Porto Alegre
– O presidente Fernando Henrique Cardoso considera a reforma previdenciária e a manutenção do equilíbrio financeiro das contas do governo os maiores desafios do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva. FHC não sabe como o PT poderia tomar a iniciativa de fazer uma mudança que combateu, mas disse que, se Lula tentar, terá seu apoio.As declarações do presidente Fernando Henrique foram publicadas ontem pelo jornal “Zero Hora”, na qual ele faz um balanço de seus oito anos de governo. Segundo ele, a reforma previdenciária é mais importante que a tributária, mas as duas, dificilmente, andarão porque enfrentam interesses contraditórios. Ele lamentou não ter conseguido levar à previdência dos servidores públicos os mesmos ajustes que promoveu para os trabalhadores da iniciativa privada. “Não conseguimos convencer o País nem o Congresso de que é preciso fazer alguma coisa”, reconheceu, lembrando que 25% do Orçamento da União são destinados a 3 milhões de funcionários públicos e aposentados.
Outras propostas que esbarraram na resistência do Congresso, foram a unificação das polícias e a proscrição das armas de fogo. Ainda referindo-se à questão da segurança pública, o presidente lembrou que tentou criar um ministério para a área. Para o presidente eleito, FHC voltou a deixar a dica de não se submeter ao fundamentalismo de mercado e evitar o populismo. O presidente disse que a herança que deixa para o futuro governo é a da estabilidade. “O povo brasileiro esqueceu o que é a inflação”, afirmou, comparando o momento atual, quando um índice de 1% ao mês assusta economistas, com o tempo em que era ministro da Fazenda, em que a taxa chegava a 30% ao mês.
Na entrevista, FHC também citando como a maior injustiça que teve o dossiê Cayman, uma coleção de documentos forjados que pretendia denunciar a existência de contas secretas no exterior em nome dele e de outros tucanos. O presidente acusou o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) de ter invadido a Fazenda Córrego da Ponte, da família dele, “para fazer uma afronta à figura do presidente”. Para FHC, aquele foi o momento que desmascarou os fins não-agrários do MST. O presidente destacou que o governo assentou mais do que o dobro das 250 mil famílias dos governos anteriores.
Sobre o futuro, o tucano adiantou que não tem a aspiração de voltar ao cargo. Pretende criar uma fundação e dedicar-se à análise das questões internacionais e de políticas públicas com a autoridade de quem é ex e não um político em atuação. É nesta condição que espera ver mais valorizada a instituição do ex-presidente. FHC diz que a sucessão de Lula pode ficar, entre os tucanos, com o governador eleito de Minas Gerais, Aécio Neves, de São Paulo, Geraldo Alckmin, e o senador José Serra (SP).
Câmara homenageia o presidente
Brasília
– O presidente Fernando Henrique Cardoso afirmou ontem, no Congresso Nacional, que o seu empenho em uma transição democrática para o governo do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva tem o objetivo de que “o Brasil não sofra descontinuidade naquilo que os vencedores acharem que deva continuar”. O presidente disse que, se os membros do próximo governo decidirem não continuar o que já existe, “que saibam o que estão descontinuando, mas no espírito de construção, não no espírito de destruição”. FHC foi homenageado com a Ordem do Mérito Legislativo, em solenidade no Salão Negro do Congresso Nacional, uma iniciativa do presidente da Câmara dos Deputados, Aécio Neves. “A essa altura da vida, não só de idade, mas também de percurso, me sinto comovido”, disse.O presidente lembrou do movimento pelas eleições “Diretas Já” e seu convívio com movimentos de esquerda, “inclusive em São Bernardo”, referindo-se ao município paulista onde o presidente eleito começou sua trajetória política. O presidente considerou a solenidade de ontem “a festa da democracia” e foi aplaudido quando afirmou que não poderia deixar de lembrar dos nomes de Ulysses Guimarães e Tancredo Neves.