Quando a psicóloga Katyanne Shirata, 30, assistia aos stories do Instagram, um anúncio chamou sua atenção. Era de um médico, que ela já conhecia, e anunciava a venda de imóveis e eletrodomésticos para um amigo que estava de mudança.

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Como ela se mudou há pouco, interessou-se pelos itens para montar a casa, na zona sul de São Paulo. Mediu cômodos da residência e decidiu comprar uma televisão de 55 polegadas, uma máquina de lavar e secar, um sofá e um fogão. O total ficou em R$ 3.500, e o pagamento foi realizado via Pix.

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Com o dinheiro em mãos, o usuário afirmou que os itens seriam encaminhados para a transportadora no dia seguinte. Logo depois, ao entrar em contato com o médico, via WhatsApp, descobriu que havia sido vítima de um golpe.

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A fraude em que Katyanne caiu, no início deste mês, tem sido recorrente e ocorre, principalmente, no Instagram.

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Relatos de vítimas e boletins de ocorrência aos quais a Folha teve acesso apontam que criminosos recorrem a uma tática semelhante. Eles atraem os seguidores com stories em que relatam que um amigo ou parente está vendendo móveis, eletrônicos e eletrodomésticos porque está de mudança ou dizem que um conhecido está passando por um problema de saúde e precisa de ajuda.

Os itens que supostamente estão à venda sempre são muito mais em conta do que os de sites oficiais. A televisão que Katyanne achou que tivesse comprado, por exemplo, custa ao menos R$ 5.000 em sites oficiais e, pelo post, estava por R$ 950. Ela fez um boletim de ocorrência e entrou em contato com o banco. Porém, só conseguiu um estorno de R$ 0,75.

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A quase 900 quilômetros de distância de Katyanne, em Vitória (ES), a estudante de veterinária Pâmela Ribeiro, 26, foi vítima do mesmo tipo de golpe. O caso foi em fevereiro deste ano. Ribeiro acompanhava uma nutricionista com cerca de 20 mil seguidores no Instagram.

“Ela disse que estava vendendo para uma tia, e eu não desconfiei”, diz a estudante, que escolheu uma máquina de lavar, uma TV e um ar-condicionado. No fim, perdeu pouco mais de R$ 3.000. A jovem registrou um boletim de ocorrência e não conseguiu recuperar o dinheiro.

Carlos Henrique Ruiz, titular da Delegacia de Investigações Sobre Fraudes Patrimoniais Praticadas por Meio Eletrônico de São Paulo, afirma que a nova modalidade de golpe tem sido cada vez mais recorrente, porém ainda é cedo para falar em números. Quem teve a conta hackeada ou transferiu dinheiro para o usuário deve fazer um boletim de ocorrência.

Ruiz diz que o acesso via Instagram se dá sobretudo por meio da fraude chamada SIM Swap, em que o golpista consegue clonar o número do celular da vítima, transferir para outro chip e, assim, recuperar senhas por meio de SMS dos aplicativos instalados.

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Os alvos costumam ser perfis que têm muitos seguidores e deixam o número do celular aparente, como dentistas, médicos e cabeleireiros. “Isso acontece, muitas vezes, por meio de uma empresa terceirizada e o que acontece é que o verdadeiro dono fica sem a linha”, explica o delegado.

Em seguida, o invasor obtém todas as senhas por SMS, em redes sociais e sites que para fazer o login contam com a opção esqueci a senha. “Ele começa a recuperar a senha de email, WhatsApp, Instagram. Se a pessoa não tiver o chamado ‘fator de dupla verificação’, o criminoso recupera a senha e consegue entrar.”

Outra armadilha é um link em que a pessoa automaticamente é hackeada ou compartilha códigos de SMS para algum colega por mensagem –neste último caso, o criminoso pede que um seguidor lhe transfira um código SMS com a desculpa de que não está conseguindo recebê-lo no seu próprio aparelho.

Foi o que aconteceu com a profissional de relações públicas Amanda Cássia, 26, cuja conta foi invadida e logo começaram a pipocar stories em seu perfil com ofertas falsas. “Uma amiga caiu achando que era eu e transferiu R$ 900. O golpista leu meu histórico de conversas com ela e escrevia como se fosse eu”, diz a jovem. Amanda teve a conta desativada e precisou criar um novo perfil no Instagram.

Recuperar o dinheiro ou congelar as contas hackeadas é muito difícil, uma vez que o pagamento é feito via Pix e os criminosos realizam o saque da quantia quase que automaticamente após aplicado o golpe.

Por isso, o delegado Carlos Henrique Ruiz recomenda que usuários se atentem às ferramentas de segurança da plataforma para evitar o golpe, como a instalação em duas etapas, com programa autenticador independente –desta forma, é recomendado baixar um aplicativo que realiza a autenticação caso o usuário entre na conta em outros aparelhos. Ele sugere ainda desvincular o número do celular do Instagram.

A Febraban (Federação Brasileira de Bancos) afirma que os bancos buscam recuperar nas contas de destino os recursos transferidos sempre que acionados pelos clientes. “Caso comprovado o golpe e os recursos ainda não tenham sido sacados, devolvem os valores envolvidos para a conta de origem”, informa a instituição.

O Instagram diz que a autenticação de dois fatores e solicitações de login, quando acionados, são capazes de barrar a invasão de contas. O aplicativo recomenda que usuários desconfiem de conteúdos que ofereçam produtos “com valor abaixo do preço de mercado e denunciem publicações e contas que consideram suspeitas”.

A rede acrescenta que usuários não devem compartilhar links ou códigos de acesso recebidos do Instagram por SMS ou WhatsApp. Ao ser perguntada se pretende desenvolver alguma nova ferramenta para evitar o golpe das ofertas falsas, a empresa diz que “manter nossa comunidade segura é uma das nossas prioridades e uma área em que buscamos melhorar constantemente.”

Apesar de raros, existem casos em que a vítima consegue ser ressarcida.

A advogada Isabelle Ströbel afirma que um cliente seu achava que havia comprado um tênis importado de R$ 2.000 em um perfil comercial que havia sido hackeado. Depois de negociar com o perfil, ele ganhou um vale-compras no valor do golpe.

Ströbel diz que é importante que, após recuperar a conta, o usuário que teve o perfil hackeado poste o ocorrido e especifique o período de tempo em que ficou invadido.

Usuários que têm a rede social invadida se sentem, de certa forma, culpados ao descobrir que amigos e parentes acreditaram nas falsas ofertas. Foi o caso da estudante de nutrição Danielle Lima, 39, que não tinha muitos seguidores e nem usava tanto a rede social.

Quando teve a conta hackeada, no último dia 14, ela não se preocupou muito, pois pensou que o máximo que aconteceria seria perder a conta. Porém, descobriu que ao menos três seguidores transferiram dinheiro para o invasor, que embolsou R$ 4.000.

“Fiquei sem saber o que falar e o que fazer, me senti culpada, mas sei que não sou”, diz. “Nunca achei que uma rede social pudesse trazer tanta coisa para mim.”

Ao receber os prints de colegas que caíram no golpe, ela notou que o golpista descobriu, lendo as conversas, informações sobre sua vida, como a profissão do marido dela e onde ela vive. “Eles usam a maneira como você fala e informações pessoais, por isso as pessoas acreditam.”

Ela passou a olhar a rede social com mais temor após a invasão. “Fiquei com medo pela facilidade de invadirem minha conta, como estamos vulneráveis e como tem informação nossa nas redes sociais.”

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