A descoberta da diabete, há 4 anos, transformou a vida do analista de sistemas Pablo Silva, de 31 anos. “Antes da doença é que eu era doente. Hoje sou saudável.” Depois de seis meses do diagnóstico, veio a aceitação e a mudança de hábitos: passou a se alimentar melhor e fazer atividades físicas. Também decidiu escrever sobre a doença na internet. “Tento reproduzir o que levo para minha vida: responsabilidade com bom humor.”
Como Silva, diabéticos “assumidos” têm mudado a cara da doença. E a temida palavra “diabete”, que antes era um tabu, hoje já estampa camisetas, canecas e – por que não? – até a pele. Segundo os pacientes, falar sobre o tema em palestras, cursos, na rua ou nas redes sociais é uma forma de auto afirmação e ajuda a aderir ao tratamento.
“A rede de pessoas que optam por tornar pública a vida com diabete tem aumentado. Não queremos entrar no espaço dos profissionais da saúde, mas provar que é importante que os pacientes se empoderem”, diz Silva, que além escreve no blog Eu e a Bete também faz publicações sobre o assunto no Facebook, Instagram e YouTube.
Segundo ele, os seguidores à espreita – são 40 mil só no Facebook – influenciam seu tratamento. “Puxa mais ainda a responsabilidade porque não adianta eu publicar se não aplico na minha vida”, diz. Nas redes, ele posta textos com dicas para contar carboidratos, receitas e até imagens de suas medições de glicemia. Silva tem diabete tipo 1, condição em que se produz pouca ou nenhuma insulina.
A terapeuta Luciane Cadan, de 42 anos, usa a própria experiência para influenciar os pacientes. Desde 2017, ela trabalha como coach de diabéticos e já teve de mostrar o próprio estojo de insulina para provar que também tem a doença, diagnosticada há mais de 30 anos. “As pessoas falam: ‘Você não é diabética’. E perguntam: ‘Casou? Tem filhos? Já pulou de paraquedas?’. Elas acham que, por ter um problema, não podem fazer nada.”
Luciane trabalha, em parceria com clínicas de endocrinologistas, para eliminar crenças pré-concebidas e ajudar os pacientes – principalmente adolescentes – a encontrar uma forma de se engajar no tratamento.
Orientações
Para Bia Scher, de 24 anos, que descobriu a diabete tipo 1 quando tinha 6 anos, a proximidade – ainda que virtual – com outros pacientes rende até orientações preciosas. “Já tive problemas com exercício físico, de ajustar a dose de insulina, e uma pessoa que me seguia veio me dar dicas”, lembra a estudante de Educação Física e autora do blog Biabética.
As publicações sobre a contagem de carboidratos e a bomba de insulina, tecnologias mais recentes para o tratamento, são as que mais fazem sucesso, diz Bia. Mas até foto de sorvete aparece na linha do tempo da estudante, que tenta não limitar suas atividades por causa da doença. Na internet, aproveita para “homenagear” a insulina – tem uma tatuagem com o desenho de um frasco – e vende em uma loja virtual produtos como adesivos para sensores de glicose e camisetas.
A paulistana Marina de Barros, de 33 anos, também dedica seu tempo à doença: mantém o site Diabética Tipo Ruim, já escreveu um livro, organiza eventos e também tem uma loja só de objetos para quem tem diabete – as opções vão de almofadas a canecas. A ideia, segundo explica, é incentivar a aceitação e tornar o tratamento “mais fashion”. “Às vezes os médicos se esquecem de tratar o lado emocional de se ter uma doença sem cura”, diz.
Augusto Pimazoni Netto, coordenador do Grupo de Educação e Controle do Diabetes do Hospital do Rim, ligado à Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), explica que é o choque inicial com a doença é normal. “O diagnóstico de diabete é desastroso na cabeça de que tem e na família”, diz. Ele vê como benéfica a conexão com outros pacientes na mesma situação, mas destaca que as informações na internet não dispensam o acompanhamento médico.
Tatuagem
Quem vê a tatuagem com a palavra “diabete” no braço direito de Alessandra de Oliveira, de 30 anos, não imagina que até pouco tempo a paulistana tinha dificuldades em falar sobre o assunto. A doença, diagnosticada quando ela tinha 15 anos, era um tormento. “Eu negava totalmente. Para mim, a diabete não existia.” Há três anos, com o incentivo do atual marido, ela decidiu mudar de atitude. A marca na pele veio para coroar o processo.
“Até para fazer a tatuagem tive de mudar: ficar mais rígida na dieta, regular horários e ter disciplina de dosagem da insulina”, conta. Como a agenda do tatuador estava cheia, foram três meses de controle intenso da data da procura até o dia da tatuagem. Hoje, a marca no braço direito – o mais usado nas tarefas – serve como um alerta duplo. “É tanto um aviso para as pessoas à minha volta, quanto pra mim, para lembrar que tenho de ter cuidado com tudo o que comer.”
Mais comuns nos EUA, tatuagens como a de Alessandra vem ganhando adeptos no Brasil. Quem marca a pele com avisos de saúde tem, em geral, um objetivo principal: comunicar a doença, em caso de atendimentos de emergência e perda de consciência. Mas, os “efeitos colaterais” do desenho na pele são muitos. Diabéticos tatuados dizem que a marca é uma forma de aceitar a própria condição de saúde e até de se conectar àqueles que passam pelos mesmos percalços.
Em abril deste ano, a estudante Aline Stein, de 18 anos, escreveu a palavra “diabética” no braço e completou a marca com uma onda azul, a cor que simboliza a doença. “Com a diabete, temos vários momentos de rebeldia. É mais fácil tentar esquecer que se tem um problema. De certa forma, a tatuagem serve como um lembrete de que você tem essa doença, sim, mas que isso não te define”, diz.
Cuidados
Pessoas com diabete que querem fazer uma tatuagem têm de observar alguns critérios para evitar complicações, segundo especialistas. A glicemia deve estar controlada antes da incisão para evitar problemas de cicatrização e infecções. E o ideal é tentar manter a taxa regulada pelo menos por alguns dias depois. Também é aconselhável buscar tatuadores especializados e evitar áreas de circulação pobre, como os pés. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.