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Em abrigo, vítima de cárcere revê idosa de quem cuidava

Vítima de cárcere privado por cerca de 20 anos, Iva da Silva de Souza, de 63, tinha uma preocupação após ser resgatada pela polícia: continuar cuidando da idosa de 88 anos, para quem (mas não por quem) era obrigada a trabalhar. “Ela entende como uma espécie de missão de vida”, conta Eduardo Galasso, secretário municipal de Assistência Social de Vinhedo (SP) onde o caso aconteceu.

Cadeirante e com a saúde debilitada, a idosa é mãe de Marina Okido, de 65 anos, e sogra de Écio Pilli Júnior, de 47. Na segunda à noite, o casal foi preso em flagrante pela Polícia Civil, suspeito de submeter Iva a trabalho análogo à escravidão. Em depoimento, ela contou que não recebia salário, era proibida de sair de casa e não podia nem a atender a porta sozinha.

Após ser resgatada, Iva foi acolhida no Lar da Caridade de Vinhedo, instituição filantrópica de longa permanência para idosos em situação de vulnerabilidade. Já a outra idosa foi, inicialmente, levada à Santa Casa de Misericórdia, mas recebeu alta, nesta quarta-feira, 26, e também foi encaminhada ao abrigo. Lá, voltou a encontrar sua cuidadora, Iva.

“Quando elas estavam sem contato, dona Iva ficava perguntando: ‘Será que ela tomou o remédio das 9h?’. Este é o cotidiano dela há muitos anos”, relata Galasso. “A gente teve a preocupação de não quebrar esse vínculo abruptamente.”

Segundo o secretário, a separação deve ser “devagar”. “Em alguns momentos, ela tem consciência de que foi vítima, mas alterna em outros. Ainda é um processo meio confuso”, diz. “Trouxemos a outra idosa para o abrigo para que dona Iva perceba que ela está bem cuidada lá. Ela vai perceber isso com o tempo e começar a se libertar.”

No dia anterior, Iva já havia recebido visita de uma irmã, que mora em Araraquara. Elas não se viam há mais de 30 anos. A mãe dela também foi localizada no interior do Paraná, terra natal da família. Agora, assistentes sociais analisam se parentes têm condição de recebê-la.

Choque

Iva e a idosa ficavam sozinhas em um anexo (quarto, sala e banheiro), aos fundos de uma casa de outra família, alugado há seis meses. Separado, o acesso se dá por uma escada – imprópria para cadeirantes.

“Eu sabia que ela era a cuidadora, mas a via muito pouco: ou lavando roupa ou tirando o lixo. Ela nunca falou nada”, diz o aposentado José Morais, de 68 anos, dono do imóvel. “Foi um choque para todo mundo.”

Por sua vez, o casal vivia em outro apartamento, alugado no nome de Iva, segundo a Polícia Civil. Visitavam as idosas três vezes ao dia, dizem vizinhos.

A batida policial, na verdade, aconteceu para intimar Iva por estelionato, após um comerciante da região reclamar de cheques sem fundo. No local, os agentes estranharam as condições: não havia sequer comida. “Vocês precisam realmente saber o que está acontecendo, me ajudem”, ela pediu. Foi só depois que os investigadores descobriram que os talões eram usados pelo casal. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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