O comércio de genéricos levou o Brasil a iniciar na Organização Mundial do Comércio (OMC) uma disputa contra a União Europeia (UE) e a Holanda. É uma reação às apreensões de medicamentos em trânsito no território europeu sob a justificativa de que eles ferem direitos de propriedade intelectual. Na prática, a ação policial da UE representa uma ameaça ao acesso a remédios que estão livres de patente.
A decisão brasileira – “pedido de consultas” – foi tomada após um ano de negociações fracassadas e pode representar o primeiro passo para abertura de um painel na OMC. A discussão teve início em dezembro de 2008, com a apreensão no porto de Roterdã, na Holanda, de uma carga de Losartan, indicado para hipertensão, que estava a caminho do Brasil. Vendido pelo fabricante indiano Dr. Reddy’s à empresa nacional EMS, o Losartan é livre de patente no Brasil e na Índia.
Autoridades holandesas alegavam que o remédio era protegido por patente no seu território, argumento suficiente para apreender a carga, segundo regulamento da UE datado de 2003. O Brasil não foi o único a ter remédios em trânsito apreendidos. Até o antirretroviral abacavir, comprado pela Unitaid, agência humanitária internacional, para ser encaminhado para a Nigéria, foi retido. Pelas contas do Grupo de Trabalho Sobre Propriedade Intelectual (Rebrip), foram apreendidos pelo menos 15 carregamentos de genéricos destinados a países da América Latina entre 2008 e 2009, com base no regulamento europeu. Para evitar apreensões, a EMS mudou a rota dos remédios comprados no exterior.
A ação brasileira não se resumirá à OMC. O Brasil se prepara para ingressar na próxima semana em nova frente de defesa do comércio de genéricos, desta vez na Organização Mundial da Saúde. Um dos temas discutidos durante a Assembleia Mundial de Saúde será medicamentos contrafeitos, termo usado para remédios que desrespeitam direito de marca, mas que nos últimos anos começou a ser usado também para designar falsificados ou piratas. Algo que permitiu a apreensão do Losartan.
Em uma das ações contra a ofensiva de países ricos e das grandes farmacêuticas, a Rebrip ingressa hoje no Tribunal dos Povos, acusando a UE de violar os direitos humanos à saúde e à vida das populações de países atingidos pelas apreensões de medicamentos nos portos europeus.