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Diagnóstico de doenças raras nos primeiros anos de vida é o melhor remédio

O dia 28 de fevereiro marca o dia mundial das doenças raras, que são aquelas que atingem uma pequena parcela da população. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), são consideradas raras aquelas doenças que atingem até 65 pessoas em cada 100 mil indivíduos, 80% delas são genéticas e a maior parte delas se manifesta nos primeiros anos de vida.

Uma dessas doenças raras, que no caso está no grupo das bastante raras, é a alfa manosidose, que é um problema metabólico em que faltam certas enzimas no organismo para quebrar algumas moléculas de reações químicas que ocorrem naturalmente. Por conta dessa ausência, existe um acúmulo de substâncias tóxicas dentro das células.

“Existem alguns subtipos. Um deles é muito grave, em que o bebê pode apresentar alterações ainda na gestação, e pode nascer com inchaço ou com hidropsia fetal, que é o acúmulo de líquido em algumas partes do corpo, como no pulmão”, explica a geneticista Dafne Horovitz, que faz parte do Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente da Fundação Oswaldo Cruz – RJ. Nesse tipo, a expectativa de vida é bastante baixa e é comum que a criança não passe dos primeiros anos de vida.

Uma forma intermediária se manifesta um pouco depois, e a expectativa de vida é maior, porém as complicações são diversas. “Nesse tipo, a criança nasce aparentemente normal e, ao longo do desenvolvimento, percebe-se que há algo diferente, como atraso no desenvolvimento, as feições vão ficando um pouco mais grosseiras, cabeça um pouco maior, infecções de vias aéreas de repetição e possível perda auditiva. Mais para frente, na adolescência, podem aparecer problemas neurológicos, distúrbios de comportamento e alterações psiquiátricas”, explica a especialista. Além disso, existe uma forma mais tardia, que pode causar problemas de audição, nos ossos e articulações, mas o acometimento neurológico é menos comum.

Nesta e em todas as doenças raras, é importantíssimo o diagnóstico precoce – porém, na prática, ele demora meses e até anos. Isso porque, explica Dafne, as características dessas doenças são comuns a outras patologias.

“Antes de o médico pensar em uma rara, ele vai pensar nas mais frequentes. Mas, de repente, você vê uma combinação de muitas coisas diferentes no mesmo indivíduo, e aí tem de se desconfiar que existe alguma coisa por trás que esteja causando aquele quadro todo”, diz. Por conta dessa demora, é comum que, com o auxílio da internet, muitas famílias desconfiem de uma doença mais incomum e procurem um geneticista.

O principal tratamento para a alfa manosidose é o acompanhamento clínico, para saber como a doença funciona e se antecipar à sua evolução. Se diagnosticada nos primeiros meses de vida, a criança pode receber um transplante de células-tronco hematopoiéticas, que podem ser de um cordão umbilical de outra pessoa ou de medula óssea.

Outra doença rara é a mucopolissacaridose, que na verdade engloba vários tipos de defeitos enzimáticos. “No conjunto, as mucopolissacaridoses são várias alterações enzimáticas diferentes em uma mesma via metabólica”, explica Dafne. Estima-se que 500 a 600 pessoas tenham essa doença no Brasil.

“O bebê nasce normal e vai, aos poucos, desenvolvendo os sinais e sintomas, que são o acúmulo dessas substâncias no sistema nervoso central, nos olhos, nas articulações, no coração, nos ossos, em todos os órgãos do sistema”, diz a especialista. Alguns dos sintomas são alteração nas feições, no crescimento e opacidade das córneas, além de rigidez nas articulações.

Para essa doença, também é indicado o transplante de células-tronco até os dois anos de idade. Esse tempo é essencial para o sucesso do transplante, pois é quando o sistema nervoso central ainda está em desenvolvimento. Depois disso, é muito difícil reverter a degeneração sofrida pelo sistema. Recentemente, foi aprovada a realização desse procedimento na rede pública de saúde pelo SUS.

Outra alternativa de tratamento para alguns tipos de mucopolissacaridose é terapia de reposição enzimática, na qual o paciente vai toda semana ao hospital receber uma medicação na veia. “Essa medicação vai assumir o papel da enzima que o corpo não produz e, com isso, a gente consegue diminuir a velocidade de progressão dessas doenças e, principalmente, dar mais qualidade de vida para essas pessoas”, ressalta a geneticista.

Um terceiro exemplo de doença rara é a fenilcetonúria, que tem a diagnóstico mais fácil: ela faz parte da triagem neonatal, ou seja, pode ser identificada com o teste do pezinho. Sua incidência é em torno de 1 para cada 15 mil nascimentos. Este exame vai identificar se a criança, que não apresenta nenhum sintoma aparente, tem ou não a enzima fenilalanina hidroxilase. Sua produção ou não é algo determinado geneticamente.

“O bebê nasce normal, mas, na hora em que ele começa a mamar, o próprio leite materno vai ser tóxico, porque a criança não consegue metabolizar pela falta daquela enzima. Aquela substância tóxica então atinge o cérebro e, se a criança não é tratada adequadamente, pode desenvolver microcefalia, convulsões e um déficit intelectual muito grande”, explica a médica.

Neste caso, o tratamento é a dieta. Como a criança não tem a enzima que metaboliza um dos aminoácidos das proteínas, não pode tomar o leite materno e tem de ser alimentada com uma fórmula especial. Dafne alerta que “ela vai precisar fazer uma dieta muito rigorosa, muito restrita em proteína durante toda a vida, tem que ser acompanhada por nutricionista”

A dieta exclui leite, ovo, carne, queijo, tudo o que é proteína. Tem fruta que pode e outras que não podem e legumes e verduras têm de ser muito dosados. “Não é fácil, mas existe um número muito grande de pessoas evoluindo bem com a dieta. Neste caso, a comida é o remédio”, conclui a médica.

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