São Paulo – Vem aí o Estatuto da Magistratura, instrumento com poderes para disciplinar e cortar privilégios da toga – como o nepotismo, que predomina em muitos tribunais -, e para regulamentar a emenda 45, que incluiu a reforma do Judiciário no texto da Constituição. O estatuto vai sepultar a Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman), herança do regime militar. Produzida em março de 1979 pelo então presidente Ernesto Geisel e seu ministro da Justiça, Armando Falcão, a Loman contempla os magistrados com muitos benefícios e os protege à sombra de sessões secretas.
Uma dessas vantagens, que agora pode acabar, é relativa à sanção máxima. Na hipótese de um juiz ser acusado de irregularidades no exercício da função, a punição mais pesada aplicável a ele é a aposentadoria. Vai para casa, mas com proventos integrais. O texto do novo código dos magistrados está sendo preparado pelo Supremo Tribunal Federal e será enviado ao Congresso até o fim do mês. O STF detém atribuição exclusiva para essa iniciativa. Na mais alta Corte do País, o relator do estatuto é o ministro Antonio Peluso.
Em 1992, o STF enviou à Câmara o texto do estatuto. Em 2004, após 12 anos engavetado, o documento foi retirado pelo então presidente do STF, ministro Maurício Corrêa, que alegou a necessidade de alterações. Na época, Corrêa protagonizava uma tensa queda-de-braço com o presidente Lula, que clamou pela abertura da "caixa-preta do Judiciário".
"A lei orgânica é autoritária e se tornou um peso", declara Rodrigo Collaço, que preside a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), a mais influente entidade da categoria. "É uma oportunidade perdida, ela não regula pontos importantes. Não abre espaço para a participação efetiva dos juízes no funcionamento do Judiciário."
Collaço defende a valorização do juiz, por meio da fixação de critérios objetivos de merecimento. "É fundamental para evitar o que acontece em muitos tribunais, os apadrinhamentos", destaca. "A lei orgânica não disciplina nada a respeito disso, carreiras feitas sob critérios que muitas vezes não são os melhores. O estatuto é uma oportunidade para que a premiação pelo mérito se estabeleça concretamente." Para o líder dos magistrados, as novas regras podem motivar a toga. "Num processo de merecimento que tenha condições claras e objetivas, a produtividade vai aumentar."
A AMB formou uma comissão que fará sua última reunião quarta-feira, para conclusão de um texto com sugestões que serão levadas ao ministro Nelson Jobim, presidente do STF. Um ponto já está decidido: o fim da contratação de parentes dos juízes. "O nepotismo não é proibido pela Loman", aponta Collaço. "Defendemos que a vedação seja incluída no texto do estatuto. Uma proibição geral nos tribunais. Em alguns estados já há lei não permitindo a admissão de servidores com grau de parentesco com juízes. Mas temos experiências muito negativas, onde a proibição não existe."