A dimensão do desaparecimento de pessoas no Brasil chama a atenção de entidades internacionais e, em levantamentos iniciais, o fenômeno dá indícios de superar a situação na Síria ou mesmo em cinco décadas de conflitos na Colômbia.
Com base em um estudo realizado no Brasil, o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) indicou que foram registrados um total de 786.071 registros de desaparecimentos entre 2007 e 2017. Apenas no ano passado, foram registrados 82.684. No Estado de São Paulo, foram mais de 25 mil no ano passado.
A entidade com sede em Genebra admite que não existiam dados consolidados, centralizados ou atualizados relativos ao número de pessoas desaparecidas no País. Por isso, ela facilitou um primeiro levantamento, feito pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública e publicado em 2017.
Na classificação do Comitê Internacional da Cruz Vermelha, pessoas desaparecidas são “indivíduos sobre os quais as suas famílias não têm notícias ou alguém que, com base em informação confiável, que foi dado como desaparecido”. “As circunstâncias do desaparecimento podem ser diversas: um conflito armado – internacional ou não internacional – outras formas de violência, distúrbios internos, desastres naturais, migração entre outras”, indica a entidade.
Ainda segundo a pesquisa feita pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 17% dos brasileiros têm algum amigo, parente ou conhecido desaparecido.
“Quando vimos a dimensão, ficamos assustados”, admite a coordenadora de Proteção da delegação regional do CICV, Marianne Pecassou, em Brasília. De acordo com ela, o total é uma compilação de registros comunicados pela Polícia Civil. “São os boletins de ocorrência por parte de familiares”, explicou.
Os números se contrastam com outras iniciativas realizadas por entidades internacionais e que também revelaram números importantes de desaparecimentos em países em conflito armado. Segundo a Anistia Internacional e a Rede Síria de Direitos Humanos, cerca de 75 mil pessoas desapareceram na Síria entre 2011 e 2016.
Na Colômbia, o Centro de Memória Histórica apontou que, entre 1958 e 2017, um total de 82 mil pessoas desapareceram, número equivalente ao do Brasil apenas em 2017.
Ainda que a realidade colombiana e síria sejam diferentes da brasileira, o que chama a atenção em Genebra é a dimensão dos casos registrados no Brasil.
Números
Marianne admite que ainda existe muito trabalho pela frente para entender esses números. Um dos desafios, segundo ela, é o da subnotificação de casos. Mas outro problema se refere à falta de atualização dos números ao longo dos anos para tentar entender quantos desses casos foram resolvidos, seja por conta de que essas pessoas tenham sido encontradas vivas ou mortas.
Para o Comitê, existem pelo menos dois desafios para o futuro próximo. Dar maior visibilidade ao problema dos desaparecimentos no Brasil e a criação de uma lei geral que possa tratar dos direitos das famílias, classificar o problema e ainda estabelecer um mecanismo nacional para lidar com o fenômeno.