A família sabia e se omitiu. É a conclusão a que chegou Adriana Accorsi, delegada-titular de Proteção à Criança e Adolescente (DPCA) de Goiânia (GO), que cuida do caso da empresária Sílvia Calabresi Lima, acusada de torturar, em sua própria casa, meninas que "adotava".
Em entrevista à Agência Estado, a delegada Adriana afirmou que pretende encerrar o inquérito policial na quarta-feira, com o indiciamento de pelo menos quatro pessoas. O caso veio à tona no dia 17, quando a polícia libertou a menina L , de 12 anos, mantida acorrentada no apartamento dúplex em que morava a empresária, seu marido e os filhos – dois deles maiores de idade. A garota exibia marcas recentes e antigas de tortura.
"É curioso como temos tantas famílias estranhas em nosso meio social", disse Adriana. "Agora dizem que ela (Sílvia) é louca. Se fosse louca, também maltrataria os três filhos e isso não aconteceu." Adriana acredita na tese de omissão em caso de tortura, crime punido com quatro anos de prisão, pelo volume de provas que colheu: depoimentos do marido, de vizinhos e de outras quatro vítimas da empresária, além do que revelam laudos periciais (de corpo de delito e de objetos empregados na tortura).
O advogado da empresária, Darlan Alves Ferreira, disse que pedirá laudo psicológico da empresária de 42 anos, na tentativa de provar que ela não agia em plena consciência.
A delegada revelou que os maus-tratos não eram segredo, mas viraram assunto proibido dentro da família. "O pai, o engenheiro Marco Antonio, sabia, pelo menos, do trabalho doméstico (escravo) de todas as meninas menores de idade", revelou a delegada. "Tanto sabia que foi ele quem nos revelou a história da menina A., de 10 anos, natural de Adelândia, que viveu na casa deles há seis anos."
Nesta segunda (24), a delegada receberá o resultado do exame de corpo delito feito em L., pelo Instituto de Medicina Legal (IML), e o laudo psicológico, levantado por uma equipe da DPCA. Também ouvirá Tiago, o filho mais velho da empresária, e a mãe adotiva dela, Maria de Lourdes, de 82 anos. "Sílvia e seu marido não irão mais depor, pois decidiram que só falarão em juízo", disse o advogado do casal.
Ainda na segunda-feira, a Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam), de Goiânia, irá se pronunciar sobre uma queixa que teria recebido da empresária dois dias antes de o cativeiro de L. ter sido estourado. Ela registrou um boletim de ocorrência contra um ex-amante, empresário do ramo imobiliário. Ela o acusa de injúria e ameaça.
Na terça-feira, parlamentares da Comissão de Direitos Humano e Minorias (CDHM), da Câmara dos Deputados, visitarão a DPCA, para acompanhar o processo, que será encerrado na quarta-feira e enviado à Justiça de Goiás.
Na quarta-feira, também, a procuradora do Trabalho Janilda Collo decidirá se irá ou não enviar à Justiça ação reclamatória trabalhista contra a empresária, em nome das cinco crianças que trabalharam em sua casa. Há, ainda, uma ação indenizatória por danos morais e materiais em nome de L. e ação civil pública contra o casal por trabalho escravo infantil.