O governo federal vai suspender por cinco anos a criação de cursos de Medicina no País. A medida foi sugerida pelo ministro da Educação, Mendonça Filho, ao presidente Michel Temer e deverá ser formalizada em dezembro, com a publicação de um decreto. A estratégia é adotada após forte pressão de entidades de classe, contrárias ao expressivo aumento das vagas em graduações da área nos últimos anos, sobretudo depois da Lei do Mais Médicos.
A medida foi revelada na sexta-feira (17) pelo jornal Folha de S. Paulo. Nos últimos meses, houve ao menos quatro encontros entre o Ministério da Educação (MEC) e associações de classe para debater o assunto. “A expansão de vagas de forma desordenada pode colocar em risco a qualidade de ensino”, disse Mendonça Filho. “Para aumento de escolas, é preciso haver a infraestrutura necessária e um corpo docente com formação adequada.”
A suspensão sugerida, no entanto, deverá preservar dois editais que estão em andamento. A estimativa é de que pelo menos 35 escolas deverão ser formadas. De um total de 2.305 vagas previstas em todo o País, 710 em 11 cursos foram liberadas para início das atividades em agosto, em 11 cidades de Paraná, Rio Grande do Sul, Rio e São Paulo.
Essa abertura se arrastava desde 2014, após uma série de ações judiciais e representação do Tribunal de Contas da União (TCU) – que suspendeu edital em 2015, sob alegação de irregularidade na seleção. À época, o ministério defendeu os novos cursos, dizendo que havia demanda para criar vagas em cidades do interior e em mais regiões do Brasil, incluindo Norte, Nordeste e Centro-Oeste.
Ainda crítico. “O ideal era que também esses editais fossem suspensos”, defende o vice-presidente da Associação Médica Brasileira (AMB), Diogo Leite Sampaio. Hoje há no País 298 escolas de Medicina. “Um crescimento muito significativo. Em 2010, eram 152”, observa.
Para Sampaio, a expansão não seguiu uma série de critérios. “Nem todas as escolas contam com hospitais. Alunos têm de ter aulas práticas em unidades de saúde conveniadas, muitas vezes sem assistência de um professor. Contam só com o profissional de saúde que trabalha na unidade”, completa. “Muitas foram abertas indiscriminadamente para atender mais a benefícios políticos e econômicos locais do que à assistência médica.”
Presidente em exercício do Conselho Federal de Medicina (CFM), Mauro Ribeiro comemora a suspensão, mas também diz que a medida não é suficiente. ” É preciso também limitar a expansão de vagas em escolas já existentes.”Como exemplo, ele cita uma escola de Maringá, no Paraná. Uma medida recente do governo autorizou que as vagas da faculdade, em torno de 160, fossem ampliadas para 290. Ele também critica a estratégia de se manter os editais já lançados. “É impossível se garantir a qualidade quando se tem escolas a granel. Onde se formam esses professores?”
O Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp) ainda expõe dúvidas sobre a eficácia da abertura de cursos no interior dos Estados, sob a justificativa de que ela corrigiria o déficit de médicos em algumas regiões. “Medicina é uma profissão em que é preciso enraizar o profissional. Para isso, os atrativos são condições de trabalho, plano de carreira. Não é a escola que fixa o médico”, afirmou o presidente, Lavínio Camarim.
O ministro adiantou que quer realizar, durante a moratória, uma avaliação sobre o ensino de Medicina no País. O MEC deve convidar para esse estudo representantes de entidades de classe. Não é a primeira vez que o MEC adota medidas do tipo. Entre 2003 e 2004, também suspendeu novos cursos de Medicina, após pressão das entidades.
Avaliação. Outra reivindicação das entidades é uma avaliação contínua dos alunos de Medicina para que as falhas possam ser corrigidas antes que os alunos se formem. No entanto, criticam o formato e o método utilizado na Avaliação Nacional Seriada dos Estudantes de Medicina (Anasem), criada pelo MEC em 2016 e estabelecida como obrigatória para a obtenção do diploma de Medicina a partir de 2020. As provas serão aplicadas em caráter pedagógico a alunos de 2.º, 4.º e 6.º ano.
Na 1.ª edição, 91,2% dos alunos tiveram desempenho considerado adequado. “Resultado muito estranho, que mostra que a prova não serve como critério para avaliar a qualidade dos cursos. O exame do Cremesp, de 2016, reprovou 56,4% dos recém-formados, índice que segue tendência histórica”, diz Lavínio Camarim. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.