Homem forte do Primeiro Comando da Capital (PCC) na Baixada Santista (SP), André de Oliveira Macedo, o André do Rap, de 42 anos, é suspeito de ostentar um patrimônio de R$ 17 milhões e se apresentava como agente de artistas e jogadores de futebol para disfarçar o dinheiro do tráfico de drogas. Ele foi preso pela Polícia Civil neste fim de semana, em uma mansão em Angra dos Reis, no Rio.

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André do Rap era procurado desde 2014, sob acusação do Ministério Público Federal (MPF) de ser responsável por escoar cocaína para diversos países, via Porto de Santos. Entre as suas atribuições, ele articularia negócios entre o PCC e criminosos estrangeiros – incluindo a ‘Ndrangheta, grupo mafioso da Calábria, no sul da Itália, que recepcionava a droga para redistribuir na Europa.

Uma vez livre, no entanto, o traficante levava uma vida de luxo e conforto: promovia festas, vivia em mansões e viajava de helicóptero para participar de reuniões de negócio.

“Essa ostentação – embora, é claro que ele estivesse curtindo – era necessária para conseguir conquistar os clientes e fazer o comércio internacional de drogas”, afirma o delegado Fábio Pinheiro Lopes, do Departamento de Operações Policiais Estratégicas (Dope), responsável pela prisão.

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Segundo a investigação, André do Rap morava em Santos, mas ia, aos fins de semana, para Angra dos Reis, na Costa Verde do Rio. Também fazia com frequência voos fretados para Jacarepaguá, na zona oeste carioca, onde tratava de outros negócios.

“Ele disse que era empresário de cantores de rap e que estava começando a empresariar jogador de futebol”, afirma Pinheiro Lopes. Para a polícia, a atividade seria “disfarce para lavar dinheiro do tráfico”.

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Luxo

Em Angra, André do Rap é suspeito de comprar uma casa por R$ 4 milhões e de alugar outra mansão, em área de condomínio fechado, por R$ 20 mil ao mês, de acordo com os cálculos da Polícia Civil. Foi no imóvel alugado que ele foi capturado pelos agentes.

Os investigadores conseguiram chegar até o traficante após monitorar a compra de uma lancha Azimut, de 60 pés, avaliada em R$ 6 milhões. A aquisição teria sido feita por um “laranja”.

“A lancha estava no nome de uma empresa de pequeno porte e o proprietário tinha passagem por formação de quadrilha”, diz o Pinheiro Lopes. “Esse proprietário só tinha uma moto CG, de R$ 2,5 mil: não era compatível”, explicou.

A embarcação estava sob cuidado de três marinheiros. O imóvel também contava com caseiro e uma série de empregados domésticos, segundo a polícia. Além de André do Rap, estavam na mansão sua ex-mulher, com quem tem uma filha, e três amigos – dois deles também eram procurados da Justiça e foram presos.

“Tinha muita cerveja no local, como se fosse uma festa”, diz o delegado. Lá, os agentes localizaram, ainda, dois helicópteros – um deles, alugado. Já o outro, com valor estimado de R$ 7 milhões, seria propriedade de André do Rap. A polícia afirma que vai pedir à Justiça o sequestro de todos os bens adquiridos por meio de atividade criminosa.

PCC

André do Rap tem três passagens por tráfico de drogas e ficou, ao todo, sete anos e meio no sistema prisional. Para sua captura, houve colaboração de agências internacionais de inteligência.

A consolidação do Porto de Santos, o maior do Brasil, no tráfico internacional de cocaína tem relação com Rogério Jeremias de Simone, o Gegê do Mangue, um dos líderes históricos do PCC. Ele e Fabiano Alves de Souza, o Paca, foram executados em fevereiro de 2018 após um racha na facção.

Segundo investigadores e especialistas em PCC, desde então o controle da Baixada Santista passou a ser feito por células da facção – e não mais centralizado em uma figura.

Um dos grupos, por exemplo, tinha como liderança Wagner Ferreira da Silva, o Waguininho ou Cabelo Duro, que também foi assassinado a tiros de fuzil em fevereiro do ano passado. O ataque era uma possível retaliação às mortes de Gegê do Mangue e de Paca.

Em meio à briga do PCC, o setor de inteligência da polícia chegou a receber informação de que André do Rap também havia sido executado. “Ele chegou a ficar foragido porque seria morto pela própria facção, assim como foi Cabelo Duro”, diz o promotor do Ministério Público Estadual de São Paulo Lincoln Gakiya, que investiga o PCC desde 2005. “Só apareceu depois de ter sido perdoado.”

Hoje, contudo, a polícia sabe que André do Rap foi morar em Portugal e na Holanda, onde pode ter estreitado relações com traficantes internacionais. Ele é suspeito de ter comunicação direta com membros da ‘Ndrangheta, grupo mafioso italiano.

Em operação realizada em julho passado, a Polícia Federal prendeu, em Praia Grande (SP), o homem apontado como correspondente do grupo mafioso na América Latina: Nicola Assisi, o “Fantasma da Calábria”. O filho dele, Patrick Assisi, foi pego na mesma ação.

Segundo Gakyia, as alianças acontecem porque o PCC não tem “expertise para distribuir, por si só, a droga na Europa”. Além dos italianos, a facção já fez negócio com integrantes de máfia da Nigéria e da antiga Iugoslávia, diz o promotor.

Autor de livro sobre o PCC, o procurador de Justiça Marcio Sérgio Christino afirma que André do Rap atuaria como gerente no Brasil de Gilberto Aparecido dos Santos, o Fuminho, apontado como maior responsável por fazer a cocaína produzida na Bolívia e no Paraguai chegar ao Brasil. “O objetivo dessa rota é conseguir, depois, exportar para Europa, África e Oriente Médio”, diz.

Embora atue como uma espécie de “autônomo”, Fuminho tem relação próxima com o líder máximo do PCC, Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola. Foragido da Justiça, ele chegou a ser apontado como o mandante dos crimes contra Gegê e Paca e foi jurado de morte pela facção. Hoje, também já teria sido perdoado, segundo investigadores.

Professora da Universidade Federal do ABC (UFABC) e uma das principais especialistas em estudos sobre crime organizado no Brasil, a socióloga Camila Nunes Dias diz que o impacto da prisão de André do Rap para a organização do PCC deve ser “pontual”. “Embora algumas pessoas tenham posição importante, os esquemas da facção para o tráfico envolvem muita gente”, afirma.

“A gente pode entender o PCC como uma rede, cuja capacidade de reposição é muito rápida”, diz Camila. “O grupo tem como base de recrutamento o próprio sistema carcerário, então a prisão de pessoas específicas é parte de um ciclo que alimenta a própria rede.”