Enquanto a crise hídrica do Sistema Cantareira aumenta, com o uso do volume morto e a estiagem, e os paulistanos temem ficar com as torneiras secas, parte da população da capital já enfrenta dificuldades para executar tarefas simples por causa das dificuldades de abastecimento. Lavar roupa, tomar banho e até beber água são desafios diários para moradores da zona sul que já sofrem com a falta d’água há 30 anos.
Essa é a rotina da dona de casa Cremilda Sampaio, de 58 anos, e de seus vizinhos no Jardim Três Corações, região populosa do Grajaú, no extremo da zona sul. “Tenho de estar no tanque sempre às 7 horas. Antes do almoço a água acaba e depois só volta à meia-noite. Nunca conseguimos nem fazer um churrasquinho aqui para os amigos, um aniversário. Sem água, a gente passa vergonha com as visitas, ninguém pode usar o banheiro”, diz Cremilda.
A dona de casa mora na Rua Professor Francisco Marques de Oliveira Júnior, em um dos pontos mais altos da capital. A reportagem do Estado esteve em seis bairros da zona sul onde o racionamento temido pelos paulistanos já é realidade: Três Corações, Jardim Varginha, Sítio Arizona, Vila Rocha, Marsilac e Ilha do Bororé.
São bairros e ocupações formados em regiões altas – até 340 metros acima do nível das Represas Billings e do Guarapiranga -, onde as adutoras da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) não têm pressão para manter abastecimento regular.
Na rua de Cremilda, vizinhos já usam bacia para economizar água da chuva desde os anos 1980. Lavar a louça tem dia e hora certos. A água cessa às 10 horas da manhã e só volta no início da madrugada.
“Quantas vezes a gente chega do trabalho à noite e não tem mais água na caixa? Foram várias as vezes em que chegamos a ficar até duas semanas sem uma gota de água”, conta a auxiliar administrativa Indiara Santana, de 27 anos. Ela diz ser comum os xingamentos a qualquer pessoa que se arrisca a lavar o carro ou a calçada. “Só temos água mesmo durante a madrugada até o início da manhã. Ninguém pode desperdiçar.”
Vizinhos.
Morador do Jardim Varginha há 30 anos, na região da Capela do Socorro, na zona sul, o aposentado Antonio Rezende, de 64 anos, diz ter perdido a conta de quantas vezes acabou a água do chuveiro no momento em que estava ensaboado. “O único jeito aí é correr para a casa dos parentes e amigos lá nos bairros de baixo”, diz Ferreira. “Aqui é muito alto. Não foi por falta de obra, viu? O pessoal da Sabesp está sempre aqui, mas nada resolve.”
Localizado em área de manancial, o bairro está em urbanização pela Prefeitura, mas a água só chega em caminhões-pipa. A rede da Sabesp alcança parte das ruas. “O duro é passar o domingo inteiro sem água. E isso acontece sempre. No verão, eram 36°C e a gente não tinha como tomar banho nem como fazer comida, dá para imaginar?”, pergunta Zélia Fernanda da Silva, de 39 anos, assistente de telemarketing.
Mais alto ainda, na região do M’Boi Mirim, o Sítio Arizona – ocupação iniciada em 1994 que compreende Vila do Sol, Vila Nova Cidade, Chácara Bananal I e II – tem falha de abastecimento para as 2.540 famílias carentes da localidade.
Apesar de estar cercada pelas represas, a região sofre com a falta de água semanalmente. “Aqui tem água para todo lado, só dentro de casa que não”, afirma Rubineia Oliveira, de 54 anos. Ela diz que muitas vezes vai às margens da Represa Billings para lavar as roupas. “Lavar roupa em casa é uma vez por semana. Louça deixo acumular três dias. Aqui ninguém tem nem como fazer economia.”
Cercados pela Billings, os moradores da Ilha do Bororé, a 42 quilômetros do centro, também sofrem com a falta d’água. Os 3.150 moradores da ilha usam poços que começaram a secar em abril. “E a gente nunca sabe a qualidade da água aqui, que vem de uma parte muita suja da Billings”, diz Júlio Rodrigues Moreira, de 32 anos.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.