate ao fogo estão sendo sepultados na tarde deste sábado (19) com honras militares. Um quarto agente ferido continua internado em estado gravíssimo.
A perícia iniciada pela Polícia Civil no local, na manhã deste sábado, teve que ser interrompida por questões de segurança. “Ainda existe um pequeno foco de fogo, a temperatura está muito alta e o ambiente tem muita fumaça ainda”, disse o delegado Duarte a jornalistas ao deixar a boate neste sábado. O trabalho dos peritos será retomado amanhã, às 9h. Por enquanto, as causas do incêndio e da morte dos três bombeiros continuam sem resposta.
“Pelo depoimento das testemunhas que ouvimos ontem (sexta-feira), o incêndio teria começado em um depósito de descartáveis, onde havia papéis e talheres de plástico – sem gás ou alguma outra coisa que poderia ter dado início às chamas”, explicou o delegado. Ele foi da perícia para o Instituto Médico Legal (IML), onde teria acesso à conclusão dos laudos com a causa da morte das vítimas.
De acordo com a corporação, as vítimas são o 2º sargento Geraldo Ribeiro e os cabos José Pereira e Klerton de Araújo. O vice-governador do Rio, Claudio Castro, e o comandante do Corpo de Bombeiros, coronel Roberto Robadey, estiveram nos velórios das vítimas, neste sábado, em cemitérios das zonas oeste e central do Rio.
O comandante voltou a dizer que os equipamentos usados pela equipe que atuou no incêndio eram novos e modernos, mas revelou que as vítimas tinham as vias aéreas queimadas, embora carregassem máscaras.
“Todos estavam com a máscara. Vamos apurar se estavam com a máscara colocada no rosto, pelo fato de estarem com as vias aéreas queimadas. Provavelmente eles estavam sem máscara em algum momento para chegar a esse ponto. Isso será objeto da apuração mais para frente”, disse Robadey.
Na sexta-feira, o comandante Robadey explicou que os bombeiros mortos e feridos inalaram muita fumaça. Os militares, segundo ele, teriam sido sufocados porque o imóvel, antigo, tinha muitas divisórias, o que dificultou a saída rápida.
Questionado se houve erro no procedimento de segurança, o vice-governador Cláudio Castro disse ser incomum que quatro ou cinco profissionais tenham errado o protocolo ao mesmo tempo. “Qualquer coisa (que se diga) antes de sair o resultado da sindicância, da autópsia, é suposição”, afirmou Castro.
Mais cedo o Corpo de Bombeiros confirmou que dos outros três integrantes da corporação que precisaram de socorro médico, dois continuam hospitalizados: o capitão Davi MontSerrat e o sargento Magalhães, que está em estado gravíssimo. Ambos estão no Hospital Central Aristarcho Pessoa, hospital da corporação. O capitão Thiago Agostinho Dias recebeu alta hoje pela manhã.
“O Magalhães nos preocupa ainda, mas está no nosso hospital, aos nossos cuidados”, disse Robadey.
O fogo começou por volta das 11h30 de sexta-feira, 18. O antigo casarão onde funcionava a Quatro por Quatro – que se apresentava como “spa para homens” e tinha muitas funcionárias mulheres -, estava vazio, e o fogo foi rapidamente controlado num primeiro momento. A Rua Buenos Aires, no trecho entre a Avenida Rio Branco e a Rua da Quitanda, foi interditada pelos bombeiros, e os prédios ao lado, evacuados. A fumaça tomou a Avenida Rio Branco, e ruas próximas.
O incêndio envolveu a região em fumaça, que chegou à Igreja da Candelária. O tráfego do VLT chegou a ser parcialmente interrompido.
Na manhã deste sábado a área continuava interditada pela Defesa Civil na altura da Quatro por Quatro, no número 44. Dois carros do Corpo de Bombeiros e uma ambulância permaneciam posicionados no local. Responsável por apurar as condições estruturais do imóvel, a Defesa Civil também montou uma tenda no local.
“Começou um pouco antes do meio-dia. Só via fumaça, o pessoal saindo correndo e depois os bombeiros chegando. Eles chegaram rápido. Mais tarde vimos alguns bombeiros saindo chorando, outros passando mal. Foi bem triste”, afirmou João Batista, que trabalha como porteiro em um prédio vizinho à boate há cinco anos.
O Corpo de Bombeiros abriu uma sindicância em paralelo à investigação da Polícia Civil para tentar esclarecer o caso. Cerca de 70 militares de 14 unidades participaram do combate às chamas e evacuação das vítimas, com apoio de 30 viaturas.
Extraoficialmente, em grupos de bombeiros em redes sociais, circulou a versão de que o fogo já estava controlado, na fase de rescaldo e, por isso, os soldados circulavam no prédio sem equipamento de proteção. Segundo essa versão, teria havido uma explosão por gás, o que o Corpo de Bombeiros não mencionou. Nas proximidades, não foi ouvido barulho de detonação ao longo do dia. Outra versão destacava que a queima de material de isolamento acústico teria gerado gases tóxicos.
Trabalhadores das empresas que funcionavam nas imediações permaneceram no local para acompanhar o trabalho dos agentes contras as chamas. Quatro caminhões e outros três veículos dos Bombeiros foram mobilizados para apagar o incêndio. Depois do incidente que resultou nas mortes, a fumaça negra aumentou, indicando que o fogo aumentara.
O Corpo de Bombeiros informou que a boate tinha alvará de funcionamento e estava com a documentação em dia.
O governador do Rio, Wilson Witzel (PSC), decretou luto de três dias no Estado. “Quero manifestar meu pesar. Foram heróis que perderam suas vidas cumprindo o seu dever. Ordenei rigorosa apuração de todos os fatos que ocorreram durante o combate ao incêndio e que resultaram nesta tragédia. Presto solidariedade às famílias das vítimas. Que Deus os receba e abençoe”, disse o governador em nota oficial.