Empresas de ônibus estudam medidas jurídicas e mudanças na operação para evitar que o setor, que movimenta R$ 33 bilhões por ano, seja afetado por modelos de transporte coletivo similares ao Uber. O sinal amarelo foi aceso no começo do ano, com o anúncio de um modelo de transporte compartilhado que usa vans, em Porto Alegre.
O serviço de transporte coletivo por aplicativo segue a lógica do que, na capital, ocorre com o UberPool: pessoas que querem viagens baratas chamam a corrida pelo app e compartilham um mesmo veículo. Só que, em vez de carro, essa viagem é feita com vans ou ônibus. Vários modelos de negócio com o mesmo princípio pipocam pelo mundo, com operações em Portugal, Ucrânia, Finlândia e China.
O aplicativo gaúcho, chamado Bora, foi na mesma linha. Vende as vantagens de que o transporte coletivo produz menos poluição por passageiro do que o carro, retira veículos do trânsito e aproveita a lógica de que, com quanto mais gente no veículo, menores os custos. “Fizemos testes e temos certeza de que o modelo é viável”, diz o empresário José César Martins, um dos criadores do aplicativo.
A primeira reação do setor de transporte regular foi comparar o serviço ao de lotações clandestinos. É o que defende, por exemplo, o presidente da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), Ailton Brasiliense. “A concorrência com operações clandestinas já se mostrou muito ruim”, diz.
Por outro lado, segundo o presidente da Associação Nacional das Empresas de Transporte Urbano (NTU), Otávio Vieira da Cunha Filho, impedir que passageiros tenham essa opção de transporte pode colocar os usuários contra as empresas de ônibus. “Buscamos então parecer jurídico para conhecer as melhores formas de agir.”
“Por demanda”
O parecer, do jurista Vitor Schirato, se apoiou na alteração do Artigo 6.º da Constituição, que tornou o transporte público um direito social. “O transporte coletivo tem algumas premissas: universalidade, preços módicos, continuidade. Ou seja, tem de estar em todas as regiões e horários que o poder público determina, e a preços acessíveis. Isso é possível porque há um equilíbrio. As linhas mais lucrativas, com maior demanda, compensam as deficitárias. Se o transporte público tem concorrência, esse equilíbrio não é possível”, argumenta o jurista.
Cunha Filho, por outro lado, defende que serviços “por demanda” podem ser uma proposta interessante se forem pensados como uma ação complementar ao transporte regular. E é isso que a concessionária goiana HP Transportes, que opera o transporte coletivo por lá, anda fazendo. “Nosso contrato de concessão tem uma cláusula que prevê o uso de novas tecnologias”, diz o diretor da empresa, Eduardo Pinheiro.
O modelo goiano se baseia em um serviço de ônibus especial que já existe, o Citybus, que consiste em tarifa mais alta e veículos mais confortáveis. Lá, a concessão inclui a operação tanto na capital quanto nas 18 cidades da região metropolitana. “Defendemos que as empresas não podem se fechar para novas tecnologias, mas aprender como melhorar o serviço com elas”, afirma Pinheiro.
A empresa trabalha com startups e desenvolvedores para formatar um aplicativo até o fim do ano. E transformar o Citybus em um ônibus sob demanda em até seis meses.
São Paulo
Na capital paulista, o presidente do Sindicato das Empresas de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros de São Paulo (SPUrbanuss), Francisco Christóvam, defende que o transporte público não pode ter concorrentes. Mas afirma que “um serviço sob demanda poderia operar como os ônibus fretados”.
Um entrave para São Paulo é a proposta de concessão do sistema de transportes proposto pela gestão Fernando Haddad (PT), que teria validade por 30 anos e se baseia na concessão de linhas e regiões, sem citações a transporte coletivo sob demanda. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.