O maior perigo de abuso sexual contra crianças e adolescentes no Brasil não mora nas esquinas ou nas ruas: está dentro de casa. É o que indica o levantamento promovido pelo Centro de Estudos Superiores de Maceió (Cesmac), realizado por meio de denúncias de abusos sexuais a delegacias e ao Disque 100 entre 2001 e 2007. O estudo indica que na maioria dos casos o crime é cometido por pessoas que “vivem dentro da casa das vítimas”. “Dos cerca de 311 casos registrados no período em análise, a maior parte dos agressores é padrasto das crianças, seguido por pais, tios e avôs”, afirma o coordenador do levantamento e professor de psicologia Liércio Pinheiro.
Segundo a pesquisa, o perfil do agressor típico é o homem entre 22 e 45 anos que tem laços de parentesco com a vítima. “São homens que sofrem algum distúrbio emocional ou psíquico”, afirma Pinheiro. Ainda de acordo com o estudo, o número de casos de abuso denunciados aumentou nos últimos anos. Só em 2009 já foram 4,7 mil registros, 31% deles relativos à violência sexual, 35% à negligência e 34% a casos de violência física e psicológica. Desde o início da análise, cerca de 90 mil ocorrências já foram denunciadas no País. Para Pinheiro, no entanto, o aumento no número de denúncias não representa um crescimento dos casos.
“As pessoas estão percebendo que o abuso é inaceitável e estão procurando por ajuda”, explica. “Entretanto, o número de casos registrados ainda não reflete a realidade. Mais de 95% das denúncias são feitas por pessoas de baixa renda. Tanto a classe média como a alta ainda têm vergonha de admitir o abuso.” Pinheiro afirma que o medo de se expor e de perder status na sociedade faz com que as famílias de maior renda “escondam o crime em casa”.
Dos Estados brasileiros, a pesquisa indica que o Distrito Federal é o que mais registrou denúncias de abuso em proporção ao número de habitantes. Amapá ficou em último lugar na lista.
Pedofilia e sinais
Apesar do crime de abuso sexual ser cometido contra crianças e adolescentes, Pinheiro indica que a maior parte dos agressores não são pedófilos. “A pedofilia é um transtorno de perversão, em que o acometido tem um desejo incontrolável por fazer sexo com crianças. Nesses casos, eles poderiam tanto agredir uma criança como um adulto”, diz. “Esses homens apresentam, é claro, um tipo de distúrbio emocional ou psíquico.”
O psicólogo alerta para que as mães prestem atenção às alterações no comportamento de seus filhos, que podem apresentar sinais de um abuso sexual. “Caso eles estejam agressivos, um pouco depressivos e chorem bastante, a mãe deve ficar atenta e perguntar aos filhos o que houve”, afirma. “Se eles confirmarem que houve o abuso, devem denunciar o mais rápido possível o agressor, porque o abuso é crime.” Quem comete abuso sexual contra crianças e adolescentes pode ser enquadrado nos crimes de estupro e atentado violento ao pudor. As penas variam de seis a dez anos de reclusão, dependendo das circunstâncias do incidente.