Brasília – Fechadas as contas do Orçamento de 2004, os números mostram que o controle de gastos só valeu mesmo para os investimentos. Embalado por uma arrecadação recorde, que elevou a receita líquida em R$ 13 bilhões em relação à previsão inicial, o governo aumentou as despesas de pessoal em R$ 12,2 bilhões no ano passado, em relação a 2003, e não reduziu os gastos de custeio, como pretendia.
Dos R$ 6 bilhões em custeio e investimento cortados do Orçamento em fevereiro de 2004, R$ 4 bilhões foram liberados ao longo do ano, sendo que R$ 2,4 bilhões para pagar despesas de custeio com a máquina administrativa.
Segundo levantamento feito no Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi), o governo manteve os gastos com investimentos controlados, mas não conseguiu o mesmo com as despesas de custeio. Aumentos significativos foram registrados no chamado custeio da máquina administrativa. Em 2004, os gastos com diárias pagas a funcionários civis e militares chegaram a R$ 484 milhões, um aumento de 29,7% em relação aos gastos de 2003, que foram de R$ 373 milhões.
Em passagens e despesas com locomoção, o governo gastou R$ 581,9 milhões no ano passado, 25% a mais do que em 2003. Com material de consumo, o gasto chegou a R$ 4 bilhões, 26,8% maior do que o registrado no ano anterior, que fora de R$ 3,154 bilhões.
"O crescimento dos gastos de custeio não é compatível com uma época de ajuste fiscal. Ao contrário, se tivéssemos economizado em 2004, a percepção do risco-país seria muito melhor. Mas a hora da verdade está chegando, pois não existe mais solução possível com o aumento da receita, nem com o arrocho nos investimentos, que já estão no fundo do poço", afirmou o economista Raul Velloso, especialista em contas públicas.
Algumas das despesas de custeio consideradas obrigatórias, como os gastos com a saúde, por exemplo, aumentaram R$ 787 milhões em relação à previsão inicial do governo. Também as despesas com os benefícios da Previdência cresceram R$ 4,6 bilhões. Pelos últimos dados disponíveis do Orçamento de 2004, a receita líquida fechou o ano em R$ 357,1 bilhões. O Congresso previra R$ 349,1 bilhões na Lei Orçamentária e a equipe econômica, ainda mais conservadora, estimara R$ 344 bilhões.
Quando anunciou os cortes, o governo usou como justificativa a incerteza em relação às receitas do Orçamento estimadas pelo Congresso. No fim do ano, ficou comprovado que o próprio Congresso fora conservador em sua previsão. A receita líquida ficou R$ 8 bilhões acima do previsto.
A arrecadação extra até permitiu um reforço nos investimentos. Dos R$ 3 bilhões bloqueados inicialmente, foram liberados R$ 1,6 bilhão. A fatia maior de recursos extraordinários foi destinada ao reajuste do funcionalismo, à reestruturação das carreiras, à contratação de servidores por concurso e às despesas de custeio.
"O governo Lula tem uma postura claramente favorável à recuperação dos salários dos servidores públicos e à ampliação da máquina administrativa", observa Velloso.
Boa vontade com militares custa caro
Brasília – A boa vontade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva com os militares fica evidente quando são analisados os gastos de custeio do Orçamento de 2004. Além de destinar R$ 700 milhões para o reajuste dos soldos e reforçar o orçamento de investimento do Ministério da Defesa – responsável pela compra do novo avião presidencial – o governo liberou R$ 3,524 bilhões para as despesas de custeio dos militares. O orçamento inicial de R$ 3,150 bilhões foi ampliado com mais R$ 374 milhões ao longo do ano, na medida em que se confirmava o aumento da arrecadação.
Só com material de consumo, o Ministério da Defesa gastou R$ 1,5 bilhão em 2004. As despesas comprometidas com a compra desse material chegaram a R$ 1,7 bilhão. No ano passado, as despesas com diárias dos militares chegaram a R$ 82,8 milhões e outros R$ 51,3 milhões foram gastos com passagens e despesas de locomoção. Nesse caso, o ministério se comprometeu com despesas acima dos limites do Orçamento. Empenhou despesas no valor de R$ 61,3 milhões, quando o limite do orçamento era R$ 59,2 milhões.
Com a contratação de serviços terceirizados de pessoas jurídicas, o Ministério da Defesa gastou R$ 1,2 bilhão em 2004 e se comprometeu com despesas no valor de R$ 1,5 bilhão para esse fim, também acima do limite orçamentário, que era de R$ 1,4 bilhão. Em outras despesas, o ministério também estourou o limite orçamentário, segundo os dados do Siafi.