A redução no número de mortes por armas de fogo no País chegou a 15,4% no ano passado, considerando a tendência de crescimento anual que vinha sendo registrada até então. O dado consta do estudo divulgado ontem pela Organização das Nações Unidas, para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), em Brasília, denominado ?Vidas Poupadas – O impacto do desarmamento no Brasil?. O trabalho contou com a parceria da Secretaria de Vigilância em Saúde (do Ministério da Saúde) e do Ministério da Justiça. O documento sintetiza os resultados da análise dos dados de mortalidade por armas de fogo divulgados pelo Ministério da Saúde no último dia dois. Esses dados podem ser decisivos no referendo marcado para o dia 23 de outubro, que definirá a proibição ou não da venda legalizada de armas de fogo no Brasil.
O estudo relaciona a queda no índice de homicídios por meio de armas de fogo no País à campanha do desarmamento, efetivada no segundo semestre de 2004. Com base nos dados do Subsistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), o crescimento de mortes dessa modalidade anualmente era de 7,2%, o que apontaria para um registro de 41.682 no ano passado. Entretanto, em 2004, foram contabilizadas 36.119 mortes por arma de fogo, o que representa uma redução real de 8,2% em relação aos números de 2003.
No Paraná, entretanto, assim como no Espírito Santo e em mais quatro estados da região Norte, ao que parece, a campanha do desarmamento não surtiu o efeito esperado. Apesar de no primeiro semestre do ano passado ter acontecido uma redução nas mortes provocadas por arma de fogo no Paraná, no segundo semestre o aumento desse tipo de homicídio foi de 8,2%, provocando um resultado total no aumento de mortes com armas de fogo para 1,7%. Quanto às vidas poupadas, as capitais Curitiba e Porto Alegre, na região Sul, tiveram um desempenho abaixo do esperado da campanha do desarmamento.
Pelo estudo, ficou provado ainda que Rio de Janeiro, Pernambuco e Espírito Santo lideram o ranking por armas de fogo, possuindo algo em torno de 40 mortes a cada 100 mil habitantes, num reflexo direto dos índices de violência nesses estados. As regiões metropolitanas das principais capitais do País, que costumam concentrar populações que convivem com índices de violência mais alto, continuam registrando mais da metade das mortes por arma de fogo.
Outro dado interessante, que não haviam sido citado no estudo do Ministério da Saúde, foi uma diferença superior na maioria dos estados do número de mortes por outras armas, o que pode ter representado uma substituição das armas de fogo por armas diversas nas práticas de homicídio. Essa possibilidade tem gerado polêmica entre os que defendem e os que são contrários ao desarmamento.
Polêmica
Os dados emitidos pela Unesco, que se assemelham aos divulgados pelo Ministério da Saúde, são questionados pela frente que é contrária à proibição da venda legal de armas no Brasil e pede que a população vote ?não? ao desarmamento.
O presidente da Organização Não-Governamental (Ong) Viva Brasil, Bene Barbosa, disse que dados referentes a homicídios competem às secretarias de Segurança Pública e não a órgãos de Saúde. ?Não há como relacionar a suposta redução de homicídios com arma de fogo à campanha do desarmamento. Mesmo porque não se sabe a origem das armas que foram usadas nos homicídios.? Barbosa acredita que a população esteja bastante desinformada e que acabar com o livre arbítrio sobre a aquisição de armas de fogo para proteção própria ou familiar é um retrocesso. ?O que tem que ser combatido com força é o tráfico de armas, já que elas é que municiam os criminosos.?
Câmara analisa 29 propostas para mudar o estatuto
Brasília (ABr) – A Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado da Câmara dos Deputados vai promover no final deste mês uma audiência pública para discutir os projetos legislativos que alteram o Estatuto do Desarmamento, ou seja, a lei 10.826, de 2003. Atualmente, tramitam 29 projetos que propõem mudanças nas leis que regulam as autorizações e portes de armas no País.
Parte das propostas parlamentares torna o porte de arma mais restritivo, impedindo inclusive, o comércio de revólveres de brinquedo. Outra parcela amplia as concessões, garantindo o porte de armas para advogados, oficiais de Justiça, policiais aposentados e até mesmo moradores do campo.
A audiência pública na qual os projetos serão debatidos ainda não tem data definida, mas deve coincidir com a intensificação dos debates sobre o referendo do desarmamento, marcado para o dia 23 de outubro. Entre os 29 projetos legislativos sob análise da Comissão de Segurança Pública, existem até mesmo propostas de adiamento da consulta que fará a seguinte pergunta à população: ?O comércio de armas de fogo e munição deve ser proibido no Brasil??, sim ou não.
O presidente da Comissão de Segurança Pública, Enio Bacci (PDT-RS), reconhece que o adiamento do referendo é ?inviável? e acredita que os projetos neste sentido serão arquivados. De acordo com ele, a audiência da comissão tem como objetivo definir quais entre os demais projetos devem ser analisados de forma prioritária.
?Nós convidaremos diversas entidades para debater todas as propostas?, afirma Bacci, que faz parte da Frente Parlamentar pela Legítima Defesa -contrária à proibição do comércio de armas de fogo. ?Mesmo tendo a minha opinião pessoal, pretendo agir como magistrado, buscar consenso para avançarmos mais facilmente. Nos casos em que não houver consenso, vamos a voto.?
Na semana passada, a Comissão de Segurança Pública aprovou o projeto de lei 5359/2005, de autoria do deputado Capitão Wayne (PSDB-GO), que reduz a taxa de R$ 1 mil pelo porte de armas para dois salários mínimos.