Brasilia
– No dia seguinte ao fim da apuração, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Nelson Jobim, ligou para o governador eleito do Paraná, Roberto Requião (PMDB), um dos que mais questionaram a segurança do voto eletrônico, e brincou: “Então, vamos anular tudo?”. Alvo de críticas que iam de urnas quebradas à condição de amigo do candidato tucano José Serra, Jobim chega ao fim do processo eleitoral certo de que, entre mortos e feridos, salvaram-se o voto eletrônico, a democracia e o nível da campanha. Já sua amizade com Serra, ninguém sabe se resistiu. Jobim jura que jamais foi procurado pelo tucano com pedidos ou reclamações.-Ele não reclamou porque sabia que, se reclamasse, ia se dar mal.
Jobim deixa claro não apostar em grandes mudanças com o governo do PT. Para ele, uma coisa é prometer e ter intenção de mudar. Outra, são as condições objetivas para mudar. Ele não acredita numa grande reforma política, mas acha que mudanças pontuais poderão ser feitas, por exemplo, no sistema proporcional de voto que trará a Brasília deputados do Prona que tiveram pouco mais de 200 votos. Sem constrangimento, lembra que ele mesmo chegou como deputado, em 1986, com pouco mais de 27 mil votos, no rastro dos 300 mil do radialista Mendes Ribeiro.
O voto eletrônico está consagrado?
Nelson Jobim –
Sim. O modelo, a urna em si, funciona. Mas pode avançar. Por exemplo, em vez de disquetes, poderíamos utilizar rede.Como o senhor lidou com as críticas que sofreu?
Jobim –
Sempre lido bem com críticas. Até me divirto. Faz parte do jogo político.No Espírito Santo, o deputado José Carlos Fonseca (PFL) foi o segundo mais votado com 95 mil votos e não foi reeleito. Enquanto isso, cinco deputados do Prona foram eleitos por causa do desempenho de Enéas em São Paulo. O sistema eleitoral é perverso?
Jobim:
Claro. A fórmula que pode acabar com a eleição de uma pessoa com 200 votos e manter o sistema proporcional é fazer lista fechada de partido, em que o eleitor não vota mais no candidato, mas na legenda. E a ordem da lista seria decidida pelo partido, que sairia fortalecido.“Não adianta mudar no discurso”
Brasília
(AG) – O que muda com a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva?Nelson Jobim
– Uma coisa é a intenção de mudar. Mas é preciso saber se há condições objetivas para mudar. Mudança significa ter dinheiro. Não adianta mudar no discurso. Para resolver problemas sociais, tem que redimensionar o gasto público. A questão é saber que espaço de redimensionamento do gasto público pode ter determinado partido.Qual a dificuldade nisso?
Jobim
– No Brasil, há um engessamento. Primeiro, tem o repasse aos estados. Há o investimento na saúde e na educação, o gasto com folha de pagamento. O discurso de produção de mudanças sociais depende de ter um crescimento econômico que pode aumentar a receita pública, viabilizar investimentos.O governo do PT será diferente das promessas?
Jobim
– Por exemplo, começa a discussão do novo salário-mínimo. Acho uma coisa maluca essa discussão. Antes, o governo dizia que não era possível aumentar o salário-mínimo porque o aumento de um real importava aumento de X no orçamento e o PT dizia o contrário. Agora está mudando.E Serra? Reclamou com o senhor em algum momento? Nem quando o TSE concedeu oito minutos a Lula no último programa eleitoral?
Jobim
– Não. Ele não reclamou porque ele sabia que, se reclamasse, ia se dar mal.Mas ficou algum mal-estar entre os senhores?
Jobim
– Que eu saiba, não.O presidente Luiz Inácio Lula da Silva poderá nomear cinco ministros do STF. O que o senhor acha disso?
Jobim
– Não vejo problema. Quando se pensa em problema, é porque há o pressuposto de que os ministros indicados pelo presidente vão para o Supremo para exercer a política do presidente. Não é verdade. Já me chamaram de líder do governo no Supremo. Líder por quê? Quando examinam as decisões, ninguém sabe por que. Quando se legitima o presidente a indicar um ministro do Supremo aprovado pelo Senado, significa legitimar o processo democrático e deslegitimar o processo corporativo.