Uma pesquisa realizada pelo Hospital do Coração (HCor) e pelo Instituto Brasileiro de Pesquisa Clínica (BCRI) está avaliando o efeito das estatinas, substâncias utilizadas para o controle do colesterol, para evitar complicações decorrentes de enfartes.
Com base em estudos que mostram que o medicamento tem função anti-inflamatória e é capaz de evitar tromboses, os pesquisadores estão fazendo uma antecipação da indicação do remédio: eles estão sendo utilizados em pessoas que chegam a hospitais em fase de ataque cardíaco e não apenas quando o paciente recebe alta.
Iniciado há pouco mais de um ano, o Secure, como foi batizado o estudo, já está acompanhando 2 mil pacientes que foram atendidos em 50 hospitais públicos e particulares do País. Nos próximos dois anos, outros 2.200 devem ser avaliados para verificar os benefícios da substância.
“É um estudo com bastante influência para a área clínica. Hoje, a principal causa de morte no mundo são as doenças cardiovasculares. Entre as doenças, a vilã é o enfarte, o popular ataque cardíaco, que é mais comum nas classes sociais menos favorecidas e isso é uma tendência global, porque 80% dos óbitos no mundo por doenças cardiovasculares ocorrem nos países em desenvolvimento. É uma doença que tem um impacto muito grande em relação ao óbito e à incapacidade”, explica Otávio Berwanger, diretor do Instituto de Pesquisa do Hcor e presidente do comitê diretivo do estudo.
Berwanger diz que pesquisas em escala menor feitas nos Estados Unidos, na Europa e no Japão já mostraram os benefícios das estatinas para a proteção do coração e das artérias.
“Das medicações de prevenção cardiovascular, a mais importante é a estatina. Já foram feitas várias pesquisas, mas existem projetos em laboratórios e estudos pequenos que sugerem que as estatinas têm outras influências positivas, como propriedades anti-inflamatórias potentes. Quando a pessoa está tendo um enfarte, existe grande atividade inflamatória dentro dos vasos do coração. Elas também previnem a formação de coágulos.”
Segundo o especialista, o medicamento pode ainda tornar a angioplastia e a colocação do stent – tubo introduzido em artérias entupidas para a normalização do fluxo sanguíneo – mais seguras, pois, ao proteger os vasos sanguíneos, pode evitar lesões que podem ser causadas pelo procedimento.
Futuro
O resultado da pesquisa pode, no futuro, alterar a forma de atendimento a pacientes que chegam em hospitais tendo um ataque cardíaco. Isso porque o estudo também é feito em parceria com o Programa de Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de Saúde (PROADI-SUS), do Ministério da Saúde.
“Acho possível que haja uma mudança na forma de atender o paciente que está tendo um enfarte, porque essa parceria com o Ministério da Saúde se dá justamente por questões de interesse público.”
Ele diz ainda que o uso não elevaria de forma relevante os custos do tratamento no SUS. “Não é um tratamento caro. Com o uso das estatinas em um paciente de alto risco, há economia de dinheiro, porque é um paciente que vai deixar de ter complicações, não vai ter outro enfarte. Além disso, elas já são disponibilizadas nos setores público e privado, só estaríamos antecipando em alguns dias o uso, o que não iria onerar o sistema de forma relevante.”
Berwanger destaca que o estudo coloca ainda o Brasil em posição importante na área de pesquisas para doenças cardiovasculares.
“Classicamente, o Brasil não é um ator na pesquisa, é um coadjuvante, participa apenas de projetos de fora do País ou em um só hospital. Esse projeto prova o contrário, mostra que é possível fazermos uma pesquisa onde o Brasil pode liderar com vários hospitais, que é relevante para o meio médico e que atinge todas as classes sociais.”